Infância Urgente

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Rota em Roraima nunca foi desmontada

Aliciar mulheres e adolescentes para a prostituição em Boa Vista virou profissão para algumas pessoas que passaram a viver exclusivamente desse ramo. E não se trata apenas de conseguir mulheres para atender clientelas de hotéis, autoridades e pessoas da elite local. As cafetinas e cafetões há muito tempo tornaram-se os principais contatos de tráfico de mulheres para garimpos e boates da Venezuela, Guiana e Suriname.

O mais impressionante é que os primeiros casos comprovados de tráfico de seres humanos surgiram em 2002, mas até agora não houve ninguém punido pela Justiça. Desde aquele ano, Roraima sempre aparece nas 145 rotas de prostituição infantil e de adolescentes, nacionais e internacionais, dados divulgados pela Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual (Pestraf), realizada por ONGs, a partir de um estudo piloto da Organização dos Estados Americanos (OEA)...



Histórias de garotas aliciadas por cafetinas não faltam em Roraima. Já em 2002, uma das principais rotas identificadas na região Norte foi localizada entre Manaus (AM) e Boa Vista. Meninas de 12 a 17 anos eram aliciadas em Manaus e trazidas para Boa Vista com promessa de emprego como garçonete ou programas com custo inicial de R$ 100,00. Depois, eram levadas para boates da Venezuela e da Guiana, onde o programa ultrapassaria o valor de US$ 300.

Até hoje esse esquema está ativo, com os mesmos personagens atuando, mas reforçado por outras pessoas (quase todas com nomes fictícios) que passaram a ser recrutadas para que as ações não ficassem concentradas nas mesmas pessoas, desta forma contribuindo para dificultar as investigações policiais e o trabalho do Ministério Público Federal.

Enquanto as autoridades roraimenses não saem do discurso de tornar Roraima uma grande rota de exportação de riquezas para o Caribe, cafetões e cafetinas já fazem essa rota traficando mulheres, exportando inclusive adolescentes aliciadas para servir o mercado do sexo europeu.

Conforme o relatório da Pestraf, a região Norte do País apresenta o maior número de rotas (76), seguida da região Nordeste (69), Sudeste (35), Centro-Oeste (33) e Sul (28).

A Espanha é o principal destino deste tráfico, com 32 rotas identificadas. Em seguida, a Holanda (com 11 rotas), a Venezuela (com 10) e a Itália (com 9 rotas). Quem abastece as 10 rotas venezuelanas é Roraima. De lá, muitas mulheres conseguem seguir para a Europa.

Roraima como rota tem um motivo particular: a facilidade com que se atravessa fronteira, seja pela deficiência na fiscalização ao longo da BR-174 ou por existir uma estrada clandestina na fronteira com a Venezuela, chamada de “Transmuambeira”; e ainda porque é fácil corromper guardas e militares venezuelanos.

Empresários europeus, com destaque para Espanha e Portugal, costumam viajar pessoalmente para os balneários do Caribe e na cidade industrial de Puerto Ordaz recrutarem adolescentes e mulheres brasileiras.

A fronteira com a Venezuela é especialmente preferida pelas quadrilhas de traficantes europeus porque nas boates venezuelanas pelo menos 80% das prostitutas são brasileiras. Em Santa Elena de Uairén, há boates que só trabalham com mulheres brasileiras, a fim de atender esse tipo de clientela.

Não existem estatísticas nem relatório que confirmem um número aproximado de mulheres traficadas, pois não há controle rígido na fronteira. As adolescentes trazidas de Manaus e outras daqui mesmo, de Boa Vista, atravessam a fronteira em táxi até Santa Elena do Uiarén por meio da Transmoambeira, uma estrada de terra que passa por detrás dos postos de fiscalização da Receita Federal, da Polícia Federal e do Ministério da Agricultura.

Essas garotas passam uma temporada em boates de Santa Elena e depois seguem de ônibus e em pequenos aviões para os balneários do Caribe e para as cidades garimpeiras e industriais da Venezuela. Na fronteira, de maneira informal, todos sabem desse grande esquema, inclusive de valores: cada menina custa, em média, R$ 1.500,00, podendo chegar a mais se for menor de idade e “sem experiência no mercado”.

Denúncia de tráfico surgiu em 2002


Conforme relatórios pesquisados pela Folha, o tráfico de adolescentes e de meninas da Amazônia para Boa Vista e Venezuela começou em 1995, mas somente em 2002 passou a ser de conhecimento público quando várias mães começaram a denunciar o desaparecimento de suas filhas em Manaus (AM).

A pressão dessas mães, com apoio da imprensa, obrigou a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente do Amazonas a agir. Chegou-se a uma quadrilha internacional de traficantes de meninas que atuava – e continua atuando até hoje - em Manaus, Boa Vista, Guiana e Venezuela. Hoje a atuação se ampliou para Suriname, onde também há garimpos.

Na época, quatro pessoas foram indiciadas por tráfico e exploração de menores, entre elas dois amazonenses e duas cafetinas de Roraima, proprietárias das extintas boates Afrodite e MC.

Nessa época, foi de fundamental importância a atuação do presidente do Conselho Tutelar de Boa Vista, Leandro Farias, que por meio da Folha começou a denunciar a quadrilha. Depois de receber ameaças de morte, ele teve que deixar Roraima.

Atuando em conjunto com a polícia amazonense, Leandro Farias conseguiu resgatar seis adolescentes de Manaus nas boates que pertenciam aos quatro acusados. As meninas eram mantidas em regime de semi-escravidão, obrigadas a trabalhar pesado para pagar o dinheiro da passagem. Conforme a denúncia das próprias adolescentes, elas estavam sendo preparadas para trabalhar na Venezuela e na Guiana.

Na época, uma das garotas de 15 anos de idade denunciou a existência de um esquema de venda de documentos falsos em Boa Vista, com participação de policiais, e na Praça do Relógio e no Bar do Castelinho, em Manaus. Ela também foi ameaçada e hoje ninguém sabe dizer seu destino.

Todos os acusados responderam o processo em liberdade e continuam a atuar na Venezuela e em Boa Vista. Outras pessoas passaram a ser investigadas, inclusive há vários processos no Ministério Público Federal em Roraima, que está fazendo um levantamento detalhado sobre o assunto.

Garota ‘vende’ colega por R$ 600,00


Ela tem 14 anos e “fugiu” de casa duas vezes, quando de forma voluntária foi morar no abrigo feminino, há cerca de dois anos. Na escola já brigou com outras meninas e feriu a diretora no braço. Até hoje ela pula o muro da escola para fazer programas sempre com homens bem mais velhos e que “tenham carrões”.

T. G. mora no bairro Calungá com a família, que já perdeu qualquer forma de controle sobre a garota. “Meus pais não agiram quando ela dava problema na escola e agora não sabem mais o que fazer”, disse a irmã de 21 anos, que por ter nome semelhante apresenta as mesmas iniciais.

T. conheceu cedo esse mundo de aliciamento que ronda as escolas públicas. E, não por coincidência, é prima de uma das acusadas do esquema de pedofilia desmontado pela Polícia Federal, em 2008, cujos presos foram empresários, um oficial da Polícia Militar e o ex-procurador do Estado, Luciano Queiroz.

Até hoje, a garota viaja para a fronteira com a Venezuela, mas ela insiste em dizer que é apenas para “se divertir e tomar cerveja”. Acompanhada sempre de um celular, o aparelho toca insistentemente e, algumas vezes, ela se afasta para atender a ligação.

Há dois anos nessa vida, ela se encaminha para se profissionalizar nesse ramo. Recentemente, literalmente “vendeu” uma amiga virgem por R$ 600,00 para um homem, identificado pela irmã dela como “um velho que tem dinheiro”.

A irmã disse que já acompanhou a adolescente numa festa particular fechada, onde se reúnem geralmente homens da sociedade que aliciam meninas. Ela afirmou que a exigência da irmã para que fosse à festa era dizer que tinha 15 anos de idade. Com seu biotipo aparentando ser bem mais nova, não foi difícil sustentar a mentira.

“Um deles me perguntava a toda hora se eu tinha mesmo 15 anos”, disse. “Anotei telefone de alguns e nome de quase todos que estavam na festa. Pensei em denunciar, mas não deu coragem”, complementou ao narrar os problemas que a caçula de 14 anos dá para a família.

Fonte: Água Boa

Um comentário:

Kassu disse...

Agradeço por ter reproduzido esta matéria do noos blog.

Estamos aqui em Água Boa nos confins de Mato Grosso.

Ver em nosso Blog do Kassu inúmeras matérias sobre meio ambiente questões indígenas etc.

Logo mais vou postar vídeos ssobre plantio de pequi em nosso sítio.

Por Kassu www.aguaboanews.com.br