Fazer com que a criança e o adolescente transforme o conhecimento obtido em sala de aula em ferramentas que possam ser aplicadas em sua vida é um dos desafios dos educadores. Muitas vezes, o processo de aprendizado esbarra em obstáculos que estão além das paredes da escola. Nas casas dos alunos Cristiano Tavares, Matheus Barbosa e Katelin Ferreira, o apoio à educação é dificultado pelas condições socioeconômicas limitadas e pela carência das comunidades onde vivem, em Manguinhos, no Estácio e no Complexo do Alemão.
Diante das dificuldades de leitura e escrita dos filhos, os pais, que possuem baixa escolaridade, sentem-se impossibilitados para ajudá-los, tampouco podem pagar a alguém que os substitua nessa tarefa, como uma professora particular. Para as famílias dos estudantes Jéssica Miranda e André Stivanello, a dificuldade é vencer o desinteresse pelo estudo. Nessa luta, há adversários eletrônicos poderosos: computador, televisão, MP3 e celular. Com tantas opções de diversão, a escola parece não atrair os jovens. Como consequência, proliferação de notas baixas e a reprovação no fim do ano.
Como atrair e estimular os estudantes?
Para os educadores ouvidos pelo EXTRA, a escola pública tem feito pouco para conquistar o interesse dos alunos. A estrutura tradicional, o currículo engessado e até a permissividade no ambiente escolar são apontados como fatores de desestímulo. Por outro lado, os pesquisadores destacam a necessidade de políticas educacionais para apoiar as famílias mais carentes.
Veja abaixo a análise de educadores:
A professora da Faculdade de Educação da Unirio, Angela Martins, aposta no tempo integral para apoiar famílias mais pobres. Foto: Fabiano Rocha"Todas as crianças têm potencial, não se pode justificar o fracasso pela carência. No entanto, se a carência for muito grande, a atividade essencial é a de colocar comida na mesa. Muitas vezes, essa família está tão execrada que é difícil a escola ter uma importância maior.
A baixa escolaridade dos pais também tem uma influência grande, ainda mais se a família não vê importância na escola. Para os pais que não têm condições de ajudar os filhos no dever de casa, a escola com tempo de aula ampliado, em que tivesse um explicador, seria uma solução. O tempo qualitativo não é só para os mais pobres, é para todos. A escola da elite tem o tempo ampliado, porque sabe que é necessário esse período maior para o processo de aprendizagem. E esse tempo a mais tem que ser oferecido com professor de qualidade e com aulas de artes e de música integradas ao currículo", afirmou a professora da Faculdade de Educação da Unirio, Angela Martins.
O professor da Faculdade de Educação da Uerj, Zacarias Gama, ressalta a necessidade da criação de políticas que elevem a escolaridade dos pais. Foto: Fabiano Rocha"Uma sociedade que se diga democrática tem necessidade de garantir que todos os seus cidadãos, sem exceção, tenham assegurados os direitos sociais inscritos na Constituição Federal: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, e assistência aos desamparados. Sem esses direitos, como esperar um bom rendimento escolar de uma criança que mora num barraco de madeira numa comunidade assaltada pela violência?
Temos urgência de alguma política pública que eleve a escolaridade dos pais. Enquanto isso não ocorre, a escola de tempo integral, efetivamente comprometida com a promoção do ser humano, pode ser implantada. No entanto, essas escolas devem ser pensadas para todas as nossas crianças e adolescentes e não apenas para as famílias consideradas mais pobres", acredita o educador da Faculdade de Educação da Uerj, Zacarias Gama.
A professora da Faculdade de Educação da Uerj, Bertha Valle, acredita que o currículo da escola está fora da realidade dos alunos. Foto: Fabiano Rocha"A escola está fora da realidade da vida. O aluno questiona por que tem que aprender determinados assuntos e, às vezes, o professor não sabe responder a essa pergunta. De forma atrativa, é possível fazer uma aula sem custo. Ensinar química usando a bula de um remédio, por exemplo. As crianças hoje têm mais liberdade, mas a escola é a mesma. Os professores, geralmente, fazem discurso, não estimulam o aluno a fazer perguntas", opina a educadora da Faculdade de Educação da Uerj, Bertha Gama.
O professor da Faculdade de Educação da UFRJ Márcio da Costa afirma que a escola precisa ser atraente, mas também um lugar de seriedade. Foto: Fabiano Rocha"Dos nove alunos entrevistados, poucos associam a escola a um ambiente de trabalho. Em geral, os estudantes dizem que ela é um espaço de convívio e não de aprimoramento. Temos uma pesquisa recente que mostra que a escola, na maioria das vezes, não é atraente. Isso se comprova quando vemos alunos que largaram os estudos e não querem prosseguir. É necessário retomar a escola como local de trabalho, em que os atos dos alunos têm consequência. A escola tem que ser atraente, mas também deve ser um lugar de seriedade", aposta o pesquisador da Faculdade de Educação da UFRJ, Márcio da Costa.
O presidente da Associação Brasileira de Educação (ABE), Edgar Flexa Ribeiro, acredita que o currículo das escolas deve ser modificado. Foto: Fabiano Rocha "A partir da segunda etapa do ensino fundamental, o conteúdo dado em sala de aula começa a se afastar do aluno. Ele tem dificuldade de ver a relação do que aprende com o seu cotidiano. Dependendo do meio familiar, a mãe e o pai estão trabalhando, e o menino de 15 anos acaba sendo sugado pelo mercado de trabalho, passando a ser uma fonte de recursos para a família. O currículo deveria ser revisto, de forma que se abrisse à pluralidade de formas de ensinar", acredita o presidente da Associação Brasileira de Educação (ABE), Edgar Flexa Ribeiro.
Fonte: Extra Online
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