Desde o fim do regime militar e com o chamado processo de redemocratização, nos anos 1980, uma série de mudanças (pontuais, importante ressaltar) se iniciaria no Brasil. Esperava-se que a efervescência política daquele período produziria um novo formato institucional e social. Houve, sem dúvida, avanços institucionais, consubstanciados pela Constituição de 1988, embora as transformações sociais que se faziam necessárias tenham ficado pelo caminho. A Constituição, como o resultado de intensas disputas, incorporou diversas demandas dos movimentos sociais e de outras organizações da sociedade civil. Inclusive aquelas referentes aos direitos humanos num sentido amplo do termo, bem como em seu significado mais estrito, isto é, aquele que se refere ao direito à vida, à liberdade, do ir e vir. Contudo, determinadas práticas institucionais, especialmente aquelas associadas às instituições de segurança pública, insistiram em persistir, e o pior, em se reproduzirem. Além disso, a permanência da violência institucionalizada (que implica na produção em massa de mortes, tortura, seqüestro e outros crimes contra a integridade física) contou com a anuência e justificativa dos governos eleitos a partir daquele momento. O estado do Rio de Janeiro se tornou um exemplo às avessas deste processo. Diante do crescimento da violência urbana, especialmente aquela ligada ao tráfico de drogas e armas, e das dificuldades em enfrentá-la, a alternativa eleita foi a da “guerra ao tráfico”, que encontrou na política do enfrentamento direto com os grupos armados de traficantes sua forma de ser, transformando-se cada vez mais em uma política de extermínio. Define as favelas como o lócus do crime e seus moradores como potencialmente criminosos, tratando a todos como bandidos. Isto não deixou de ter efeitos trágicos: centenas de pessoas passaram a morrer pelas mãos dos agentes de segurança pública. A partir disso, diversas organizações de direitos humanos começaram a questionar tal política e também passaram a ser atacadas por isso. Seus militantes, principalmente aqueles que moram em favelas e que tiveram algum parente assassinado por policiais, tornaram-se alvo dessa violência institucionalizada. As denúncias freqüentes de arbitrariedades e mortes injustas começaram a incomodar.
No último dia 6 de maio, o militante da Rede de Comunidades e Movimentos contra Violência, Josilmar Macário, sofreu um atentado quando estava dirigindo seu táxi no viaduto São Sebastião, próximo ao Sambódromo, no bairro do Catumbi. Josilmar é irmão de Josenildo dos Santos, assassinado por policiais militares do 1° Batalhão, em abril de 2009. Desde então, seus familiares, amigos e a Rede contra Violência iniciaram uma luta por justiça. Esta levaria à denúncia de quatro PMs por homicídio. Essa vitória da família de Josenildo e da comunidade parece ter irritado os policiais do 1° BPM, levando-os a tentar uma represália. Após o atentado, foi realizado o registro de ocorrência na delegacia, não sem dificuldades, visto que o delegado não queria registrar o caso como sendo um atentado. Foi feito também exame de perícia confirmando que o que atingiu o carro fora uma bala desferida por alguma arma de fogo. Em seguida, o fato foi encaminhado para uma reunião em que estava presente o ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos e o secretário da Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos. Neste encontro, seria sugerido pelo ministro que o militante em questão fosse encaminhado para o Programa Nacional de Defesa dos Defensores. Todavia, descumprindo esta orientação, a secretaria estadual pretendia colocá-lo no Programa de Proteção a Testemunha (PROVITA), o que foi rechaçado pela Rede e por Josilmar Macário, por considerarem que este programa anula a vida do vitimada, tornando-o um foragido, apesar do crime ter sido cometido contra ele. Neste sentido, a Rede contra Violência e outras organizações de direitos humanos do Rio de Janeiro reivindicam que:
* O governo (federal e estadual) inclua Josilmar Macário imediatamente no Programa Nacional de Defesa dos Defensores e não em outro.
* A secretaria de Segurança Pública e o governador afastem imediatamente os policiais envolvidos no caso da morte de Josenildo dos Santos, irmão de Macário, e provavelmente os responsáveis pelo atentado, além da exigência de uma investigação rigorosa dos policiais (inclusive comando) do 1º Batalhão. A liberdade destes agentes tem representado uma constante ameaça a Macário e a todos os seus familiares.
* Cessem imediatamente a perseguição aos militantes de direitos humanos no Estado do Rio de Janeiro e no Brasil.
* Sejam alteradas as políticas de segurança pública baseadas no confronto, no enfrentamento e no extermínio.
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