“Vai doer mais em mim do que em você.” A frase, repetida por gerações, marca as contradições do castigo físico que, ainda hoje é uma das formas mais comuns de violência contra a criança e o adolescente dentro do próprio lar.
Socialmente aceita como método corretivo pela maioria dos pais, a palmada ou o puxão de orelha dos filhos quando se comportam mal, entre outras formas de castigo corporal, é considerada uma maneira eficaz de educá-los, contribuindo para o controle e a disciplina. Especialistas ouvidos pelo iG e pesquisas feitas em todo o mundo mostram, no entanto, que essa cultura está errada.
“Essa lógica não poderia estar mais equivocada. O castigo físico é uma violência que invade e destrói a auto-estima das crianças, as transformam em adultos também violentos e pode resultar em consequências ainda mais graves”, observa o consultor da Unesco e professor da Universidade de Brasília (UnB), Célio da Cunha.
Em agosto deste ano, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos pediu a todos os 25 países membros que, até 2011, formalizem mecanismos de prevenção contra a violência infantil, incluindo medidas que possibilitem aos meninos e meninas denunciar maus tratos e, principalmente, serem ouvidos.
Atualmente, apenas três proíbem os castigos físicos legalmente: Uruguai, Venezuela e Costa Rica. Em todo o mundo, apenas 24 nações consideram os castigos ilegais.
No Brasil, existe um projeto de lei tramitando no Congresso, de número 2654/03, que quer pôr fim às agressões físicas, como, por exemplo, as palmadas. De autoria da deputada Maria do Rosário (PT/RS), o projeto foi elaborado por especialistas na área da infância do Laboratório de Estudos da Criança da Universidade de São Paulo (USP), que defendem uma educação sem violência.
Uma vez aprovado, não terá caráter punitivo no âmbito judicial, mas sim pedagógico. O agressor será submetido ao artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ou seja, terá de participar de programas de orientação familiar e, se necessário, tratamento psicológico.
Violência
Numa rara estatística sobre esse tipo de violência, a publicação Situação Mundial da Infância 2007, do Fundo das Nações Unidas para a Infância – Unicef, aponta que, todos os anos, 275 milhões de meninos e meninas de todo mundo sofrem violência doméstica e padecem das consequências de uma turbulenta vida familiar.
Entre os casos mais comuns estão diferentes tipos de violência como a física, gerada ao se aplicar castigos corporais; a verbal e psicológica, manifestada por palavras ofensivas, xingamentos, humilhações, gritos e insultos; e a violência sexual contra crianças e adolescentes, que consiste em praticar condutas sexuais seja por ameaças, agressão física ou chantagem emocional.
“A situação é grave porque muitos pais foram vítima de palmadas e repetem o procedimento sem entender que eles também foram vítimas”, observa a educadora Ligia Machado.
De acordo com ela, estudos demonstram que algumas crianças que foram expostas à violência doméstica acabaram se transformando também em agressores, perpetuando o círculo vicioso durante gerações.
Levantamento divulgado pela Agência de Notícia dos Direitos da Infância (Anid) aponta que pesquisas realizadas em alguns dos principais países em desenvolvimento – como China, Colômbia, Egito, Filipinas, Índia, México e África do Sul – indicam que existe uma notável correlação entre a violência contra as mulheres e a violência contra a infância.
Portal IG
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