Atualmente se constata existir toda uma geração crescida sob a vigência de normas estabelecidas, há duas décadas, pela Convenção sobre os Direitos da Criança, exatamente desde quando ocorreu a fase de transição dos regimes ditatoriais para o exercício dos direitos democráticos em vários países da América do Sul. Observa-se que, apesar do fortalecimento da Democracia, ainda persistem procedimentos inalterados de iniquidade, em parte gerados pelas desigualdades socioeconômicas, nos quais ressaltam distintas formas de violência contra a criança.
Prevalece, ainda, um misto de autoritarismo e omissão nas relações entre adultos, sejam estes agentes do Estado ou particulares, e crianças e adolescentes de todos os segmentos sociais. Em paralelo aos avanços conquistados no campo político, ainda subsistem fortes ranços decorrentes de uma anacrônica postura exercida por autoridades, familiares, professores e pessoas supostamente responsáveis pela proteção dos mais jovens.
A Convenção sobre os Direitos da Criança foi ratificada por 193 países, entre eles, o Brasil, constituindo um recorde mundial de consenso a respeito do tema. No campo jurídico, toda ratificação de tratados internacionais sobre direitos humanos exige de cada Estado a adoção de medidas efetivas no sentido de assegurar o respeito à defesa dos direitos de crianças e adolescentes dentro de seu território.
De 20 anos até hoje, estabeleceu-se a necessidade de impostergável sincronia entre teoria e ações públicas no setor, expressa em normas orientadoras para a interpretação do conteúdo da legislação concernente ao assunto. O Estatuto da Criança e do Adolescente, no Brasil, e outras medidas adotadas no Uruguai, Venezuela e Costa Rica são efeito direto dos preceitos consolidados pela Convenção.
O Informe Mundial de Violência contra a Criança, apresentado perante a Assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU), demonstra que essa execrável forma de crueldade existe em países dos diversos continentes e culturas, ao mesmo tempo em que é condenado veementemente nos próprios locais onde é perpetrada. O que o bom senso não compreende é que um problema tão visceralmente ligado ao próprio futuro da Humanidade ainda seja tratado de maneira tão limitada e fragmentada, mesmo onde existem legislações tidas entre as mais perfeitas do mundo, como é o caso do Brasil.
O quadro persistente da situação de risco é consideravelmente agravado pelo avanço devastador do consumo de drogas, sobretudo o crack, que faz aumentar em progressão geométrica o número de homicídios e de outras modalidades de crimes entre menores de 18 anos. De janeiro a novembro último, nada menos que 151 jovens, com idades entre 12 e 17 anos, foram assassinados somente na Região Metropolitana de Fortaleza, um número inaceitável.
Torna-se notória a falta de enfoque mais realista sobre o problema e de uma decisão política contundente, tanto por parte dos governos quanto da sociedade, para deter esse ambíguo processo a desenrolar-se em tão problemático contexto, no qual se mesclam múltiplas faces da omissão e da irresponsabilidade social.
Fonte: Diário do Nordeste
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