Infância Urgente

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Combater a barbárie com a luta por outra sociedade: Haiti e Brasil CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL 9ª REGIÃO - CRESS-SP

O mundo tem acompanhado a tragédia no Haiti, que expôs ainda mais a grave ausência
de direitos que aquele povo tem sofrido. É importante lembrar que em 1804 os escravos no Haiti lutaram contra seus “senhores”, na Revolução dos Escravos, conquistando a abolição da escravatura e sua independência política. Algo nunca visto e nunca imaginado. Porém, a exploração que já vinha sido feita deixou sérias marcas, como por exemplo, um solo infértil devido ao uso para produzir cana-de-açúcar para a E uropa. E na sequência, continuaram inúmeras agressões pela França, Inglaterra, Estados Unidos, e mais recentemente a "ocupação" inclusive pelas tropas brasileiras. É um país que foi explorado e esquecido, cuja sociabilidade ficou muito comprometida também pela interferência internacional.

O terremoto que destruiu Porto Príncipe somou-se às outras questões sérias de uma
permanente interferência na autonomia da população, com um Estado duro apenas para reter o poder, mas não tendo nenhum investimento no seu desenvolvimento, com instituições corrompidas e ineficazes. Os países estão divulgando as contribuições que enviam para ajuda humanitária, mas segundo a ONU somente 9% chegaram efetivamente. Há queixa ainda de que os países estão agindo com projetos individuais, sem uma coordenação, o que parece incitar mais tumultos. A tragédia deixou cerca de 200 mil mortos e incontáveis feridos que padecem sem ajuda efetiva, abandonados nas ruas em escombros, entre corpos ainda não sepultados.

O Haiti já tinha 380 mil crianças e adolescentes órfãos. O terremoto ampliou gritantemente este número, colocando em risco maior a ocorrência de seqüestros para fins de crimes sexuais e trafico de seres humanos para trabalho escravo.
A tragédia no Haiti escancarou a realidade de um povo com séculos de conflitos, que
não são meramente internos como tem sido veiculado: a realidade vem sendo impulsionada pela ausência do Estado democrático e pelas interferências opressivas de outros países. Em situações de catástrofes defendemos o apoio humanitário, mas é evidente a sua insuficiência,pois frente a uma situação com do Haiti sequer consegue distribuir as doações.

O povo haitiano está sobrevivendo à tragédia porque estão calejados de sofrer sob a
indiferença do mundo. Porém, a visão superficial da real história pode apenas tornar mais um fato e logo esquecido. É importante lembrarmos que a historia de opressão sofrida ao longo dos séculos agravou os conflitos existentes frente ao terremoto. Diante de tanto sofrimento e desespero, não se abalam os interesses de governos de todo o mundo. Uma delegação da sociedade civil brasileira esteve no Haiti ano passado, identificando que 85% dos empenhos do Brasil era para a repressão, não para ajuda humanitária. O Brasil está no Haiti desde 2004, e tem certa simpatia daquele povo por ser reconhecido como o país do futebol, mas isso não possibilitou aperfeiçoar alguma ação humanitária. Lembremos do objetivo do país em ter a cadeira na ONU, no Conselho de Segurança. Segundo noticias, ficaremos mais cinco anos “contribuindo” com o país. Lamentamos que jovens brasileiros com suas boas
intenções estejam sendo mal conduzidos passando anos sem efetivamente contribuir para
mudanças no país. A repressão e o controle, como já dito, sempre existiu no Haiti, que não precisa do Brasil para isso. Aliás, a fala do Consul do Haiti em São Paulo está sendo repudiada por todos que defendem a livre expressao religiosa e o Estado laico. Há muita tensão com outras opiniões: do consulado que justificou a fala do seu representante, aos que a banalizam dizendo que o povo haitiano é homofóbico e preconceituoso (portanto, que não poderiam se queixar de discriminação). Questões de violência como a homofobia, lebofobia,machismo, discriminação e o opressão étnica são estruturais, decorrente de desigualdade e segregação social, mantida pelo poder político-econômico de grupos. Neste cenário, a presença internacional também não tem contribuído para a afirmação da identidade da população haitiana, pelo contrário.

A luta do povo haitiano é expressao de tantas outras pelo mundo, como a dos brasileiros,que convivemos com poucos milionários às custas do trabalho do povo e milhões de pessoas sem direitos garantidos. Nossa expectativa é que a populaçao mundial possa refletir sobre as reais causas da miséria, da opressão e da reprodução da violência. Somos solidários a todos os povos que lutam por dignidade, por direitos, por fraternidade e por liberdade.Não é,contudo, com ajuda humanitária em momentos de tragédias que se resume esta posição, mas com nossa pressão política junto ao nosso governo brasileiro para que tenha ações efetivas para influenciar os poderes do mundo. O Brasil está muito “bem visto” mundialmente. É preciso pressionar para que nosso poder seja utilizado para contribuir com a ruptura das causas históricas da barbárie.


Assistentes sociais: na luta com os trabalhadores
pela construção de outra sociedade
Brasil, São Paulo, 20 de janeiro de 2010.

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