Sem meios para agir
Na rede de proteção às crianças e adolescentes,os conselhos tutelares cumprem papel central.
Cabe a eles exigir tratamento psicológico ou médico quando necessário,incluir meninos e meninas em programas sociais ou acompanhar o desempenho escolar se há situação de risco. Em casos de violência sexual, os conselheiros têm poder até mesmo
para pedir o afastamento do lar do pai ou padrasto, por exemplo,quando eles são os agressores.
Apesar da importância vital, os conselhos operam sem estrutura mínima para defender os direitos da infância e da adolescência. Em muitos municípios e até mesmo no Distrito Federal, os conselheiros trabalham em locais improvisados,sem carro ou telefone.
Em Ceilândia, atender uma criança de forma sigilosa é missão impossível. A sala onde funciona o conselho tutelar não tem divisórias.
O acolhimento de meninos, meninas e suas famílias é feito diante das pessoas que esperam por atendimento. Os funcionários usaram os armários para fazer paredes improvisadas, mas qualquer conversa, mesmo que a meia-voz, é ouvida por todos.
Somada à infra-estrutura precária,a sobrecarga de trabalho compromete a qualidade do
atendimento. Na teoria, o Conselho de Ceilândia é responsável por atender 700 mil pessoas. Na prática, os cinco conselheiros fazem 50 novos atendimentos por dia. “É humanamente impossível.
A demanda é tão grande que não conseguimos fazer o encaminhamento ideal”, explica a conselheira Selma da Costa. O chefe da Coordenação de Conselhos Tutelares da Secretaria de Justiça e Cidadania do DF, Maurício Albernaz, conta que o governo já tem pronto um projeto para criar 11 novos conselhos tutelares no Distrito Federal, dois deles só em Ceilândia. A medida poderia melhorar o atendimento, mas, segundo o governo, não há recursos disponíveis. “O GDF já conseguiu aprimorar muito a
estrutura dos conselhos. Todos receberam computadores novos.
O único obstáculo para a criação dos novos conselhos é a lei de responsabilidade fiscal”, explica Maurício. O custo de cada conselho não é alto. Resume-se aos
gastos com água, luz, telefone,além do salário dos funcionários,que no DF é de R$ 2.100.
Além de cobrar a criação de mais unidades, o Ministério Público do DF entrou com ações civis para exigir a construção de sedes adequadas em cada um dos 10 conselhos. O promotor de Defesa da Infância e da Juventude, Oto de Quadros, explica que o ideal seria uma entidade para cada região administrativa do Distrito Federal. “A resolução 75 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente)determina um conselho tutelar para cada grupo de 200 mil habitantes. E no caso de unidades com regiões administrativas, deveria ser um para cada uma delas”, detalha Oto de Quadros.
Situação crítica
Se na capital do país a situação está complicada, no interior a carência dos conselhos tutelares é crítica. Em Goianinha, município de 20 mil moradores no Rio
Grande do Norte, a unidade de proteção à criança e ao adolescente funciona em uma pequena sala sem computador e com apenas um telefone. A conselheira Sara Tatiane de Lima reclama da falta de condições para as equipes cumprirem suas obrigações
legais. “Não temos meios de percorrer o município. Já houve casos de eu levar meninas que sofreram violência sexual para a minha casa porque o conselho
não tem estrutura”, explica.
No município de Melgaço, no interior do Pará, a sede do conselho tutelar funciona em uma sala com apenas nove metros quadrados, cedida pela prefeitura. Os conselheiros não contam com telefone para receber as denúncias,tampouco com acesso à internet.
O meio de transporte dos guardiões da infância e adolescência é uma bicicleta velha. A dificuldade de locomoção prejudica o trabalho, pois mais da metade dos 20
mil habitantes do município moram na zona rural, em locais que só são acessíveis de barco. “Com verba para gasolina, chegaríamos a esses lugares. Mas, como não podemos circular, temos de ficar esperando as denúncias aparecerem”,reclama o conselheiro Helton Guimarães.
Em Natal, o conselho tutelar da região sul, um dos cinco da capital potiguar, funciona em uma casa grande e de fácil acesso.Mas, no início do ano, ficou às escuras. A energia foi cortada porque a prefeitura não repassou os
recursos de manutenção. “Também ficamos alguns meses sem opções de locomoção, já que tínhamos um carro à disposição,mas não havia motorista”, conta a conselheira Rosana Mireille Barbosa, que é assistente social.
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