Gilberto Costa*
Da Agência Brasil
Em Brasília
As organizações não governamentais (ONGs) internacionais Justiça Global e
Conectas vão apresentar no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas
(ONU) e na Organização dos Estados Americanos (OEA) relatório sobre as
condições de encarceramento no Departamento de Polícia Judiciária (DPJ) de
Vila Velha (ES) e na Unidade de Internação Socioeducativa (Unis) em
Cariacica, na região metropolitana de Vitória.
Um relatório prévio sobre o DPJ e a Unis será apresentado amanhã (12) em
reunião do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH).
Participará da reunião a alta-comissária das Nações Unidas para os
Direitos Humanos, Navanethem Pillay.Leia mais
ONGs apresentam relatório sobre superlotação em cadeia
do Espírito Santo
A Justiça Global e a Conectas visitaram, na última semana, as duas
unidades e, segundo a advogada Tamara Melo, assistente jurídica da Justiça
Global, verificaram superlotação em celas, casos de tortura, falta de
atendimento médico e manutenção de pessoas sob condições insalubres. As
visitas foram feitas juntamente com o Conselho de Direitos Humanos da
Serra, o Fórum de Mulheres, o Comitê de Tortura do Espírito Santo e a
Pastoral da Criança.
Na Unis, os adolescentes em conflito com a lei relataram casos de tortura.
"Muitos falaram, na palavra deles, do 'esculacho': tortura e agressão
física que sofrem com muita frequência dos funcionários da unidade. Eles
contaram sobre ameaças com arma de fogo, uso de cassetete de borracha,
chutes e socos", disse Tamara Melo. "A tortura foi o que mais
impressionou. Nós vimos um menino com marcas evidentes, com o olho roxo
totalmente inchado. Ele havia sido espancado dois dias antes, bateram no
rosto e na cabeça".
Segundo a advogada, os adolescentes mantidos "apontaram marcas de bala nas
paredes das celas, mostrando que ocorre de os agentes atirarem contra
eles, tanto com arma de fogo quanto com arma de borracha. Aquilo lá
parecia uma unidade prisional de adultos, como outra qualquer", informou,
acrescentando que viu policiais andando na unidade com arma de fogo,
meninos transitando algemados e a grande maioria sem estudar e sem
qualquer atividade, em descumprimento ao Estatuto da Criança e do
Adolescente.
"Além disso, vimos outras coisas absurdas como a superlotação [225
adolescentes para 26 agentes plantonistas]. Várias celas estavam alagadas,
com um cheiro horrível. Todos os adolescentes reclamaram muito por não
receber atendimento médico", afirmou.
De acordo com Tamara Melo, a visita flagrou inclusive a deterioração de
instalações novas, como duas alas inauguradas este ano. "Não dava para
acreditar que tinham sido inauguradas há tão pouco tempo. Já estavam
alagadas, o banheiro dos alojamentos superiores pingava na parte de baixo,
onde as mães visitam seus filhos".
Conforme a advogada, alguns adolescentes reclamam muito de serem mantidos
em celas isoladas, onde não têm direito ao banho de sol. "Eles ficam 'na
tranca', como dizem, sem ver o sol. Nos contaram que existe uma cela para
banho de sol. O que é curioso, pois banho de sol é para ver o sol e não
ficar dentro de outra cela". Ela observou que alguns pavilhões parecem
funcionar sob regime disciplinar diferenciado, com adolescentes totalmente
trancados e isolados, uma cela totalmente fechada. Tamara revelou que
alguns adolescentes diziam preferir ficar no pavilhão onde estavam antes,
mesmo insalubre, com um cheiro horrível, ratos, lixo, fiação exposta.
"Eles disseram que estavam enlouquecendo ali".
Procurado pela reportagem, o secretário de Justiça do Espírito Santo,
Ângelo Roncalli, disse que o governo já iniciou a remoção dos adolescentes
da Unis. Uma unidade nova já foi entregue (em Cariacica) e mais quatro
serão entregues (em Linhares e Cachoeiro do Itapemirim). Além dessas novas
unidades, o governo já realizou duas reformas - uma provisória - na
unidade.
Ângelo Roncali se queixou de, apesar de ter autorizado a visita das
organizações não governamentais na Unis, não ter recebido qualquer
relatório. Segundo ele, os representantes das ONGS não percorreram toda a
unidade e não verificaram os procedimentos de atendimento médico e de
funcionamento de oficinas de capacitação. "Eles não viram tudo, não
quiseram ver", reclamou.
Mesmo sem ter sido convidado, o secretário disse à "Agência Brasil" que
pretende acompanhar a próxima reunião do Conselho de Defesa dos Direitos
da Pessoa Humana e prestar esclarecimentos sobre o assunto, que está na
pauta.
* Colaborou Luciana Lima
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