Número de famílias que estão à espera do benefício consta de cadastro do governo
Pasta do Desenvolvimento Social vai tentar convencer Lula a ampliar o programa; inclusão da "fila" custaria mais R$ 2,2 bilhões por ano
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Após um pente-fino realizado no final do ano passado em seu cadastro nacional de pobres e extremamente pobres, o Ministério do Desenvolvimento Social detectou 2,2 milhões de famílias que, apesar de reunirem todas as condições de perfil e de renda, estão fora do Bolsa Família.
A pasta rejeita esse termo, mas essas famílias estão na "fila" e sem vaga para atendimento no principal programa de transferência de renda do governo federal, que hoje atende cerca de 11 milhões de famílias.
O custo anual para incluí-las de uma vez no Bolsa Família é de R$ 2,2 bilhões, e não há nenhuma previsão orçamentária para isso neste ano.
Com base na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), do IBGE, e em pedidos e reclamações que chegam a todo momento do interior do país, o governo já estimava em cerca de 2 milhões o número de famílias nessas condições.
A identificação exata desses 2,2 milhões de famílias, porém, ocorreu em recente varredura no Cadastro Único, banco de dados alimentado pelas prefeituras e que reúne famílias com renda per capita de até meio salário mínimo.
A inscrição nesse cadastro é o primeiro passo obrigatório para que famílias com renda per capita de até R$ 120 possam acessar futuramente o benefício do Bolsa Família.
Atualmente as cotas de atendimento, por município, estão definidas por antigas pesquisas do IBGE, como o Censo 2000 e a Pnad 2004.
Em 2009, porém, será usado pelo programa um novo modelo do IBGE, conhecido como "espacialização da pobreza", que poderá indicar com mais precisão as demandas regionais e municipais. Esses mapas traçam diferentes linhas de pobreza, com dados do Censo 2000 e da Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2002/2003.
Ampliação
A ideia do ministério é apresentar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva esse novo mapeamento da demanda existente e a lista de espera do programa para convencê-lo a ampliar a verba do Bolsa Família -para 2009, por enquanto, estão previstos R$ 11,9 bilhões, ou seja, R$ 1,2 bilhão a mais do que o gasto no ano passado.
Além de aguardar a ampliação de quase 20% das verbas do programa, o ministério planeja mudar a faixa de renda para entrada no Bolsa Família. A "linha", hoje em R$ 120 per capita, será reajustada com base na inflação e em outros fatores ainda em estudo, como os mapas de "espacialização" da pobreza do IBGE.
Por exemplo: se a "linha" subir para R$ 150, as famílias "extremamente pobres", com direito ao benefício básico de R$ 62, serão aquelas com renda per capita de até R$ 75 (hoje esse corte é em R$ 60).
A última vez que o governo mexeu nessas faixas foi em 2006, quando o limite de inclusão passou de R$ 100 para R$ 120 per capita.
Hoje, uma família incluída no programa pode receber entre R$ 20 e R$ 182. O teto é pago àquelas consideradas extremamente pobres, sendo R$ 62 de benefício básico, R$ 20 por criança de até 15 anos (limite de três) e R$ 30 por adolescente de 16 e 17 anos (limite de dois).
Em 2008, o governo federal reajustou em 8% o valor do benefício e estendeu o programa aos adolescentes.
Sem documentos, mais de 5 mi estão excluídos do programa
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Além dos 2,2 milhões de famílias inscritas no cadastro único de políticas sociais, na fila para o Bolsa Família, outros 5 milhões de pessoas podem estar excluídos do programa por não terem documentos.
Esse é o número estimado pelo governo para a população sem registro civil. A maior parte dela poderia se enquadrar no programa, diz Lúcia Modesto, secretária Nacional de Renda de Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Para se inscrever no cadastro, o responsável legal pela família tem de apresentar CPF ou título de eleitor, já que carteiras de identidade podem ser emitidas por diversos Estados, o que daria margem à duplicidade de benefícios.
A exigência, embora reduza o risco de fraude, acaba por dificultar a entrada de participantes no programa.
É o caso de Cenita, 39, Agnaldo, 47, e de seus oito filhos, dos quais seis vivem com o casal em um casebre de dois cômodos, na zona rural de Mirante, na Bahia. O município, a 539 km de Salvador, faz parte do chamado "triângulo da miséria", entre os municípios de Caetanos e Bom Jesus da Serra.
Em setembro, quando a Folha contatou o casal, eles só tinham o RG. O orçamento da família não é suficiente para alimentar a todos. "Aqui a gente vive de doações, um punhado de feijão, arroz, farinha. Tem dia que não vem nada", disse Cenita.
Cleudiane, 3, Tatiane, 8, os gêmeos Cosme e Damião, 10, Tânia, 11, e Jean, 12, nem sempre almoçam ou jantam. "Só mando eles para a escola se comerem. Não posso mandar eles com fome. Tem que ter força para estudar", contou a mãe.
Para reduzir as estatísticas de sub-registro, o governo lançou uma campanha, coordenada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, para estimular as pessoas a fazerem seus documentos.
De acordo com a secretária responsável pelo Bolsa Família, um outro desafio do governo é a inclusão de moradores de rua no programa.
(ANGELA PINHO E EDUARDO SCOLESE)
Fonte: FSP
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