Infância Urgente

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Sobre o bolsa-aluguel II

Aluguel-Social” ou “Tragédia Social”? – Parte II

Mas vamos fazer um exercício de imaginação. Vamos imaginar um burocrata,
que trabalha na Secretaria de Habitação. É difícil, mas vamos imaginar que
esse burocrata não é um lacaio das grandes construtoras e imobiliárias, e
que é uma pessoa honesta e até bem-intencionada. Ou seja, vamos imaginar
um autêntico reformista, uma figura extinta ou em vias de extinção hoje,
dentro das estruturas do Estado.

Esse burocrata passou anos lá, trabalhando duro, como funcionário de
carreira, e recentemente foi chamado a ocupar um cargo junto aos altos
escalões do governo. Chocado com a tragédia do “bolsa-aluguel”, essa
triste figura resolve mudar essa política (na cabeça dele, criar um
“verdadeiro” aluguel-social).

Diferente do que existe hoje, ele propõe a criação de um “banco público de
imóveis”, usando as milhares de casas e apartamentos que se encontram
vazios na cidade de São Paulo, bem como outros imóveis de proprietários em
busca de “segurança” no processo de aluguel. Esses imóveis do “banco
público de imóveis” teriam que atender a certos critérios de qualidade,
para abrigar as famílias de modo “digno”. Estas famílias iriam escolher
sua casa entre os imóveis disponíveis, e o Estado se responsabilizaria
pelo aluguel.

Segundo o plano do nosso burocrata, o Estado teria que controlar o preço
dos aluguéis, evitando os processos de especulação, como os que acontecem
hoje graças ao “bolsa-aluguel”.

Se os atuais membros da Secretaria de Habitação fossem “reformadores
sociais” como eles propagandeiam, seria mais ou menos nesse sentido que
apontaria uma política de aluguel-social. Ou seja, um processo rigidamente
controlado pelo Estado (a forma política do Capital), que não ataca as
raízes dos problemas, não arranha a estrutura da propriedade privada, mas
dá uma interferida de leve nas tais “leis do mercado” para minimizar um
pouco o sofrimento das vítimas das “intervenções urbanas”.

É evidente que, com uma proposta dessa natureza, nosso reformista não
duraria duas semanas no cargo, já que os tempos não são de capitalismo
meio “domesticado”, e sim de capitalismo selvagem, e que sua proposta
entraria em choque com a estratégia geral do Estado de criminalizar e
exterminar parcelas pobres da população e de favorecer a qualquer custo os
interesses de empresários, dos especuladores, etc.

Nem “mercado”, nem “intervencionismo” do Estado

Apesar disso, vale a pena esse esforço de imaginação sobre o “caminho”
reformista, já que isso ajuda a enriquecer os caminhos radicais, e evitar
desvios. Esses caminhos, que pretendemos trilhar, são os da luta direta,
da autonomia popular, da destruição das formas de tutela do Estado e das
empresas, do confronto à ordem existente, da tomada dos prédios e imóveis
abandonados, que passariam a servir às necessidades das pessoas e não do
dinheiro, da decisão coletiva e igualitária sobre a melhor maneira de
organizar, construir ou reformar as habitações e o conjunto do espaço
urbano, do poder popular, enfim.

No entanto, sabemos que hoje o “caminho” conservador reina absoluto; que
mesmo o “caminho” reformista é utópico; e que as propostas revolucionárias
esbarram em todo tipo de obstáculo, num momento em que as bandeiras da
abolição da propriedade privada parecem delírios de grupos sectários. Um
dos principais obstáculos é a dependência em relação ao Estado e a falta
de correlação de forças, que pressionam fortemente para que os caminhos
radicais se degenerem em reformismo, com as conseqüências desastrosas que
conhecemos.

É para mudar esse quadro que lutamos, persistimos, sem arredar pé, como
tantos que vieram antes de nós, junto com muitos que confrontam essa
conjuntura terrível em que nos encontramos. E certamente como tantos que
virão.

Rede Extremo Sul

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