Infância Urgente

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

NOTA PÚBLICA SOBRE PNDH 3

O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), rede que reúne cerca de 400 organizações de direitos humanos de todo o Brasil manifesta publicamente seu REPÚDIO à posição dos comandantes militares e do Ministro da Defesa e seu APOIO à posição do Ministro dos direitos humanos e da Justiça.
Para o MNDH, a luta pela memória e a verdade como direitos humanos é parte fundamental da luta pela consolidação da democracia e para que efetivamente o Brasil possa dizer um “basta!” e um “nunca mais” a todas as formas de ditadura e, acima de tudo identifique os responsáveis por crimes contra os direitos humanos e promova a reparação de pessoas que sofreram violações no período da ditadura.
Dessa forma, o MNDH entende que o Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH 3), ao estabelecer o tema do direito à memória e à verdade como um eixo no qual estão previstos vários objetivos e ações, alça o tema a uma prioridade da política pública de direitos humanos. Faz isso atendendo ao definido na 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em dezembro de 2008, que acolheu e aprovou este tema depois de ampla discussão em todo o país.
A reação dos setores militares e do Ministério da Defesa não são bem-vindas e contrastam com os compromisso constitucionais e internacionais com os direitos humanos assumidos pelo Brasil. O próprio Ministério da Defesa participou da elaboração o PNDH 3 que foi fruto de ampla negociação interna ao governo e com a sociedade civil organizada. Aliás, segundo informações publicadas pela imprensa, a proposta de criar um grupo de trabalho encarregado de definir as atribuições da Comissão da Verdade e elaborar proposta a ser enviada ao Congresso Nacional já representa uma pactuação diferente da definição da Conferência Nacional, que havia definido explicitamente pela criação da Comissão sem definir este procedimento. É inaceitável que, da penumbra do conservadorismo e do revanchismo anti-democrático, no apagar das luzes do ano, se esboce esta reação dos setores militares.
O MNDH rejeita qualquer proposta de revisão do texto ou mesmo as “explicações” de que o texto publicado não representa consenso. Entendemos que o consenso só faz sentido quando fundado na verdade e em argumentos razoáveis. Invocar falta de consenso frente a argumentos espúrios e anti-democráticos é não querer consensos e encontrar uma saída que só fortalece os setores do governo e da sociedade que insistem em querer uma democracia “pela metade”. Democracia exige posições que sejam sustentadas pela verdade e pela justiça, por isso, nem sempre consensuais. Cabe ao Presidente da Republica arbitrar a divergência com base nos compromissos com os direitos humanos e não na conveniência ou na pressão de setores, por mais fortes, mesmo que pouco representativos e pouco legitimados.
A sociedade brasileira está madura e quer uma democracia substantiva. Estabelecer a memória e a verdade sobre o período militar não é somente o reconhecimento da história, mas, acima de tudo, compromisso com um futuro no qual a impunidade não subsista como sombra e que a justiça efetivamente alcance aqueles que usaram de sua posição e prerrogativa pública para reprimir e violentar a sociedade e os agentes que resistiram à ditadura.
Assim, o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) cobra uma posição do governo brasileiro que seja coerente com os compromissos constitucionais com a justiça e a verdade e com os compromissos internacionais com a promoção e proteção dos direitos humanos. O momento é decisivo para que o país avance para uma institucionalidade democrática que efetivamente reconheça e torne os direitos humanos conteúdo substantivo da vida cotidiana de cada um/a dos/as brasileiros e brasileiras. Como organização da sociedade civil, o MNDH está atento e envidará todos os esforços para que as conquistas democráticas avancem sem qualquer passo atrás.


Brasília, 31 de dezembro de 2009.

Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)

Novo Tempo

No novo tempo, apesar dos castigos

Estamos crescidos, estamos atentos, estamos mais vivos

Pra nos socorrer, pra nos socorrer, pra nos socorrer

No novo tempo, apesar dos perigos

Da força mais bruta, da noite que assusta, estamos na luta

Pra sobreviver, pra sobreviver, pra sobreviver

Pra que nossa esperança seja mais que a vingança

Seja sempre um caminho que se deixa de herança

No novo tempo, apesar dos castigos

De toda fadiga, de toda injustiça, estamos na briga

Pra nos socorrer, pra nos socorrer, pra nos socorrer

No novo tempo, apesar dos perigos

De todos os pecados, de todos enganos, estamos marcados

Pra sobreviver, pra sobreviver, pra sobreviver

No novo tempo, apesar dos castigos

Estamos em cena, estamos nas ruas, quebrando as algemas

Pra nos socorrer, pra nos socorrer, pra nos socorrer

No novo tempo, apesar dos perigos

A gente se encontra cantando na praça, fazendo pirraça

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Uma criança sofre violência a cada duas horas em Alagoas, apontam conselhos tutelares

Carlos Madeiro
Especial para o UOL Notícias
Em Maceió
Dados apresentados nesta terça-feira (29) mostram que a cada duas horas uma criança ou adolescente é vítima de algum tipo de violência em Alagoas. O balanço foi apresentado durante o Fórum de Conselhos Tutelares do Estado, realizado em Maceió, e apontam para um crescimento superior a 25% no número de ocorrências dessa natureza neste ano em relação a 2008. O número pode ser ainda maior, acredita o Ministério Público Estadual (MPE).

A três dias do fim do ano, os conselhos já contabilizaram 39.982 casos de violência em Alagoas, o que dá uma média de 11,1 por dia. Segundo o Fórum, o número é recorde, já que, em 2008, foram registrados 32 mil casos.

Em Alagoas existem 107 conselhos tutelares, espalhados pelos 102 municípios do Estado, que são responsáveis por receber e apurar denúncias contra os menores de 18 anos de idade.

Entre as ocorrências mais registradas, as principais são as agressões físicas, os abusos e o trabalho infantil forçado. "São dados assustadores. O que mais chama a atenção é o crescimento no número de agressões físicas", afirma o presidente do Fórum, Edmilson Souza.

Para ele, o principal motivo para tantas ocorrências é a falta de políticas públicas no Estado. "São poucas ações que contribuem para a diminuição da violência", alega, complementando: "a desestruturação familiar, a falta de educação doméstica e espiritual também ajudam para esse cenário", disse.

Souza atribui o crescimento no número de casos também ao pouco investimento na investigação e punição dos infratores. "Só temos uma delegacia na capital especializada e temos poucas varas na Justiça para os casos. O conselheiro fica de mãos atadas. Por isso temos um índice de prisão baixo. Quando se trata de gente rica, é ainda mais difícil, pois eles contratam advogados e encontram brechas na lei. Normalmente acabam sendo liberados. A maioria de quem está preso é parente da vítima e pobre", ressaltou.

Dados são maiores, diz promotor
Se os dados assustam pela quantidade de casos, para o promotor da área de direitos humanos do Ministério Público Estadual, Flávio Gomes, o número de ocorrências apresentados pelos conselheiros não refletem a realidade. "Esse número é maior. Muita gente não denuncia, principalmente por conta do envolvimento crescente com drogas e de o agressor ser, normalmente, um membro da família", explicou.

Gomes alega que muitas vezes o agressor é o responsável pela criança ou adolescente. "Em um dos casos que recebi, uma jovem de 16 anos casou para fugir da violência do pai. Depois de casada foi que seu marido nos procurou, e nós abrimos uma investigação. Mas veja como é difícil a convivência dentro de casa em algumas situações", contou.

Para Gomes, uma das soluções para o problema estaria na criação de uma "rede de alternativas", onde o papel da escola seria determinante. "As escolas com tempo integral e a prática esportiva são fundamentais nesse processo contra a violência. Hoje existe uma desestruturação familiar terrível. Em uma pesquisa que fiz num presídio de Maceió constatei que 70% dos presos não foram criados com a presença do pai. Hoje, se é de classe média, é criado pela babá. Se é pobre, vive sem o pai, largado na rua. Ou seja, não há mais estrutura de família. Tudo isso se reflete em violência", finalizou.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Manifesto pelo fim da publicidade e da comunicação mercadológica dirigida ao público infantil

Em defesa dos diretos da infância, da Justiça e da construção de um futuro mais solidário e sustentável para a sociedade brasileira, pessoas, organizações e entidades abaixo assinadas reafirmam a importância da proteção da criança frente aos apelos mercadológicos e pedem o fim das mensagens publicitárias dirigidas ao público infantil.

A criança é hipervulnerável. Ainda está em processo de desenvolvimento bio-físico e psíquico. Por isso, não possui a totalidade das habilidades necessárias para o desempenho de uma adequada interpretação crítica dos inúmeros apelos mercadológicos que lhe são especialmente dirigidos.

Consideramos que a publicidade de produtos e serviços dirigidos à criança deveria ser voltada aos seus pais ou responsáveis, estes sim, com condições muito mais favoráveis de análise e discernimento. Acreditamos que a utilização da criança como meio para a venda de qualquer produto ou serviço constitui prática antiética e abusiva, principalmente quando se sabe que 27 milhões de crianças brasileiras vivem em condição de miséria e dificilmente têm atendidos os desejos despertados pelo marketing.

A publicidade voltada à criança contribui para a disseminação de valores materialistas e para o aumento de problemas sociais como a obesidade infantil, erotização precoce, estresse familiar, violência pela apropriação indevida de produtos caros e alcoolismo precoce.

Acreditamos que o fim da publicidade dirigida ao público infantil será um marco importante na história de um país que quer honrar suas crianças.

Por tudo isso, pedimos, respeitosamente, àqueles que representam os Poderes da Nação que se comprometam com a infância brasileira e efetivamente promovam o fim da publicidade e da comunicação mercadológica voltada ao público menor de 12 anos de idade.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

ENTREVISTA - MARCELO GOULART

Temos que fazer a reforma agrária que o governo não faz Adversário do agronegócio, promotor ataca ruralistas e álcool e prega "horizonte utópico" sem grande propriedade

Edson Silva/Folha Imagem

O promotor de Justiça do Meio Ambiente Marcelo Goulart em Ribeirão Preto

MARCIO AITH
ENVIADO ESPECIAL A RIBEIRÃO PRETO

MARCELO Goulart é símbolo da corrente mais polêmica surgida no Ministério Público após a Constituição de 1988: a dos promotores que acreditam ser "agentes políticos", relevam a "letra fria" da lei e atuam ao lado do MST e de ONGs contra o que definem como a elite do país. Aos 52 anos, Goulart atua desde 1985 na região de Ribeirão Preto, onde se notabilizou por disputas contra usineiros. Agora à frente do grupo responsável por processos ligados ao ambiente, ele moveu, só em 2009, 55 ações civis públicas, inclusive contra grupos que produzem orgânicos. Seu próximo desejo é assegurar o "direito difuso" dos brasileiros à reforma agrária.


FOLHA - O senhor é conhecido por atuar ao lado do MST e de entidades ambientais. Esse é o papel de um promotor?
MARCELO GOULART - A visão do Ministério Público como mero agente processual está superada desde a promulgação da Constituição de 1988. O membro do Ministério Público é agente político e, hoje, tem a incumbência constitucional de defender o regime democrático e implementar a estratégia institucional de construir uma sociedade livre, justa e solidária.

FOLHA - Não há o risco de se aproximar demais de entidades das quais deveria manter distância?
GOULART - Os membros do Ministério Público têm clareza do seu papel social, dos limites de suas funções e do uso do instrumental jurídico de que dispõem. Assim, a aproximação entre Ministério Público e as forças progressistas da sociedade torna-se inevitável e necessária. É um bem, não é um mal.

FOLHA - Como o sr. distingue as entidades progressistas das outras?
GOULART - As forças sociais democráticas são aquelas que assumem o compromisso de implementar o projeto democrático da Constituição de 1988. A Constituição definiu para o país um modelo de Estado social e de democracia participativa. Os sujeitos políticos que atuam na defesa desse projeto são aliados naturais do Ministério Público na luta pela construção da hegemonia democrática. Não é difícil identificá-los.

FOLHA - Por que os produtores rurais não seriam progressistas?
GOULART - Aqueles grupos que defendem um modelo de agricultura social e ambientalmente sustentáveis estão no campo democrático. Aqueles que, ao contrário, defendem um modelo que leva ao descumprimento da função social do imóvel rural estão no campo dos adversários do projeto democrático da Constituição da República. Esses defendem o padrão de produção agrícola hoje prevalecente no Brasil.

FOLHA - Que padrão é esse?
GOULART - O padrão que gera a concentração fundiária, que utiliza de forma inadequada os recursos naturais e que degrada o ambiente por ser baseado na monocultura e na agroquímica. É um padrão concentrador da propriedade, da renda, da riqueza e do poder político.
Por isso, contraria o projeto da Constituição.

FOLHA - Entre as empresas processadas pelo senhor, estão algumas conhecidas pela produção de açúcar orgânico, sem agrotóxico.
GOULART - Não vamos nos enganar. Algumas usinas fazem açúcar de ótima qualidade, orgânico, sem agrotóxico. Mas se negam a fazer acordos conosco na questão da reserva legal. E a lei é clara: as propriedades rurais devem manter ao menos 20% da área com floresta permanente.

FOLHA - E se o desflorestamento ocorreu antes, por outros proprietários e sob o respaldo de outras leis?
GOULART - Não existe direito adquirido contra o ambiente.
As normas de ordem pública, como as ambientais, aplicam-se não somente aos fatos ocorridos sob sua vigência, mas também aos efeitos dos fatos ocorridos anteriormente à sua edição. Não permitir, hoje, a reparação com o reflorestamento das reservas florestais legais é castigar o planeta e a sociedade à sanha do mercado.

FOLHA - O que o senhor acha do álcool combustível?
GOULART - A queima do combustível álcool também polui, e o processo de produção do álcool é sujo. Temos a queima da cana, o desmatamento, o uso incontrolado de insumos químicos. Além da superexploração do trabalho. Mais: a produção do álcool exige economia de escala, que somente se viabiliza nesse padrão de produção baseado na monocultura e na concentração fundiária. São Paulo está se tornando um grande canavial. O futuro não está no álcool, mas em outras alternativas, como o hidrogênio e a eletricidade. Diria que o álcool é um combustível de transição. Não terá vida longa.

FOLHA - A monocultura mecanizada não é uma tendência inexorável da agricultura mundial?
GOULART - Claro que não. Não é assim na Europa. Precisamos discutir outros modelos. Temos um pensamento único por parte da elite dirigente nacional em relação à agricultura.

FOLHA - Segundo estudo do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), os assentamentos concentraram metade do desmatamento na Amazônia. O que o sr. acha disso?
GOULART - Não há sentido em desapropriar grandes imóveis rurais que descumprem a função social para, no mesmo local, implantar assentamentos antiambientais. Daí a importância da participação do Ministério Público no acompanhamento do desenvolvimento dos assentamentos.

FOLHA - O senhor foi muito criticado no episódio da desapropriação da fazenda da Barra, dentro de Ribeirão Preto. Como foi isso?
GOULART - É. Fizemos reforma agrária nas barbas da capital do agronegócio. Havia grandes passivos ambientais e a suspeita de improdutividade. Instaurei um inquérito ainda no governo FHC. Chamei o superintendente do Incra e disse: precisa abrir processo administrativo de desapropriação. Ele abriu. Chamaram-me de Robespierre, de promotor maluco. A desapropriação acabou saindo, já no governo Lula.

FOLHA - A área da fazenda da Barra parece inóspita, incipiente. A experiência deu errado?
GOULART - Inóspito, não. Incipiente, sim. Ali será implantado assentamento agroforestal cujas bases são objeto de discussão no âmbito de inquérito civil instaurado pela Promotoria de Justiça. O que está faltando é maior agilidade do Incra na implantação da infraestrutura básica a viabilizar a produção e o reflorestamento. Dinheiro do BNDES para grandes usinas, tem. Outro dia saiu um empréstimo de R$ 80 milhões para uma delas.

FOLHA - Por que a promoção da reforma agrária deveria ficar a cargo de promotores?
GOULART - O papel do Ministério Público é claro: defender a função social da terra e o direito difuso à reforma agrária, utilizando os instrumentos jurídicos que a Constituição e as leis lhe conferem, firmando aliança com os setores da sociedade civil que tenham o mesmo objetivo. A atuação radicalmente contrária a essa está presente na história desse país desde as capitanias hereditárias. Seus agentes são por demais conhecidos; com eles o Ministério Público da Constituição de 1988 não se alinhará.

FOLHA - Como o sr. definiria uma propriedade rural que não cumpre sua função social?
GOULART - A improdutiva, a que utiliza de forma inadequada os recursos naturais, degrada o ambiente ou impõe condições sub-humanas de trabalho.

FOLHA - Uma área produtiva que não se curve à sua definição de função social pode ser desapropriada?
GOULART - Minha definição, não. A da Constituição. Juridicamente, pode. Agora, tem muita propriedade antes dessa para ser desapropriada. Tem que começar pelos casos mais graves.

FOLHA - O senhor parece não gostar de grandes propriedades rurais.
GOULART - No meu horizonte utópico não está presente um grande número de usinas de açúcar e álcool, por exemplo.
No meu horizonte utópico estão a policultura, a geração de postos de trabalho no campo e a agricultura orgânica. Está o acesso do povo à terra, que é um direito fundamental negado desde o descobrimento. A estrutura fundiária brasileira é uma das principais razões de nosso subdesenvolvimento.

FOLHA - O senhor é socialista?
GOULART - Como promotor de Justiça, sou defensor da Constituição, do projeto democrático.
Essa é a minha missão. Minhas convicções pessoais são só isso: minhas convicções pessoais.

FOLHA - Quais convicções?
GOULART - Utopicamente? Acredito na possibilidade de construir uma sociedade socialista. Sob um ponto de vista gramsciano, se avançarmos na linha da Constituição, vamos dar grandes passos para, no futuro, caminhar para uma sociedade socialista.

FOLHA - Como é que isso ocorreria?
GOULART - A partir do momento em que os princípios sociais da Constituição forem sendo efetivamente conquistados, não só no papel, mas na realidade, haverá um choque lá na frente. Teremos de discutir, por exemplo, como é que a dignidade da pessoa humana pode conviver com o direito de propriedade. E assim por diante.

FOLHA - Mas a Constituição não protege o direito à propriedade?
GOULART - A propriedade tem que cumprir a função social. O direito de propriedade não é absoluto. O imóvel que não cumpre a função social deve ser desapropriado. Não é uma opção. Está lá na Constituição.
Temos que construir uma sociedade livre, justa e solidária.
Isso só vai acontecer quando desconcentrarmos a terra.

FOLHA - O senhor já teve alguma experiência política?
GOULART - Em 1991, afastei-me do Ministério Público para ser candidato a prefeito de Jardinópolis pelo PT. De quatro candidatos, consegui a façanha de não ficar em último. Fiquei em terceiro. Desfiliei-me e voltei à instituição.

FOLHA - [Antonio] Gramsci [pensador marxista italiano], a quem o sr. admira, atribui a força unificadora da sociedade, que Maquiavel atribuía ao Príncipe, a um partido. Por isso ele chamava o partido -no caso, o comunista- de "Moderno Príncipe". Que partido, na sua opinião, ocupa a função de Moderno Príncipe no Brasil?
GOULART - Hoje não faz sentido pensar em partido político. São as forças democráticas que cumprem uma função hegemônica e que, articuladas, logo avançam a batalha das ideias, na imprensa, no Ministério Público, nas instituições. E criam a base cultural para as mudanças políticas e econômicas. Esse é o caminho democrático da construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

FOLHA - O senhor tem chefe?
GOULART - Não existe hierarquia funcional no Ministério Público. Um de nossos princípios é o da independência funcional, que ganhou força com a Constituição de 1988. Esse princípio serve para proteger o membro do Ministério Público das pressões do poder político, econômico e interno.

Omissão persistente

Atualmente se constata existir toda uma geração crescida sob a vigência de normas estabelecidas, há duas décadas, pela Convenção sobre os Direitos da Criança, exatamente desde quando ocorreu a fase de transição dos regimes ditatoriais para o exercício dos direitos democráticos em vários países da América do Sul. Observa-se que, apesar do fortalecimento da Democracia, ainda persistem procedimentos inalterados de iniquidade, em parte gerados pelas desigualdades socioeconômicas, nos quais ressaltam distintas formas de violência contra a criança.

Prevalece, ainda, um misto de autoritarismo e omissão nas relações entre adultos, sejam estes agentes do Estado ou particulares, e crianças e adolescentes de todos os segmentos sociais. Em paralelo aos avanços conquistados no campo político, ainda subsistem fortes ranços decorrentes de uma anacrônica postura exercida por autoridades, familiares, professores e pessoas supostamente responsáveis pela proteção dos mais jovens.

A Convenção sobre os Direitos da Criança foi ratificada por 193 países, entre eles, o Brasil, constituindo um recorde mundial de consenso a respeito do tema. No campo jurídico, toda ratificação de tratados internacionais sobre direitos humanos exige de cada Estado a adoção de medidas efetivas no sentido de assegurar o respeito à defesa dos direitos de crianças e adolescentes dentro de seu território.

De 20 anos até hoje, estabeleceu-se a necessidade de impostergável sincronia entre teoria e ações públicas no setor, expressa em normas orientadoras para a interpretação do conteúdo da legislação concernente ao assunto. O Estatuto da Criança e do Adolescente, no Brasil, e outras medidas adotadas no Uruguai, Venezuela e Costa Rica são efeito direto dos preceitos consolidados pela Convenção.

O Informe Mundial de Violência contra a Criança, apresentado perante a Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), demonstra que essa execrável forma de crueldade existe em países dos diversos continentes e culturas, ao mesmo tempo em que é condenado veementemente nos próprios locais onde é perpetrada. O que o bom senso não compreende é que um problema tão visceralmente ligado ao próprio futuro da Humanidade ainda seja tratado de maneira tão limitada e fragmentada, mesmo onde existem legislações tidas entre as mais perfeitas do mundo, como é o caso do Brasil.

O quadro persistente da situação de risco é consideravelmente agravado pelo avanço devastador do consumo de drogas, sobretudo o crack, que faz aumentar em progressão geométrica o número de homicídios e de outras modalidades de crimes entre menores de 18 anos. De janeiro a novembro último, nada menos que 151 jovens, com idades entre 12 e 17 anos, foram assassinados somente na Região Metropolitana de Fortaleza, um número inaceitável.

Torna-se notória a falta de enfoque mais realista sobre o problema e de uma decisão política contundente, tanto por parte dos governos quanto da sociedade, para deter esse ambíguo processo a desenrolar-se em tão problemático contexto, no qual se mesclam múltiplas faces da omissão e da irresponsabilidade social.

Fonte: Diário do Nordeste

sábado, 19 de dezembro de 2009

70% dos jovens de 13 a 15 anos já beberam

Conclusão é de pesquisa do IBGE com 63 mil jovens de todas as capitais; dos que beberam, 22% ficaram bêbados ao menos uma vez

Quase 9% dos entrevistados utilizaram drogas ilícitas e 30,5% já transaram; 24% não usaram preservativo na última relação sexual

SAMANTHA LIMA
DA SUCURSAL DO RIO

Sete em cada dez adolescentes brasileiros entre 13 e 15 anos já consumiram bebida alcoólica. O primeiro contato com o álcool foi entre 12 e 14 anos. Quase 9% já utilizaram drogas ilícitas e 24% não usaram preservativo na última relação sexual que tiveram.
É o que revela a primeira Pesquisa Nacional de Saúde do Estudante, feita pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde. Foram ouvidos 63 mil jovens do último ano do ensino fundamental, sendo 80% de escolas públicas e 20% da rede privada, em todas as capitais.
"Os números são esperados. Mas há duas questões: a primeira é que os pais devem dar exemplos positivos sempre e não apoiar o uso de drogas, lícitas ou ilícitas. Outra é que o governo deveria fazer campanha para mostrar os efeitos do consumo do álcool, como é feito com o cigarro", diz o pediatra Lauro Monteiro, editor do site Observatório da Infância.
"A pesquisa permite saber o que acontece e, assim, ajustar e aprofundar as políticas públicas", afirmou o ministro da Saúde, José Temporão. Segundo ele, para cada problema já existe uma política pública.
"A precocidade no uso do álcool está relacionada à propaganda massiva. Por isso defendo o projeto de regulamentação da propaganda desses produtos, em tramitação no Congresso", disse Temporão. O projeto prevê restringir a veiculação de cerveja e bebidas de menor teor alcoólico na TV das 21h às 6h. A medida já está em vigor para bebidas de maior teor de álcool.
Dos que já ingeriram álcool, 22% ficaram bêbados pelo menos uma vez. Dentre os entrevistados, 18,7% relataram que, nos 30 dias anteriores à pesquisa, foram conduzidos por motoristas alcoolizados. "Isso mostra que é importante intensificar as operações da Lei Seca", afirmou Temporão.
Os entrevistados eram predominantemente menores de idade, mas 18,5% relataram já ter dirigido. O IBGE salienta que os dados sobre direção preocupam porque 43,5% das mortes de jovens de 10 a 14 anos ocorrem em acidentes.
Em São Paulo, um em cada dez jovens já experimentou maconha, cocaína e crack, entre outras drogas ilícitas. Dados de pesquisas internacionais fornecidos pelo IBGE apontam que 18% dos jovens aos 15 anos usaram maconha em algum período. No Brasil, já usaram drogas 10,6% dos meninos e 7% das meninas. Temporão disse ter acabado de liberar R$ 280 milhões para tratamento e prevenção ao consumo de drogas.
No que se refere a sexo, 30,5% dos que estão concluindo o ensino fundamental já tiveram relações. Entre os meninos, o percentual chega a 43,7%, contra 18,7% entre as meninas. O preservativo foi usado por 75,9% deles na última vez em que fizeram sexo.

Fonte:FSP

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

"Brincando e Foliando" no Sacolão das Artes, domingo

Estudo revela queda no preconceito dos pais na hora de adotar crianças

Pretendentes que só aceitavam cor branca eram 49%; agora, são 36%.
Pesquisa é de comissão responsável pelas adoções no estado de SP.

A cor da pele já não tem a mesma importância de antes. Deficiências físicas também não têm tamanha relevância. A idade, aos poucos, passa a não ser fator fundamental. Pesquisa feita pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional de São Paulo, obtida com exclusividade pelo G1, mostra que o preconceito dos pretendentes à adoção no estado cai a cada ano.

Os dados mostram que hoje 36% dos 2.094 pais à espera na fila só aceitam adotar uma criança da cor branca. Mas em 2005 eram 49%. Aqueles que colocam a cor como indiferente compõem 32% do total. Antes, eram 21%.

Os dados compilados pelo Tribunal de Justiça revelam ainda que os pretendentes têm se tornado mais conscientes em relação à realidade de abrigos no país. Isto porque em 2005 quase a metade dos pais (44%) só desejava recém-nascidos ou crianças até um ano de idade – fato que dificultava a possibilidade de uma aproximação. Atualmente, são 27% os que fazem questão de a criança ter até 12 meses de vida. E mais topam filhos acima de 2 anos.

Segundo o Cadastro Nacional de Adoção (que foi criado em 2008 e permite adoções interestaduais com mais facilidade), em todo o país há cerca de 4 mil crianças aptas à adoção: 85% delas têm de 5 a 18 anos.

Para a assistente social Clarinda Frias e para a psicóloga Sílvia Penha, autoras do estudo, a discrepância ainda “mostra muito sobre a sociedade”.

“Há um grande número de adolescentes (para adoção) enquanto a quase totalidade dos pretendentes à adoção são disponíveis (para crianças) no máximo até os 6 anos de idade. Isso aponta para o grande desafio ainda posto, de transpor e superar a cultura da institucionalização e priorizar as políticas públicas voltadas às famílias, para que cada vez menos adolescentes se vejam sem laços familiares, acolhidos em uma instituição”, dizem, na pesquisa.

Ainda de acordo com o estudo, em 2005 os que aceitavam irmãos eram 25%. Em 2008, já eram 32%.

Uma outra estatística que demonstra a queda no preconceito é a que trata das deficiências físicas e psicológicas. Foram mais de dez pontos percentuais de queda quando elas são consideradas tratáveis e leves.

“A evolução da disponibilidade dos pretendentes cadastrados, mesmo que pequena e gradual, no aumento da aceitação para a adoção de irmãos, respeitando-se os vínculos afetivos existentes, para crianças acima de dois anos, para adoção inter-racial e de crianças com um histórico que inclui situações de violência e problemas de saúde, faz parecer que a ampla discussão que vem sendo empreendida pelos profissionais das varas da Infância e Juventude, abrigos, grupos de apoio à adoção e demais agentes da rede de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, começa a render frutos”, pontuam as autoras.

Um índice que permanece inalterado com o passar dos anos é a preferência por meninas, citada por 29% dos candidatos, contra 9% que dizem preferir só meninos.

'Não é supermercado'

Os publicitários Luís Roberto Duarte de Souza, de 42 anos, e Daniela Lorenzon, 33 anos, são o exemplo de tudo o que normalmente não acontece quando o assunto é adoção. Os dois adotaram crianças negras, irmãs e com mais de dois anos. E jamais pensaram em qualquer outro estereótipo. "Se ainda há tantas crianças em abrigos é porque as pessoas ainda idealizam o filho, porque na hora de adotar colocam um monte de condições como se estivessem com um carrinho de supermercado fazendo compras", diz Souza.

"As pessoas agem como se estivessem com um carrinho de supermercado na hora de adotar"

Por não fazerem a mínima questão de uma característica em especial, o processo dos dois foi recorde: 26 dias. "A gente podia ter filho biológico. Mas foi uma opção. A gente só quis saber a história deles. Não viu nem as fotos. Foi simplesmente amor", diz Daniela.

Apesar de tanto eles quanto Thalya, de 9 anos, e Nathan, de 8 anos, se sentirem totalmente à vontade como família, as pessoas quase nunca enxergam do mesmo modo, como conta Daniela. "Fisicamente somos muito diferentes. Então os amiguinhos deles ficam questionando na escola. Quando a gente vai a shoppings, restaurantes, ficam olhando feio, encarando. É cruel. Dá para saber quando o olhar é de curiosidade e quando é de reprovação. Isso já me incomodou muito. Mas agora a gente até se diverte com isso."

'Alma não tem cor'

Mãe e avó adotiva, Hália Pauliv de Souza, de 72 anos, é especialista em adoção. Além de livros publicados na área, trabalha há mais de dez anos como voluntária na Vara da Infância e da Juventude de Curitiba (PR) ajudando os pretendentes a escolher seus filhos. E ela diz que há, de fato, uma evolução. “As coisas estão caminhando. As pessoas estão percebendo que alma não tem cor. E isso não ocorre apenas em São Paulo, mas também aqui no Paraná e em todo o país.”

Ela tem duas filhas adotadas na década de 70. Uma delas também resolveu recentemente adotar crianças e fez logo questão de acabar com qualquer tabu: pegou duas meninas, irmãs, uma delas já com 7 anos. A outra tem 4.

"As coisas estão caminhando. As pessoas estão percebendo que alma não tem cor"

“Quando se fala em ter um filho, toda mulher pensa em um bebê. Mas eu e meu marido já estávamos casados havia 11 anos e pensamos em crianças maiorzinhas. Queríamos dois ou duas, não importava o sexo, mas até 3 anos. Foi a sensibilidade da técnica que nos acompanhou que mudou isso da idade”, conta Fernanda Pauliv, de 35 anos.


Ela apenas colocou as fotos das duas na mesa. No momento, os olhos do meu marido encheram de lágrimas. E eu pensei: ‘São elas’. Quando a gente saiu de lá, decidiu já no carro”, diz. “Foi uma coisa sensata. Eu dou aula à noite. Ele tem uma empresa de eventos. Um bebê ia exigir muita dedicação. A criança maior é companheira, vai com a gente quando quer sair.”

Após quatro meses de convivência, ela diz: “Essa adoção tardia tem sido só de coisas boas. As meninas são fantásticas, estão 100% adaptadas”.

"Caráter se constrói. E o amor se desenvolve"

A artista plástica Gildiney Raimunda da Silva, de 42 anos, também resolveu quebrar paradigmas: adotou uma menina com deficiência. Joane, hoje com 23 anos, foi sua primeira. Depois, ela teve um filho biológico: Alan, de 22 anos. Bruno, o último, também foi adotado. Tem 13 anos e é o xodó da casa. Craque no piano, é o orgulho dos pais.


Apesar da resistência de alguns parentes e amigos, ela jamais teve qualquer sinal de arrependimento. "Até cuido mais deles, parece que tenho uma obrigação", afirma. "Não dá para ficar ouvindo aquela história de que não se sabe de onde o bebê saiu. Caráter se constrói. E o amor se desenvolve."

Fonte: G1

Senado muda prescrição de crime sexual contra criança

BRASÍLIA - A prescrição para crime sexual contra criança e adolescente ocorrerá apenas oito anos após a vítima completar 18 anos, salvo se o representante legal tiver proposto ação antes disso. O projeto foi aprovado hoje pelo plenário do Senado, mas ainda precisa passar pelo aval da Câmara dos Deputados para ir à sanção. Hoje, a prescrição ocorre oito anos após ocorrido o crime. Pelo texto aprovado, teoricamente a vítima teria até os 26 anos para denunciar o abuso.

O projeto foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), no início de outubro, com a presença da nadadora Joanna Maranhão que, por volta dos 20 anos de idade, decidiu denunciar os abusos sofridos durante a infância pelo ex-treinador Eugênio Miranda. Miranda nega o crime e não responde processo porque o crime já havia prescrito. A proposta aprovada pelo Senado, de iniciativa da CPI da Pedofilia, ficou batizada de Lei Joanna Maranhão. A nadadora hoje tem 22 anos.

Segundo o presidente da CPI da Pedofilia, senador Magno Malta (PR-ES), o projeto contribuirá para diminuir a impunidade aos pedófilos. Segundo o senador, hoje, muitas vítimas passam longos períodos sem ter a exata compreensão do abuso sofrido. Em outros casos, segundo o senador, os responsáveis pelas crianças e adolescentes muitas vezes são omissos aos fatos.

O relator do projeto na CCJ, senador Aloizio Mercadante (PT-SP) alerta para o fato, no seu parecer, de que os pais muitas vezes são os próprios autores do crime. "Os crimes sexuais contra crianças e adolescentes nem sempre são levados às barras da Justiça porque o agente muitas vezes é o próprio pai, padrasto, ou pessoa da família, que exerce verdadeiro temor reverencial sobre a vítima, o que a impede de externar os abusos que sofre", afirma o senador.

Fonte: CAROL PIRES - Agencia Estado

Álcool na adolescência

Aprovado em caráter terminativo pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o projeto de lei prevendo detenção de seis meses a quatro anos a comerciantes que forem condenados pela Justiça por venda de bebida alcoólica a menores de 18 anos depende agora da apreciação dos deputados federais para entrar em vigor. O objetivo da lei só terá condições de ser alcançado se houver fiscalização adequada e, principalmente, se for reforçado por campanhas em favor de uma mudança cultural dirigida principalmente aos pais. Por se constituir em droga lícita, o álcool costuma ser tolerado no âmbito familiar, o que é um equívoco.

De maneira unânime, especialistas têm alertado para que o consumo precoce de bebida alcoólica, além do risco de levar à dependência e a outras drogas, pode provocar danos físicos, inclusive cerebrais. Por isso, o inciso 2 do Artigo 81 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) preocupou-se em proibir explicitamente a venda de bebidas alcoólicas a menores de idade. A determinação, porém, é desrespeitada flagrantemente em todo o país, por falta de fiscalização, de punição rígida e também de disposição do comércio em cumprir esse preceito legal à risca.

Se as punições mais rigorosas e a exigência de alertas nos rótulos não forem sustentadas por um aumento permanente da fiscalização, é difícil imaginar que o projeto possa garantir algum avanço. O problema preocupa ainda mais pelo fato de até mesmo em festas realizadas em casa, na presença dos pais, os jovens se darem à liberdade de beber, às vezes estimulados pelos adultos.

O consumo de drogas lícitas e ilícitas entre crianças e adolescentes é um problema de saúde pública e também cultural, além de muitas vezes implicar prejuízos no rendimento educacional ou profissional. Por isso, precisa ser combatido sem moralismo, com ênfase em campanhas preventivas, que envolvam também os pais, mas ancoradas em punições rígidas para reduzir as margens de burla à lei fora do lar.

Fonte: Zero Hora

A contrarrevolução jurídica

por Boaventura de Sousa Santos

Está em curso uma contrarrevolução jurídica em vários países latino-americanos. É possível que o Brasil venha a ser um deles.

Entendo por contrarrevolução jurídica uma forma de ativismo judiciário conservador que consiste em neutralizar, por via judicial, muito dos avanços democráticos que foram conquistados ao longo das duas últimas décadas pela via política, quase sempre a partir de novas Constituições.

Como o sistema judicial é reativo, é necessário que alguma entidade, individual ou coletiva, decida mobilizá-lo. E assim tem vindo a acontecer porque consideram, não sem razão, que o Poder Judiciário tende a ser conservador. Essa mobilização pressupõe a existência de um sistema judicial com perfil técnico-burocrático, capaz de zelar pela sua independência e aplicar a Justiça com alguma eficiência.

A contrarrevolução jurídica não abrange todo o sistema judicial, sendo contrariada, quando possível, por setores progressistas.

Não é um movimento concertado, muito menos uma conspiração. É um entendimento tácito entre elites político-econômicas e judiciais, criado a partir de decisões judiciais concretas, em que as primeiras entendem ler sinais de que as segundas as encorajam a ser mais ativas, sinais que, por sua vez, colocam os setores judiciais progressistas em posição defensiva.

Cobre um vasto leque de temas que têm em comum referirem-se a conflitos individuais diretamente vinculados a conflitos coletivos sobre distribuição de poder e de recursos na sociedade, sobre concepções de democracia e visões de país e de identidade nacional.

Exige uma efetiva convergência entre elites, e não é claro que esteja plenamente consolidada no Brasil. Há apenas sinais nalguns casos perturbadores, noutros que revelam que está tudo em aberto. Vejamos alguns.

- Ações afirmativas no acesso à educação de negros e índios. Estão pendentes nos tribunais ações requerendo a anulação de políticas que visam garantir a educação superior a grupos sociais até agora dela excluídos.

Com o mesmo objetivo, está a ser pedida (nalguns casos, concedida) a anulação de turmas especiais para os filhos de assentados da reforma agrária (convênios entre universidades e Incra), de escolas itinerantes nos acampamentos do MST, de programas de educação indígena e de educação no campo.

- Terras indígenas e quilombolas. A ratificação do território indígena da Raposa/Serra do Sol e a certificação dos territórios remanescentes de quilombos constituem atos políticos de justiça social e de justiça histórica de grande alcance. Inconformados, setores oligárquicos estão a conduzir, por meio dos seus braços políticos (DEM, bancada ruralista) uma vasta luta que inclui medidas legislativas e judiciais.

Quanto a estas últimas, podem ser citadas as “cautelas” para dificultar a ratificação de novas reservas e o pedido de súmula vinculante relativo aos “aldeamentos extintos”, ambos a ferir de morte as pretensões dos índios guarani, e uma ação proposta no STF que busca restringir drasticamente o conceito de quilombo.

- Criminalização do MST. Considerado um dos movimentos sociais mais importantes do continente, o MST tem vindo a ser alvo de tentativas judiciais no sentido de criminalizar as suas atividades e mesmo de o dissolver com o argumento de ser uma organização terrorista.

E, ao anúncio de alteração dos índices de produtividade para fins de reforma agrária, que ainda são baseados em censo de 1975, seguiu-se a criação de CPI específica para investigar as fontes de financiamento.

- A anistia dos torturadores na ditadura. Está pendente no STF arguição de descumprimento de preceito fundamental proposta pela OAB requerendo que se interprete o artigo 1º da Lei da Anistia como inaplicável a crimes de tortura, assassinato e desaparecimento de corpos praticados por agentes da repressão contra opositores políticos durante o regime militar.

Essa questão tem diretamente a ver com o tipo de democracia que se pretende construir no Brasil: a decisão do STF pode dar a segurança de que a democracia é para defender a todo custo ou, pelo contrário, trivializar a tortura e execuções extrajudiciais que continuam a ser exercidas contra as populações pobres e também a atingir advogados populares e de movimentos sociais.

Há bons argumentos de direito ordinário, constitucional e internacional para bloquear a contrarrevolução jurídica. Mas os democratas brasileiros e os movimentos sociais também sabem que o cemitério judicial está juncado de bons argumentos.

Resposta ao Alexandre

Alexandre, queria dialogar com você em um outro patamar que não o das histórias pessoais de vida, mas dialogarei sim do espaço institucional que eu milito, que é o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo.

Então, só um breve histórico do Fórum na luta pelo fim da FEBEM/Fundação Casa.

O Fórum desde a aprovação do ECA esteve na luta pela extinção da instituição, a extinção da instituição, quer dizer o fim de uma estrutura e pensamento, para isso o Fórum participou de diversos espaços organizando ou contribuindo para que essa superação ocorresse, algumas delas:

Proposta da OAB (data imprecisa 1996);
Fundap (data imprecisa 1998);
Fundação Faria Lima (1999);
Assembleia Legislativa(1999/2000);
Seminário do Fórum Estadual DCA (2005);
Diversos Debates sobre a lei de execução de Medidas Sócio Educativas ( debate ocorrido durante alguns anos, que por proposta do Fórum Estadual DCA -SP, o CONANDA e os CONSELHOS DE DIREITOS assumissem a discussão e decisão sobre o disciplinamento das medidas sócio-educativas), entre outros espaços.

Debatemos e discordamos do SINASE, por inúmeros motivos, o principal , é que o SINASE fortalece o papel do Poder Judiciário, fragilizando a concepção doutrinária da lei, que não tem uma interpretação só do campo jurídico, o que o SINASE o faz , disfarçando com uma suposta discussão pedagógica.

Então Alexandre, conheço o tal Modelo Pedagógico Contextualizado (MPC) sim, vi um certo tom em sua mensagem, que realmente não me agrada, nem em fazer com ninguém, nem que esse tom seja a minha pessoa direcionado.

Só para você saber, eu conheço o Modelo Colombiano sim, alias conheci o primeiro padre colombiano que veio ao Brasil, morava em Parelheiros, eu era Conselheiro Tutelar da região de Campo Limpo à época 1992, não sei se você sabe ele foi assassinado!

Honestamente, tenho sempre desconfiança dessas coisas importadas, tenho porque já acumulamos demais aqui, o problema a não é falta de teoria e sim vontade politica.

Em relação a unidade modelo Alexandre, já vivi um pouquinho e com alguma estrada nessa luta, conheço também a instituição por dentro, fui trabalhador da instituição, logo muita coisa não me ilude mais, porque esse discurso e taticas velhas e batidas da instituição, já passei por elas algumas vezes, lembro aqui de algumas unidades referencias: Unidade Terapêutica (década de 80), UE-10(1997/1999), UE-13 (1998/1999), UE-18 (1998/2000 mais ou menos) UE -20 (2000-2001), ou seja, não estamos falando que não é possível, ao contrário estamos convictos que é possível, só que não podemos viver de referências né meu caro, porque as referencias, como você pode vê , acabam.

Algumas observações em relação a unidade que você trabalha Alexandre, a primeira questão é a precarização do atendimento com o processo de privatização, porque não podemos ficar escondendo a privatização com essa história de parceria né Alexandre? Alias, privatização das péssimas, já que além do ónus de fazer um atendimento que não deveria fazer as entidades salvadoras do mundo, ainda fazem pior, submetem a proposta pedagógica a de segurança, o que tem provocado situações piores ainda. Algumas unidades com o MPC, como Guarulhos, Jundiai, Campinas, Rio Claro (alias, esses faziam o mesmo discurso que você Alexandre, pois é , deixaram de fazê-lo depois de algumas torturas e rebeliões) entre outros tiveram problemas, que os levaram a entregar a tal parceria ou foram subjugadas pela lógica da instituição.

Então, como você conhece bem o SINASE, você sabe que o SINASE propõe uma construção horizontalizada, não verticalizada como estão sendo construídas pelo Governo do estado né? Ou seja, será mesmo que o já ruim SINASE está de fato sendo implantado?

Claro Alexandre, sou herói não, mas faço uma visita em sua unidade, não precisa desafiar não, é só fazer o convite, que irei, evidente que não irei sozinho, porque escreverei aqui o que verei, discordando ou não do que vocês estão fazendo ai.

Então Alexandre, por ultimo queria dizer, que vocês querendo ou não, vocês estão legitimando essa politica do governo do estado, já que servem de propaganda para mentir e omitir sobre o que rola na instituição, logo é importante que vocês saibam que são responsáveis por isso que ocorre hoje na instituição! Isso vocês não podem dizer que não!

Resposta de Educador da FEBEM/Fundação Casa

Olá. Meu nome é Alexandre Leal trabalho na luta pelos direitos das crianças e dos adolescentes a cerca de 15 anos, já fui educador social nos antigos EGJ's, em abrigo, no CEDECA Interlagos (por 4 longos anos), já tomei spray de pimenta em manifestações, depois, no lançamento do programa "Viver em Comunidade" no Sesc Vila Mariana com a presença do governador Serra, fiz protesto silencioso com faixas e travestido de mendigo em ocasião da desapropriação truculenta que ocorria nas comunidades às margens do Guarapiranga/Billinguis e hoje trabalho como Educador Social na Fundação Casa Osasco onde foi feito o filme que está sendo vinculado, discordo da política do Sr. Serra em diversos pontos e odeio o PSDB com suas ideologias neoliberais (pequena burquesa), mas eu conheço de dentro a realidade das NOVAS unidades construídaS por decadas através do SINASE, do ECA, das leis de diretrises educaionais e de todos os marcos legais que conhecemos (acho que você as conhece pouco), as leis não funcionam por si só, é preciso lutar diariamente para que elas sejam cumpridas e respeitadas. Você conhece o Modelo Pedagógico Contextualizado? Sabe como ele surgiu? Sabe como ele funciona? A casa Osasco foi eleita a Unidade de referencia do país por orgãos estrangeiros (o governo não tem participação nisso) somos visitados constantemente pela tv Globo, SBt, Rede TV (que nunca vincularam nem uma virgula do que gravaram dentro da Unidade por não encontrar lá nenhuma resma de "Pão e Circo" que lhes desse audiencia, afinal o povão ama uma "Catarse" e adora fazer o papel de cidadão correto "recriticando" aquilo que a tv vincula sem nunca ter colocado o pé para fora de casa para fazer uma mobilização, afinal é comodo ser massa de manobra criticando a esmo sentado em seu sofá ou atráz de um computador escrevendo besteiras sem profundidade crítica.Concordo que muitas unidades que não adotaram o MPC hoje estão ainda em situação irregular e é nelas que devemos juntos direcionar nossas críticas através da ação concreta, esta ação deve ser feita através do conhecimento prático indo ao centro da questão e não em sua periferia fazendo comentários rasos. Por tudo isso convido você Giba para fazer uma visita à nossa Unidade (se tiver coragem) para conhecer um trabalho feito pela Sociedade Civil Organizada em parceria com o Estado, resalto que para chegarmos a este modelo, que não é perfeito e deve ter contribuição de gente que luta pelos direitos, é resultado da pressão e da luta de duas decadas da sociedade civil que hoje gerencia de forma compartilhada algumas unidades da Fundação, que o Sr Serra espertamente diz que é uma iniciativa dele. Giva precisamos multiplicar este trabalho e aprofundar o debate, penso que comentários como o seu em parte desmobiliza e afasta o interesse por soluções, soluções que estão na nossa cara mas não vemos porque ainda estamos no papel de massa de manobra. Só vive de Pão e Circo quem deixa-se viver por ele!

Comportas fechadas na barragem da Penha para proteger a marginal ajudaram a alagar a zona leste de SP

As seis comportas da barragem da Penha, na zona leste de São Paulo, foram completamente fechadas às 2h50 do dia 8 de dezembro, dia em que a cidade enfrentou fortes temporais e viu diversos pontos alagarem como há muito tempo não se via. Somente dois dias depois, às 17h20, todas as comportas foram abertas. Os dados, fornecidos pelo engenheiro responsável pela barragem, João Sérgio, indicam que houve uma clara escolha da empresa responsável: alagar os bairros pobres da zona leste para evitar o alagamento das marginais e do Cebolão, conjunto de obras que fica no encontro dos rios Tietê e Pinheiros.

"Mesmo fechando as comportas, encheu o [córrego] Aricanduva. Se eu não tivesse fechado aqui, teria alagado as marginais e toda São Paulo", justificou Sérgio, que explicou que a decisão vem da direção da Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia). Ele acrescentou ainda que no dia 9 duas comportas foram abertas às 10h10 e mais d uas às 21h.

O engenheiro argumenta que cada barragem (são quatro em São Paulo: Móvel, Penha, Mogi das Cruzes, Ponte Nova) é responsável apenas por administrar o fluxo de água do local e não sabe o que acontece nos outros pontos, porque não há comunicação. Mas ele acredita que as comportas foram abertas nas barragens de cima, em Mogi, e isso influenciou no alagamento da região da zona leste.

"Não recebo informações de outras barragens. As de cima são administradas pela Sabesp e as de baixo pela Emae. Eu só respondo por essa barragem e às ordens da Emae", disse. "Também acho estranho o nível da água não baixar aqui e não sei por que está indo para os bairros, mas não precisa ser especialista para ver que está assoreado [o rio]".

Ele trabalha há quase 15 anos no local e conta que desde o governo de Orestes Quércia (1987-1991) não são colocadas dragas para desassorear o rio na parte que fica acima da barragem. "O g overno tentou colocar de novo, mas a própria Secretaria de Meio Ambiente não deixou, porque não tinha bota-fora [local para despejar a terra retirada]", afirmou.

O desassoreamento do rio daria mais velocidade ao escoamento da água e aumentaria a área de reserva de água perto da barragem, o que impediria o transbordamento para os bairros adjacentes..

Para Ronaldo Delfino de Souza, coordenador do Movimento de Urbanização e Legalização do Pantanal, o governo fez uma opção. "Ou alagava a marginal ou matava as pessoas no Pantanal. E matou", disse. "E ainda bota a culpa nas moradias. O Estado só se preocupa com o escoamento de mercadorias, só pensa em rodovia. Vida humana não importa".

Moradores e deputados estaduais fizeram nesta quarta-feira (17) uma inspeção no local para saber se a abertura das comportas tinha relação com o alagamento no Jardim Romano e no Jardim Pantanal, que já dura nove dias.

O movimento, formado por moradores de diversos bairros localizado na várzea do rio Tietê, acusa o governo do Estado e a prefeitura de manterem a água represada além do necessário como forma de obrigar as famílias a deixarem a região, onde será construído o Parque Linear da Várzea do Rio Tietê. Há anos, os moradores resistem em sair dali, porque dizem que o governo não apresenta um projeto habitacional concreto e apenas oferece uma bolsa-aluguel.

"Não era para as máquinas estarem trabalhando aqui? Cadê? Não tem um funcionário do governo aqui", reclamou, apontando para as ilhas que aparecem no meio do rio, logo acima da barragem da Penha. As dragas são vistas somente na parte de baixo da construção.

"Os córregos do Pantanal já estavam muito cheios três dias antes da chuva. Como não abriram a barragem sabendo que ia chover?", perguntou Souza, indignado. "O que a gente viu aqui é que não houve possibilidade de escoamento, porque a água ultrapassou o nível das comportas e não tinha velocidade para descer, não tinha gravidade", concluiu.

Segundo os registros da barragem, no dia 8 a água ficou acima do nível das comportas por 5 a 6 horas. Sérgio explicou que a queda do rio Tietê é de apenas 4% e por isso a vazão demora cerca de 72 horas desde a barragem de Mogi das Cruzes até o centro da cidade -- isso sem chuva. "É demorado, sempre foi", disse.

"Imagina o que uma hora de comportas fechadas não faz de estrago lá no Pantanal", falou Souza, diante dos dados. "Se fecha aqui, a água para de novo, perde velocidade e vai demorar mais 72 horas para descer", afirmou.

Os deputados estaduais que acompanharam a inspeção concordam con a teoria dos moradores. "Foi feita uma escolha e a corda estourou do lado mais fraco", afirmou o deputado estadual Raul Marcelo (PSOL). "É uma questão grave. A falta de comunicação e de um gerenciamento unificado são prova de uma falta de governância e de um planejamento na administração das barragens, o que levou, em grande parte, ao fato do bairro do Pantanal ter sido alagado".

"Há uma estranha coincidência de que no momento da desocupação há um alagamento desses e ninguém consegue escoar a água. Não havia uma inundação dessas há 15 anos e o nível das águas está subindo mesmo sem chuva. É muito estranho e as autoridades têm que explicar", completou o deputado estadual Adriano Diogo (PT).

Eles farão um relatório sobre a inspeção e pretendem denunciar o caso, junto com a situação da estação de tratamento de esgoto, aos Ministérios Públicos Estadual e Federal

Fabiana Uchinaka
Do UOL Notícias
Em São Paulo

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

CPI investigará denúncias contra Conselho Tutelar de Itaquaquecetuba

Com adesão de 43 deputados estaduais será aberta CPI para averiguar processos irregulares de adoção, entre outras acusações
CPI investigará denúncias contra Conselho Tutelar de Itaquaquecetuba


17/12/2009





Jonathan Constantino,
de São Paulo (SP)

Na tarde de terça-feira (15), foi concluída a coleta de assinaturas entre os deputados estaduais na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), para abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pedindo investigação a respeito de denúncias sobre processos de adoção irregulares, em Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo. As irregularidades teriam ocorrido na gestão do Conselho Tutelar Municipal (CT) do município, entre os anos de 2004 e 2007.


O pedido de abertura de CPI foi solicitado em 19 de novembro, em audiência pública convocada pelo gabinete dos deputados José Cândido (PT) e Raul Marcelo (Psol). Necessitando de 32 assinaturas para instauração da CPI, foi realizada uma campanha de sensibilização dos deputados, com apoio do Tribunal Popular, do FEDDCA, de Hélio Bicudo, Plinio de Arruda Sampaio e da Associação dos Juízes pela Democracia, entre outros. Com quase um mês de campanha foram coletadas 43 assinaturas.


A perspectiva de CPI foi dada em 27 de setembro último, quando o Tribunal Popular organizou audiência com as famílias, em Itaquaquecetuba, para denunciar o procedimento do CT e da promotora da Infância e da Juventude de Itaquaquecetuba, Simone de Divitiis Perez. Contou com a participação do Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente (FEDDCA), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e de representantes dos deputados estaduais José Cândido e Raul Marcelo, membros da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).

Retrospecto
Averiguadas pela reportagem em junho deste ano, abuso de poder, abordagem agressiva e vexatória, retirada arbitrária de crianças do seio familiar são as principais acusações levantadas por um grupo de 17 famílias que tiveram seus filhos tomados, durante a referida gestão. A 152ª Subsecção da OAB de Itaquaquecetuba, à época em que as famílias fizeram as acusações, instaurou inquérito levado à Vara da Infância e da Juventude do município, no qual os indícios de facilitação no processo de adoção por outras famílias eram os mais contundentes.


Os casos começaram a vir à tona quando, em julho de 2007, tomaram posse os conselheiros Alice da Conceição Crescêncio, Cláudia Paixão, Adão Pereira Barbosa, Silas de Oliveira e Emanuel Ingrao. Logo nas primeiras semanas de agosto, começaram a atender diversos pais e familiares que perguntavam por suas crianças.
Após encaminharem as denúncias à Promotoria de Infância e Juventude, passaram a ser perseguidos, o que culminou com o afastamento dos cargos. Durante os quatro meses em que o grupo exerceu suas funções no CT, levantaram 42 casos de famílias que reivindicavam suas crianças, sendo que o número de crianças não pôde ser estimado e havia pais que perderam mais de um filho.


Segundo os familiares, a então presidente do CT, Márcia Major, teria participado da maioria das ações e, em grande parte dos casos, com ajuda do ex-conselheiro Lídio Jonas de Souza. O familiares afirmam que a promotora Simone de Divitiis Perez era conivente.


Fonte:BF

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Trabalho infantil cai quase 50% no Brasil em 15 anos, segundo OIT

BRASÍLIA - O número de crianças e adolescentes que trabalham no Brasil caiu quase 50% entre 1992 e 2007, mas ainda é alto e chega a quase 5 milhões, segundo um relatório divulgado nesta quarta-feira pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O estudo da OIT analisa a situação no país entre 1992, quando havia 8,42 milhões de crianças e adolescentes no mercado de trabalho, e 2007, quando esse número foi de 4,85 milhões.

O relatório destaca que a redução maior, atribuída aos programas do Governo brasileiro para erradicar o trabalho infantil, foi entre as crianças de 10 a 14 anos.

A OIT também disse ter constatado que, como em outros países, os meninos são clara maioria (66%) no universo do trabalho infantil, enquanto as meninas são 34% da mão-de-obra.

O relatório destaca ainda o crescimento da taxa de desemprego entre os jovens de 15 a 24 anos, que passou de 11,9% em 1992 para 17% em 2007.

No entanto, o documento ressalta que, no período analisado, a percentagem de jovens que nem estudam nem trabalham caiu de 21,1% para 18,8%.

Em 2007, segundo a OIT, havia 7,8 milhões de trabalhadores sem emprego no Brasil, dos quais 46,7% (3,6 milhões) tinham de 15 a 24 anos de idade.

Proposta do Fórum Estadual DCA –SP de CPI das Adoções Ilegais em Itaquaquecetuba na Assembléia Legislativa é aprovada!

Depois de quase 3 anos de luta, de mobilização, de tentativas de sensibilização para essa situação, os diversos órgãos nacional (CONANDA, Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público, Comissão da Criança e do Adolescente da Congresso e diversos outros atores) sem sucesso, finalmente em Audiência Pública realizada em Itaquaquecetuba pelo Tribunal Popular: O estado brasileiro no banco dos réus, o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo, fez a proposta da criação de uma CPI , que foi assumida pelo Tribunal Popular, como uma bandeira de luta fundamental, já que se tratava de uma situação de criminalização das famílias e infanto-adolescência empobrecida.

O Tribunal Popular assumiu com o Fórum DCA SP a organização de uma audiência Pública na Assembléia Legislativa, em parceira com a Comissão de Direitos Humanos da ALESP, com a importante contribuição dos mandatos dos Deputados estaduais Raul Marcelo (PSOL) e José Cândido (PT) Presidente da Comissão de DH e na ocasião, foi apresentada a proposta da CPI pelo Deputado Raul Marcelo.


Depois de um mês de sensibilização dos parlamentares, na terça-feira dia 15/12/2009, foi protocolado o requerimento com 43 assinaturas de parlamentares, ultrapassando o número necessário (32 assinaturas), que permite a instalação da CPI.


O CASO


O Caso que levou a CPI das Adoções Ilegais em Itaquaquecetuba, teve inicio em 2004 com um programa do município de Itaququecetuba chamado família acolhedora, que retirou em 3 anos filhos de mais de 40 famílias emboprecidas. Os procedimentos adotados nunca foram claros e envolviam principalmente o Conselho Tutelar e Ministério Público.


Quando encerrou o mandato do Conselho Tutelar que adotou tais procedimentos, o NOVO CT eleito para a gestão 2007/10, passou a receber das famílias, denuncias de retiradas de seus filhos e filhas, sem que tivessem informação de como estava a situação e muitos , sem se quer saber o paradeiro dos seus filhos e filhas.


O Conselho Tutelar passou então a investigar o casos, quando começou a sofrer uma série de investidas e questionamentos improcedentes do MP , que entrou com pedido de afastamento dos CTs porque exerciam dupla jornada de trabalho. O detalhe é que 3 dos 5 CTs estavam com uma função só, a de Conselheiro Tutelar e os outros dois, com pedido de parecer para afastamento nas respectivas secretarias que estavam lotados. Um Juiz substituto na cidade de Itaquaquecetuba concedeu o pedido de afastamento e até a presente ocasião, OU SEJA, DOIS ANOS PASSADOS, apesar de todos os recursos jurídicos realizados pela defesa, o caso não foi julgado e não tem resolutividade alguma.

O fato começou a provocar uma mobilização em torno da situação das famílias, que apresentavam os casos, nesse momento começou uma intensa mobilização para denunciar a situação dessas famílias que eram vitimas do preconceito e equívocos dos órgãos que existem para garantir e defender seus direitos.


A gravidade do fato gerou mobilização em torno dos casos, provocando a denúncia por parte das famílias vitimas do preconceito e equívocos dos órgãos que existem para garantir e defender seus direitos.


Depois de mais de 2 anos de intensa luta, mobilização DAS VÍTIMAS e novos atores como o Tribunal Popular, assumirem esse debate, finalmente AS ações que resultaram na CPI, que poderá esclarecer esses casos , bem como outros casos que já são denunciados pelo estado.

Nesse momento a luta é para que a CPI possa ser instalada para que o mais brevemente essa grave violação possa ser esclarecida e revertida e as crianças possam voltar ao convívio das suas famílias. Em situações como estas, o Estado deve reparar os erros de seus agentes e garantir o apoio técnico, psicológico e social para a reaproximação familiar e a redução dos impactos na vida das crianças e familiares envolvidos.

Governo de São Paulo coloca na TV, campanha mentirosa sobre a FEBEM!

O Governo de São Paulo é mentiroso e muito cara de pau, está no ar uma propaganda desse goveno falando que a FEBEM/Fundação Casa! È engraçado essa propaganda lembra muito aquela da época que o responsável pela FEBEM era o Secretário Gabriel Chalita, que mostrava uma maravilhosa instituição, na ocasião varias mães procuraram a FEBEM solicitando que internasse seus filhos, porque aquela instituição era uma maravilha. Logo em seguida a farsa foi exposta, disversas rebeliões, torturas, ficou provado que era só uma peça publicitaria de campanha.

Nesse momento é pior, o modelo que o governo adotou, falando que era o modelo do já ruim SINASE, que não é, está exposto! Estão acontecendo torturas, mortes e rebeliões em diversas unidades.O Governo de São Paulo, dentro dessa conjuntura, vem e fala, que a FEBEM é um exemplo de instituição e que respeita a lei!

Vivemos mesmo de Pão e Circo!

Desigualdade cresce em cidades do Sudeste

A desigualdade de renda entre as cidades brasileiras cresceu no Sudeste e diminuiu nas regiões Norte, Sul e Centro-Oeste. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga nesta manhã a mais recente fotografia do Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios, com informações de 2007.

* Cinco municípios correspondem a quase um quarto da economia do País



Os 10% municípios que mais produziram riquezas no Sudeste concentraram 39,2 vezes mais renda que os 50% das cidades com menor Produto Interno Bruto (PIB). Em 2003, a renda dos mais ricos superou em 36 vezes a dos mais pobres, passando a 38,5 vezes em 2006. No Brasil todo, em média, o PIB dos maiores produtores foi 24 vezes maior do que a geração de valor pelos menores. No Norte, esta razão recuou de 12,8 para 12,4, enquanto no Sul houve queda ligeira de 13 para 12,6 e, no Centro Oeste, a concentração diminuiu de 21,3 para 20,8.

Mesmo com a tendência, no Norte e Nordeste, os cinco municípios com as maiores economias concentravam mais de 50% do PIB de seus estados.

De acordo com o IBGE, os cinco municípios brasileiros com o maior PIB responderam por 25% do total de riquezas em 2007 - praticamente o mesmo resultado do ano anterior. São Paulo lidera o ranking, com 12% do PIB do País. Rio de Janeiro ainda possui o segundo maior PIB (5,2%), seguido de Brasília (3,8%) e Belo Horizonte e Curitiba, empatados com 1,4% do PIB.

Já os 1.342 municípios com as menores economias responderam por 1% do PIB do país, o mesmo que o verificado no ano anterior.

Os cinco municípios de menor PIB, segundo o IBGE, em 2007, foram Olho d´Água, São Luís, São Miguel da Baixa Grande, e Santo Antônio dos Milagres, os quatro no Piauí, e Areia de Baraúnas, na Paraíba. Esses municípios representavam apenas 0,001% do total do PIB do País.

Fonte:Portal IG

E no Detrito Federal

100 famílias sem-terra expulsas violentamente pela PM no interior de SP

Cerca de 100 famílias (aproximadamente 400 pessoas) foram expulsas de
área rural sob forte coação e intimidação da chamada força tática da
Polícia Militar. A área, que fica próxima ao Acampamento Milton Santos,
do MST, em Americana, fora ocupada no amanhecer de hoje, lembramos que a
mesma área foi ocupada no último dia 12/12 ( sábado) e as mesmas
famílias foram retiradas a força.
A Polícia Militar de Americana, entrou na área nest momento, lançando
bomba de efeito moral e tiros de bala de borracha, o clima esta bastante
tenso, pessoas feridas e no local temos crianças e idosos bastante
apavorados e alguns ferido, mas uma vez a Policia Militar da região age
de forma arbitrária, sem liminar de reintegração, eles agem como
funcionários da Usina, defendem o patrimonio privado, mas a área na qual
a Usina esta instalada é do Estado, já fizemos muitas lutas denunciando
a conivência do Governo e sua paralisia frente a Reforma Agrária e nada
muda.
Pedimos uma audiência imediata com a Secretaria de Justiça de São Paulo/
Itesp e com o Incra.
Aos amigos/as pedimos que repudiem mas esta ação do Estado, enviando
mensagens eletrônicas, ligações para os órgãos competentes e aqueles que
puderem ir para o Acampamento.

Contatos MST:
Ari (19) 8219-6715
Bruno (19) 9702-5152


Secretaria de Justiça
11- 3291-2600

Itesp
11-3293-3000

Incra
11-3823-8520

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Aprovado o Pedido de Instalação da CPI em Itaquaquecetuba

Às 16h21 de 15/12/09, foi protocolado o pedido de instauração de CPI para investigar as denúncias de adoções irregulares em Itaquaquecetuba.

Foram colhidas, no total 43 assinaturas, de Deputados de diversas bancadas.

Grande vitória dos lutdores e lutadoras social!!!

FORMAS DE ORGANIZAÇÃO NA PERIFERIA MOVIMENTOS DE ESQUERDA E A OFENSIVA DO CAPITAL

UMA REFLEXÃO SOBRE NOSSAS PRÁTICAS E NOSSOS RUMOS



Núcleo Cultural Força Ativa completa 20 anos e este momento serve para coroar a nossa teimosia, a persistência e indignação perante a sociedade fundada na exploração do trabalho, na degradação do ser humano em proveito de outros “mais humanos” pela apropriação privada da vida. Serve também para registrar historicamente que é possível um salto de qualidade no pensamento, pela via do trabalho, de jovens proletários descendentes do mais brutal processo civilizatório que é a exploração do trabalho escravizado e que continuam lutando pela libertação humana do trabalho. Convidamos os diversos movimentos que compartilham de alguma forma conosco esta luta para comemorar este momento.




Debate

Nando Comunista – NC Força Ativa
Deivison – Kilombagem


Participação

UNEafro - MNU - DOLORES
CONSULTA POPULAR
ARTICULAÇÃO
FÓRUM ESTADUA DCA


Apresentação musical

“CANTO LIVRE”
MÚSICA CHILENA


Data: 20/12/09 Local: Biblioteca Comunitária Solano Trindade
Av.dos Têxteis 1050 – Cidade Tiradentes – A partir das 11h.

Guerra do lixo massacra catadores

Por Lúcia Rodrigues

A reciclagem do lixo pode ser uma fonte de geração de emprego e renda para milhares de pessoas. O governo federal disponibilizou R$ 5.9 milhões para a construção de 10 cooperativas na capital paulista, mas o projeto não sai do papel porque a Prefeitura de São Paulo emperra o empreendimento. Fotos Jesus Carlos

Viver do que os outros descartam tem sido a rotina de milhares de pessoas espalhadas pelo país e que fazem da coleta de material reciclável a fonte do próprio sustento e de seus familiares. Retirar o ganha-pão do que é jogado fora nada tem de humilhante e pode trazer dignidade para muita gente, dependendo da forma como o poder público encaminha essa questão.

É preciso o empenho das prefeituras, que são as responsáveis diretas pela destinação dos resíduos produzidos pela sociedade. Assegurar a infraestrutura básica para a manutenção das cooperativas de reciclagem e a criação de novas unidades de triagem é elemento decisivo para que esse trabalho deixe de ser penoso e adquira o status de uma profissão como qualquer outra.

Se engana quem considera, no entanto, que o lixo garante apenas a sobrevivência dos pobres. Ao contrário do que muitos imaginam, ele é fonte de riqueza para uma parcela expressiva do empresariado. Na cidade de São Paulo, duas concessionárias, EcoUrbis Ambiental S/A e Loga Ambiental de São Paulo S/A, dividem os recursos gerados pelo
espólio do lixo que é produzido pela população.

Mensalmente, a Prefeitura da capital paulista desembolsa R$ 48 milhões que são repassados a essas duas empresas pelos serviços prestados. A EcoUrbis, responsável pelo lixo das regiões leste e sul, tem entre seus acionistas majoritários a Construtora Queiroz Galvão, a mesma que participa da construção das linhas dois e quatro do Metrô paulista.

A empreiteira era uma das responsáveis, junto com a Camargo Corrêa e OAS, pela obra da estação Pinheiros do metrô que desmoronou, em janeiro de 2007, matando sete pessoas, além de destruir a moradia de inúmeras famílias que residiam no entorno da construção.

A outra concessionária, a Loga, é uma sociedade entre a Vega Engenharia Ambiental S/A, que possui 62,347% de participação acionária, e a Cavo Serviços e Meio Ambiente, que detém 37,653%. A Vega Engenharia surgiu a partir do esfacelamento da Vega Sopave envolvida no escândalo de corrupção que ficou conhecido como a máfia do lixo da cidade de São Paulo, na década de 90. Em sua página na rede mundial de computadores a Vega Ambiental informa que foi constituída em 1997 e que herdou a experiência de sua antecessora, embora não faça alusão à Vega Sopave, apesar de ter mantido sua logomarca.

A Vega Sopave possuía ligação com a construtora OAS, a Cavo pertence à empreiteira Camargo Corrêa. A promiscuidade nas relações entre concessionárias de lixo e empreiteiras se estende a uma fatia do poder público. Os dois segmentos empresariais, ao lado dos bancos, são identificados no cenário nacional como os principais agentes financiadores de campanhas políticas nacionais.

Contra a Camargo Corrêa pesa ainda outra grave acusação: a construtora é identificada como uma das empresas responsáveis pelo financiamento da tortura e da repressão política contra os opositores da ditadura militar. Segundo relatos de ex presos políticos, a Camargo Corrêa financiou, por exemplo, a implantação da Oban (Operação Bandeirante), embrião do famigerado DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna), um dos centros de tortura mais temidos do país, no final da década de 60 e início dos anos 70.

Concessão pública
Tanto a Loga quanto a EcoUrbis têm concessão da Prefeitura de São Paulo para operar os serviços na cidade até 2024. Em seu sítio na internet, a Ecourbis informa que é uma das maiores empresas do segmento na América do Sul nas áreas de coleta, transporte e destinação de resíduos. A empreiteira Queiroz Galvão encabeça a lista dos principais acionistas da empresa.

Juntas, as duas concessionárias recolhem 15 mil toneladas do lixo que é produzido diariamente na capital. Deste total, 9.630 toneladas são de resíduos domiciliares. De acordo com dados apresentados pela Secretaria de Obras da prefeitura paulistana, ao qual está vinculado o Departamento de Limpeza Urbana, Limpurb, apenas 20% desses
resíduos são passíveis de reciclagem.

Mas o percentual efetivamente processado na reciclagem está muito aquém deste índice. A Prefeitura informa que 7% do lixo reciclável recolhido é destinado ao processo de triagem. O baixo percentual, mesmo assim, é questionado e desmentido por especialistas e pessoas que atuam na área de reciclagem. “Esse número não é real, chega muito menos material para os cooperados reciclarem”, sustenta a presidente da Cooperativa Granja Julieta, Mara Lúcia Sobral Santos.

“A base de cálculo da Prefeitura de São Paulo está errada. O cálculo deve ser feito em outro patamar. Para se chegar ao percentual que uma cidade efetivamente recicla de seus resíduos, deve-se levar em conta o total do lixo produzido naquele município”, comenta Ana Maria Luz, do Instituto Gea – Ética e Meio Ambiente, organização da sociedade civil que presta assessoria na implantação de programas de coleta seletiva e reciclagem.

A Prefeitura de São Paulo possui 16 centrais de triagem, ou cooperativas como os catadores preferem chamar, espalhadas pela cidade, onde aproximadamente mil pessoas trabalham na separação do material reciclável na condição de cooperados. Os números são irrisórios, perto da demanda de trabalhadores que querem atuar nessa área e das dimensões geográficas da capital paulista.

As cooperativas, geridas pelos próprios trabalhadores, funcionam como agentes catalisadores na geração de renda. Antes da crise, algumas cooperativas chegaram a distribuir entre seus associados em torno de R$ 1.200 mensalmente.

Mas a falta de vontade política por parte da Prefeitura de São Paulo na efetivação de novas centrais de triagem, inviabiliza o acesso de outras pessoas a essa possibilidade de trabalho e renda. A Prefeitura não se dispõe nem mesmo a receber os recursos que são oferecidos pelo Executivo federal para a implantação de novas cooperativas de reciclagem.

O governo federal disponibilizou para a Prefeitura de São Paulo R$ 5.965 milhões do Orçamento Geral da União, vinculados ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), para a construção de 10 galpões, equipados com prensas enfardadeiras, balanças mecânicas, carrinhos plataforma e empilhadeiras, mas a Prefeitura paulistana não demonstrou interesse em receber esses recursos.

Em ofício encaminhado ao prefeito Gilberto Kassab, em 5 de maio de 2008, o secretário nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, Leodegar Tiscoski, solicita que a Prefeitura entregue os projetos de engenharia e os respectivos planos de trabalho para a Gerência de Desenvolvimento Urbano da Caixa Econômica Federal, para a agilização dos empreendimentos.

Além de não tomar as medidas necessárias para a efetivação das cooperativas, a Prefeitura de São Paulo solicitou que o governo federal reduzisse de 10 para cinco, o número de galpões a serem construídos e equipados. A Prefeitura também quer reduzir o tamanho das áreas dos terrenos onde serão construídas as novas cooperativas de reciclagem.

O diretor de Desenvolvimento e Cooperação Técnica do Ministério das Cidades, Manoel Renato Machado Filho, em ofício encaminhado, em 23 de junho de 2009, à Caixa Econômica Federal, onde os recursos estão depositados à disposição da prefeitura paulistana, esclarece que o governo federal não aceita a proposta de redução do número de galpões, apresentada pela Prefeitura de São Paulo.

“O Ministério das Cidades em momento algum abriu mão da quantidade de galpões a serem construídos.” Ele registra que o número de novas cooperativas foi acordado com o Movimento Nacional de Catadores. A única concessão feita é em relação à área dos terrenos. “Será aceita a redução máxima de 5% na área do galpão, desde que mantida a capacidade de processamento da unidade e a capacidade de inserção dos catadores anteriormente prevista”, enfatiza o texto.

A contrapartida da prefeitura paulistana exigida pelo governo federal, para a efetivação do empreendimento, é a de que o Executivo municipal entre com R$ 228 mil. Os recursos federais continuam à disposição do município, mas a construção dos galpões não saiu do papel.

Um número considerável de pessoas que poderia extrair o sustento dessas 10 novas cooperativas, se já estivessem em funcionamento, continua a ser penalizado pela falta de vontade política e até mesmo desprezo com que o Executivo municipal trata essa questão.

“São Paulo está fora de seu tempo, não priorizou esse tema”, critica o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) ao se referir à ausência de uma política pública consistente por parte da Prefeitura de São Paulo, para a reciclagem do lixo da cidade. Teixeira teve um projeto de lei vetado em 2005, pelo então prefeito José Serra, quando o petista ainda era vereador na capital paulista. O projeto previa a possibilidade de contratação dos catadores pela Prefeitura. Se a lei tivesse sido aprovada, os catadores teriam o direito de receber um valor mensal da Prefeitura pelo trabalho que desenvolvem nas centrais de triagem de material reciclável.

“A Prefeitura de São Paulo, ao invés de ajudar essas pessoas, só trabalha contra”, desabafa o deputado. Ele conta que o Executivo federal apresentou projeto para criar um marco regulatório nessa área e que em breve deve ser aprovado pela Câmara dos Deputados, em Brasília. Pela lei de saneamento, os catadores também podem ser contratados pelo Executivo, com dispensa de licitação.

O descaso da prefeitura paulistana é total, não leva em consideração nem mesmo o papel de agentes ambientais que os catadores desempenham na cidade. Apesar de imprescindíveis, essas pessoas se tornaram invisíveis aos olhos do poder público municipal e da maioria da sociedade. Convivem lado a lado com os mais sofisticados
automóveis, nas principais vias da cidade, puxando suas pesadas carroças sem chamar a atenção.

Só são notados quando o peso excessivo de seus carrinhos abarrotados de material teima em faze-los manter um ritmo mais lento do que o habitualmente tolerado nos tradicionais congestionamentos que paralisam o fluxo na cidade.

“Às vezes somos xingados por alguns motoristas que acham que estamos atrapalhando o trânsito”, revela a catadora Vilma Conceição Lopes, de 42 anos e mãe de 11 filhos, sobre o comportamento de alguns condutores que se irritam com a presença das carrocinhas à sua frente.

Vilma não está associada a nenhuma cooperativa de reciclagem. Ela recolhe o material individualmente pelas ruas do Grajaú, bairro pobre da zona sul, onde reside. “É tudo o que eu mais queria”, ressalta, enquanto puxa a carroça, ao se referir ao desejo de se tornar uma cooperada. Vilma mantém a família com a venda do que recolhe pelas ruas e com as doações que recebe. O marido faz bicos. Ninguém sabe ao certo quantas pessoas vivem às expensas do lixo paulistano, em circunstâncias semelhantes à de Vilma, mas se considera que esse número não é pequeno. É uma legião de famélicos, que aumenta dia a dia em função das dificuldades impostas pela crise econômica. Trabalhar como catador é uma das únicas alternativas que restam para conseguir o sustento da família.

Lúcia Rodrigues é jornalista
luciarodrigues@carosamigos.com.br

Fonte: Revista Caros Amigos

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Assembléia ordinária do Forum EStadual DDCA-SP

dia 19-12-09
das 9h30 às 17h00
LOcal: Revista Debate Socialista
Rua Capitão Cavalcanti, 35a.
Vila Mariana (a 50 metros da saída do Metrô)

Objejtivo geral:
Debater a trajetoria historica do FEDDCA, a construção das bandeiras e estratégias, com vistas a planejar as ações para o ano de 2010 , articulando os Foruns DCAs existentes e fortalecendo a organização de novos.

Objetivos específicos
Deliberar plano de ação:
Identificar referencias e articuladores regionais para efetivar o plano
Estabelecer cronograma
Desenvolver a Escola de Militantes
Fortalecer a identifidade do FEDDCA

09H30 Abertura

Resgate histórico da construção do FEDDCA: o planejamento estratégico, as principais bandeiras e as últimas intervenções

Síntese do Encontro Estadual de 2009



10h10 debate – relato das regiões

Objetivo: identificar a situação do movimento da infância, dificuldades, estratégias e principais ações.



11h30 indicadores de diretrizes estaduais (a partir do resgate histórico e atualização do debate político dos DCAs)

Diretrizes: linhas macros que orientam nossa ação ético-política e pedagógica



12h30 almoço



14h00

Avaliação da Escola de Militantes



15h00

Plano de ação:

Definir diretrizes (conforme debate do resgate histórico e atualização do debate político dos DCAs)

Papel estratégico da Escola de Militante

Identificar referências e articuladores regionais

Prioridades de ação política no Estado

Cronograma de atividades em âmbito estadual

16h30

Apresentação do resultado e encaminhamentos

avaliação



17h00 Término



Obs. Por favor confirmar a presença, para que possamos providenciar alimentação para todos.

E-mail: fedca-sp@ig.com.br

''Só o pobre fica preso no flagrante''

Em livro, jurista diz por que crimes do colarinho branco ficam impunes e liga tráfico à deterioração do sistema penal

Eduardo Kattah
Incomodado com o que considera contradições e falhas do sistema penal brasileiro, o promotor do Juizado Especial de Contagem (MG), Marcelo Cunha de Araújo, de 34 anos, apontou, em linguagem não jurídica, os motivos que levam à impunidade no País, no livro Só É Preso Quem Quer - Impunidade e Ineficiência do Sistema Criminal Brasileiro (Editora Brasport), lançado há pouco.

Como um sistema que não pune cria superpopulação carcerária?

Porque ela é composta por uma população escolhida. Os presos têm o mesmo perfil: jovens de 18 a 25 anos que cometeram algum crime violento ou tráfico de drogas. E só. O direito penal funciona como instrumento de repressão de pessoas que nunca tiveram acesso a nada do Estado. Na minha pesquisa, selecionei um grupo específico, de pessoas que foram pegas por uso de entorpecentes. Vários setores da sociedade usam entorpecentes. Analisei mil processos. Desses, por volta de 92% ganham abaixo de dois salários mínimos. E por volta de 85% das drogas apreendidas correspondem a maconha. Quase todo o resto é crack. Tem um pouco de apreensão de cocaína, mas não tem apreensão de ecstasy, de LSD. Drogas para um público de maior poder aquisitivo.

O sistema continua favorecendo a impunidade?

No Direito existe uma teoria muito forte no Brasil, o "garantismo". Significa que se é a favor da preservação das garantias individuais do cidadão, não em detrimento, mas em primeiro lugar em relação às garantias processuais do Estado. Só que o "garantismo" no Brasil é caricatural. É feito de uma forma que gera impunidade só para uma classe.

Qual deve ser o foco de atuação?

O foco do Direito Penal não é parar de punir estuprador, homicida. Esses crimes violentos precisam ser combatidos, sim. Agora, se não se escolhe um meio específico de Direito Penal para combater crime do colarinho branco você nunca chega numa justiça social. As pessoas que têm o poder de mudar essas normas não têm o mínimo interesse porque serão as primeiras a ser atingidas.

Os juristas também não querem mudanças?

Os juristas e advogados ganham muito dinheiro com isso. Existe todo um discurso não dito para manter as coisas como estão. Os advogados não são antiéticos por usar de todos os meios para manter seus clientes soltos. Tenho amigos que ganham muito para defender causas de repercussão nacional. Essa pessoa vai defender o discurso de mudança? Não.

A impunidade está em grande parte no que o senhor chama de reserva de direito para as pessoas que têm maior poder aquisitivo?

O Supremo (Tribunal Federal) fala que todos os réus têm direito de ficar em liberdade até que os recursos sejam julgados. Essas regras facilitam com que o rico se dê bem. O dispositivo no Código Penal sobre o flagrante não abrange crime do colarinho branco. Então, para começar, só o pobre fica preso no flagrante.

Então o título do livro não deveria ser Só É Preso Quem Não Tem Dinheiro?

Isso surgiu de uma brincadeira. Sempre disse aos alunos: "Só é preso quem quer". Se você não for pego em flagrante, se não deixar seu caso cair na mídia, tiver emprego e residência fixos, nunca vai preso. Pode cometer qualquer crime.

É por isso que o senhor critica a liberdade ao acusado que se apresenta espontaneamente?

Critico a inexistência, no Brasil, da prisão por autoria e materialidade. Você está preso não porque está próximo do momento do crime, porque o juiz mandou. É porque existem sérios indícios de que foi você quem cometeu o crime. O flagrante existe quando o investigado acabou de cometer o crime ou é pego logo após o delito. Se você se apresenta espontaneamente na delegacia, a jurisprudência entende que não há risco de fuga e não é caso de flagrante. É um absurdo. Se a pessoa saiu da situação de flagrante, não vai presa.

A situação não está avançando?

Está piorando. Até a explosão do crack - o tráfico foi um dos grandes movimentos que aumentaram a superpopulação carcerária -, na década de 80, os juízes tinham plenas condições de aplicar um direito penal mais severo. Não existia superpopulação carcerária. Depois houve um sucateamento do processo penal. Soluções alternativas começaram a ser requisitadas dos operadores do direito. A prisão passou a ser algo estritamente necessário.

Quais os crimes mais impunes?

Os do colarinho branco. Em segundo lugar os crimes de trânsito. A pessoa mata três no trânsito e vai prestar serviços à comunidade.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Tribuna Popular em Campinas denuncia violações

Tribuna Popular denuncia discriminação e violações de direito do programa municipal “Tolerância Zero” de Campinas

Em torno de 70 pessoas participaram da sessão da Tribuna Popular Em defesa dos Direitos Humanos e contra Tolerância Zero em Campinas (SP), dia 10 de dezembro, realizada no Centro Pastoral Pio XII. O encontro, em comemoração aos 61 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovou a criação do Núcleo do Tribunal Popular de Campinas.

Estavam presentes vários moradores de rua e representantes das seguintes entidades e organizações do movimento social: MST, CEDAP, DCE-PUCC, DCE-Unicamp, CRESS, Sindicato dos Químicos Unificados, Igreja Luterana, Violar-Unicamp, União Brasileira de Enfermagem, Centro Comunitário do Jd. Santa Lúcia, Pastoral Operária, CEB’s, Ação Popular da Juventude, Cáritas, Grupo Identidade, Instituto Voz Ativa, MNMMR, Movimento Nacional dos Estudantes de Serviço Social, Associação Estadual de Educadores de Rua, Casa Guadalupana, Núcleo de Diversidade Sexual da Unicamp e Conselho Tutelar da Região Sul. Além de militantes do PT e do PSOL.

As entidades e organizações resolveram realizar a Tribuna Popular para denunciar os abusos e arbitrariedades do programa de “higienização social” conhecido como “tolerância zero” realizado pela prefeitura em parceria com a Polícia Militar. O programa visa revitalizar o centro urbano procedendo a uma “limpeza da parcela considerada como ‘sobra ou excedente’ do conjunto da sociedade”, como diz o manifesto aprovado e panfletado após o evento.

Uma das ações deste programa é o “Bom dia morador de rua”. Normalmente, as abordagens às pessoas em situação de rua, prostitutas, travestis e usuários de crack são feitas por um expressivo contingente de policiais e homens fardados e armados da Guarda Municipal da cidade. “Eles chegam batendo”, como denunciou um jovem morador de rua. As pessoas são detidas, levadas à delegacia e “cadastradas”. O principal objetivo destas abordagens é a retirada dos jovens que fazem uso de drogas e das pessoas que estão morando nas ruas do centro da cidade, sem, contudo oferecer programas de inclusão e de acolhimento adequado e de forma consentida. A arbitrariedade e a má fé predominam. As pessoas com origem de outros “lugares” são alvos de intimidações para voltar para sua cidade natal.

Assim foi o caso de Leandro apresentado na Tribuna Popular por entidades e amigos dele. Leandro é um jovem drogadito, morador de rua, que, apesar de possuir família na cidade, recebeu da prefeitura uma passagem só de ida para a cidade do Rio de Janeiro. A intervenção de entidades sociais impediu que o jovem embarcasse. No entanto, de volta para a rua, o jovem foi alvo de espancamento por “carecas neonazistas” e, recentemente, foi preso numa das bocas de fumo da cidade.
A mesa de debate, coordenado por Paulo Bufalo, ex-vereador e militante na área dos direitos da criança e do adolescente, contou com a participação de Paulo Mariante, militante dos Direitos Humanos, ex-coordenador da Parada Gay, ex-presidente do PT da cidade e de Ângela Almeida do OVP e do Tribunal Popular. Mariante ressaltou que o programa municipal de intolerância, na verdade é a criminalização da pobreza integrando repressão com “medidas sociais”. Mariante solidarizou-se ainda com a iniciativa dos militantes de Direitos Humanos de Campinas de reunir-se e criar um núcleo do TP. Já Angela fez uma intervenção apresentando a experiência do Tribunal Popular em dezembro de 2008, considerada por ela como ponto de partida para que os setores progressistas e de esquerda começassem, enfim, a enxergar a criminalização da pobreza, a tortura e as execuções sumárias banalizadas e a integrar a violência policial com um dado da realidade brasileira. Mostrou ainda como essa banalização está inserida na nossa história remota e recente.

O evento foi dedicado à memória dos militantes Zézinho, morto na véspera do evento acometido por um AVC e ao Tião, militante do sindicato dos Químicos, vítima de um infarto. Zezinho iria participar da Tribuna trazendo a denúncia de sua prisão indevida, no último mês, sob a acusação de envolvimento em roubo

Maria Gadú: Altar Particular



Maria Gadú e sua maravilhosa voz, para um bom fim de domingo!

18 anos, 20 histórias

"Não é propriamente um livro de literatura, mas dedilha estórias doces e escabrosas, casos de urgência e de sonhar, em ocas, malocas e cozinhas das beiradas de SP. De uma juventude que inventa um relaxo ou que corre na pesaria de ainda esperancear.
A parte final do livro traz ensaios e reflexões de 39 ativistas e de pesquisadores que pelejam, entrelaçando as estórias da rapaziada às questões de direitos indígenas, racismo, saúde, educação, transporte, lazer e outras águas espirituais de bacia sem fundo".
Edições Toró –Morro do Mineiro/Taboão da Serra/SP
Amigos e companheiros de caminhada,

O CEDECA Interlagos - Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente é uma organização localizada no extremo sul de São Paulo, que tem na sua missão a defesa e garantia dos direitos humanos da criança e adolescente.

Neste sentido, no fim do ano de 2008, percebemos a necessidade de falar de direitos humanos de forma real, simples e acessível, assim como se vive no caminhar do dia-a-dia. Concluímos que o único ponto de partida possível é a vida.

De que modo traduzir a vida? 18 jovens contam suas histórias de vida, 18 jovens que nasceram no ano de 1990, 18 jovens que completaram 18 anos no mês de julho, 18 anos de novos projetos políticos da infância.

A cada voz foi sendo construída essa história...

No dia 14, de noitinha, no Sarau do Binho, em um extremo sul da zona sul de São Paulo, com mesa de debates Histórias de Vida e Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes

Aos que virão depois de nós

Aos que virão depois de nós


I

Eu vivo em tempos sombrios.
Uma linguagem sem malícia é sinal de
estupidez,
uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ainda ri é porque ainda não
recebeu a terrível notícia.

Que tempos são esses, quando
falar sobre flores é quase um crime.
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranqüilamente a rua
já está então inacessível aos amigos
que se encontram necessitados?

É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso. Nado do que eu faço
Dá-me o direito de comer quando eu tenho fome.
Por acaso estou sendo poupado.
(Se a minha sorte me deixa estou perdido!)

Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber,
se a comida que eu como, eu tiro de quem tem fome?
se o copo de água que eu bebo, faz falta a
quem tem sede?
Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.


Eu queria ser um sábio.

Nos livros antigos está escrito o que é a sabedoria:
Manter-se afastado dos problemas do mundo
e sem medo passar o tempo que se tem para
viver na terra;
Seguir seu caminho sem violência,
pagar o mal com o bem,
não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.
Sabedoria é isso!
Mas eu não consigo agir assim.
É verdade, eu vivo em tempos sombrios!

II

Eu vim para a cidade no tempo da desordem,
quando a fome reinava.
Eu vim para o convívio dos homens no tempo
da revolta
e me revoltei ao lado deles.
Assim se passou o tempo
que me foi dado viver sobre a terra.
Eu comi o meu pão no meio das batalhas,
deitei-me entre os assassinos para dormir,
Fiz amor sem muita atenção
e não tive paciência com a natureza.
Assim se passou o tempo
que me foi dado viver sobre a terra.

III

Vocês, que vão emergir das ondas
em que nós perecemos, pensem,
quando falarem das nossas fraquezas,
nos tempos sombrios
de que vocês tiveram a sorte de escapar.

Nós existíamos através da luta de classes,
mudando mais seguidamente de países que de
sapatos, desesperados!
quando só havia injustiça e não havia revolta.

Nós sabemos:
o ódio contra a baixeza
também endurece os rostos!
A cólera contra a injustiça
faz a voz ficar rouca!
Infelizmente, nós,
que queríamos preparar o caminho para a
amizade,
não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
Mas vocês, quando chegar o tempo
em que o homem seja amigo do homem,
pensem em nós
com um pouco de compreensão.

Bertold Brecht