Em reportagem do DFTV 1ª edição do dia 26 de março de 2009, sobre o roubo de oito carros naquela madrugada, o jornalista Alexandre Garcia proferiu o seguinte comentário “de que nada adianta aumentar a pena para seqüestro relâmpago se a maioria dos casos é cometida por menores”.
O Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do Distrito Federal – Cedeca DF vem a público contestar as palavras do jornalista e tecer as seguintes considerações sobre o comportamento da mídia em situações de delitos envolvendo adolescentes.
Acreditamos que um jornalismo responsável, ao divulgar informações e proferir opiniões, deve no mínimo embasar suas informações em dados verossímeis.
Segundo o Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para prevenção do delito e tratamento do delinqüente (ILANUD), do total de crimes cometidos no Brasil menos de 10% são de responsabilidade dos adolescentes. Ou seja, o universo de adolescentes que cometem atos infracionais semelhantes às condutas de crimes no país é bem pequeno.
Além do mais, o Sistema Socioeducativo brasileiro garante a responsabilização dos adolescentes autores de ato infracional podendo o juiz da infância e da juventude, conforme o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), aplicar as medidas de: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional e VII – medidas de proteção do art. 101, I a VI, do mesmo Estatuto.
A prioridade de acordo com o ECA é a colocação do adolescente em medidas em meio aberto (prestação de serviço à comunidade e liberdade assistida), para que a socioeducação se implemente em ambiente mais favorável, e excepcionalmente em espaços de restrição de liberdade, quando o adolescente pratica delitos mais graves (com violência ou grave ameaça).
Apesar do que determina o Estatuto, para o Poder Público do Distrito Federal tais medidas nunca foram prioridades. Analisando o orçamento 2008 quanto aos recursos destinados aos adolescentes em prestação de serviço à comunidade, o DF orçou R$ 450.000,00, empenhando apenas R$ 62.023,75 (14% do valor original) para atender 528 adolescentes. Quanto às medidas de liberdade assistida, o Distrito Federal destinou o patético valor de R$ 778,00, liquidando R$ 563,43 para atender uma média de 1.500 adolescentes.
Diferente do que é divulgado de forma inconseqüente pela mídia, o sistema socioeducativo responsabiliza sim os adolescentes que cometem infrações. Pela baixa execução orçamentária e pela má qualidade do serviço prestado no DF, todavia, tal responsabilização normalmente é de baixa qualidade.
É relevante informarmos aos profissionais dos órgãos de comunicação social que toda vez que se pronunciam pelo aumento do rigor no tratamento dos adolescentes, se aliando ao discurso daqueles que defendem dentre outras coisas a redução da maioridade penal, demonstram ignorância sobre a realidade da prática de delitos no DF.
Segundo dados do IBGE (PNAD/2007) existem no DF 425.000 pessoas entre 10 e 19 anos. Nesse universo apenas 2.675 adolescentes estão no Sistema Socioeducativo, sendo 388 cumprindo medidas de internação (Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei feito pela Presidência da República em 2008). Portanto, menos de 1% dessa população contribui para a prática de delitos e em torno de 0,01% comete aqueles considerados mais graves.
Ademais, não há dados que comprovem que medidas mais duras, como o rebaixamento da idade penal, reduzam os índices de criminalidade juvenil. Ao contrário, o ingresso antecipado no falido sistema penal brasileiro expõe o adolescente a mecanismos reprodutores da violência, como o aumento das chances de reincidência, uma vez que as taxas nas penitenciárias ultrapassam 60% enquanto no sistema socioeducativo se situam abaixo de 20% (CONANDA/2007).
Registra-se ainda que a supracitada reportagem ignorou que no caso concreto os dois adolescentes estavam sob a influência de entorpecentes, uma conseqüência direta da inexistência no Distrito Federal de política publica de prevenção e tratamento da questão das drogas. Analisando o orçamento do DF de 2008 é possível observar que não existiu gasto especializado nesse quesito para a infância e juventude, apesar da Justiça já ter determinado em função de ação proposta pelo Ministério Público.
Por fim, destacamos que posturas como essa do jornalista Alexandre Garcia, que infelizmente são cotidianamente difundidas nos principais meios de comunicação, apenas aumentam os preconceitos sobre o tema, fomentando o cerceamento de direitos sobre a juventude brasileira e sem discutir as reais causas do problema da prática de delitos no Distrito Federal, que é a total omissão do Poder Público quanto à elaboração de políticas públicas eficientes (educação, saúde, assistência social, profissionalização, esporte, habitação, trabalho, cultura, lazer, etc), além da latente necessidade de qualificar o Sistema Socioeducativo nesta Unidade da Federação.
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