Infância Urgente

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Mais uma vez, a manchete: Morte de índios gera ‘emergência’

O jornal Diário de Cuiabá publicou, com a manchete em destaque, a morte de 35 crianças indígenas do povo Xavante, em Campinápolis, Mato Grosso, apenas neste início de ano. Não é a primeira vez que as reportagens dos jornais anunciam a morte de crianças indígenas naquela região. Em 2010, das 200 crianças nascidas, 60 morreram devido a doenças respiratórias e infecciosas (o mesmo ocorreu em 2009, quando se registrou a morte de mais de 20 pequenos Xavante). Lamentavelmente nenhuma medida eficaz foi tomada para conter esse verdadeiro extermínio praticado silenciosa e sistematicamente. As estruturas de governo destinadas à prestação de serviços e assistência aos índios indicam que esta não será a última manchete que estampa a morte. A situação desta comunidade se prolonga, se agrava, mas as medidas tem sempre “caráter emerg encial” e nunca um caráter permanente.

O Governo Federal, através da Secretaria Especial de Atenção à Saúde Indígena (Sesai), é quem deve estruturar a atual política de saúde. E o que tem sido feito efetivamente neste sentido? Se levarmos em conta o que se pode ler nas manchetes de jornais e em depoimentos e denúncias de lideranças, comunidades e povos indígenas de diferentes cantos do Brasil, chegamos à conclusão de que nada tem sido realizado. Há discursos, planos, projetos, reuniões, debates, mas prestação de serviços nas aldeias é coisa rara.

Até o momento não foi apresentada, pela Sesai, nenhuma proposta que atenda às reivindicações dos povos e que implemente o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, conforme determina a Lei Arouca (9.836/99), os decretos presidenciais e as portarias ministeriais. Não há orçamento e nem previsão de que seja realizado concurso público para contratação de profissionais em saúde, não há recursos para estruturação dos Distritos Sanitários Especiais de Saúde e seus pólos-base, não há continuidade nas ações preventivas em saúde, não há iniciativas efetivas para implementar saneamento básico nas áreas indígenas, não há formação e nem contratação de agentes de saúde indígena. Enfim, não há vontade política, não há interesse pela vida destes povos, não há responsabilidade com as prerrogativas legais, tão car as a um regime democrático. Há, por outro lado, contingenciamentos cada vez maiores de recursos públicos para pagamento de juros da dívida. Apenas no mês de março deste ano foram mais de R$ 9 bilhões.

Até quando vai perdurar esta trágica realidade?

Até que as manchetes sejam estampadas em jornais internacionais e, desse modo, provoquem uma onda de manifestações de repúdio? Até onde as lideranças indígenas devem proferir estas denúncias para que sejam levadas em conta? Será necessário recorrer às cortes internacionais? A morte de crianças do povo Xavante tem sido denunciada há anos e não desperta a atenção de políticos que comandam ministérios e a Presidência da República. Será que o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, sabe o que é viver na beira de estradas, sem água potável, sem segurança, sem esperança? Será que o senhor ministro tem idéia do sofrimento e do desespero das mães ao verem seus filhos desidratados e desnutridos, sem poderem contar com qualquer tipo de assistência? Será que ele sabe que há povos no Vale do Javari que estão em processo de exti nção porque as crianças morrem de diarréia, hepatite, tuberculose? Será que ele sabe que os pais destas crianças, que morrem por desassistência, também estão definhando e que, de acordo com as expectativas de vida naquela área, não chegarão à idade de 35 ou 40 anos?

Se o ministro Padilha tem conhecimento desta realidade, está se omitindo e merece o nosso mais veemente repúdio. Se não está informado a este respeito, não faltam manchetes de jornais e depoimentos de quem padece cotidianamente por falta de uma adequada política de proteção e de assistência. Peço, então, que ele escute o grito de sofrimento que vem das áreas indígenas – um grito veemente em nome da vida, que indaga:

Até quando?

Porto Alegre (RS), 27 de abril de 2011.

Roberto Antonio Liebgott
Vice-Presidente do Cimi

Nenhum comentário: