Infância Urgente

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Sitiados, jovens moradores do Alemão se comunicam pela internet

Com o clima tenso no Complexo do Alemão e moradores escondidos em suas casas, jovens recorreram à internet para continuar se comunicando com amigos nas favelas da região.
De acordo com o jovem R.S. , de 17 anos, a comunicação está sendo feita “somente pela internet”, sobretudo via Twitter e chats.

“Não saí de casa desde ontem. Estou aqui dentro somente assistindo televisão. De vez em quando vou ao portão ver como estão as coisas”, conta ele via mensagens do MSN, na conversa marcada com a BBC Brasil por meio do Twitter.

Morador do Morro do Adeus, uma das 15 favelas do complexo, o estudante está em casa com a mãe e os irmãos e, como os demais moradores entrevistados, prefere não ser identificado.

Segundo R.S., a situação está tranquila na região por enquanto. “Mas acho que a polícia vai realmente entrar na comunidade e instalar a futura UPP (Unidade de Polícia Pacificadora)”, opina.
A estudante G.S., de 16 anos, está sem aulas desde quinta-feira e desde então está de “castigo” em casa. “É demais, eu que adoro sair, nem posso. Quase ninguém sai na rua com esses policiais aqui. Eles tinham que ir embora logo. Nada a ver eles virem para cá, estava tudo normal”, conta ela pelo chat. “Não sei por que esse Sérgio Cabral (o governador do Rio) colocou isso aqui.”

Moradora do Complexo Central, no Alemão, a jovem considera “normal” ter traficantes na comunidade e diz que a única coisa que incomoda “é o cheiro forte das maconhas que eles fumam”. Ela perdeu a semana de provas na escola e conta que moradores estão com “medo demais”.
“Tem gente até indo para outros lugares, viajando. Minha vizinha foi para Campo Grande. Uma outra foi para Caxias”, conta.
Na casa de familiares
O estudante M.B., de 23 anos, preferiu ir para a casa da tia no bairro de Olaria para conseguir ir a um casamento. “Provavelmente não vou ter como voltar para casa de noite, então resolvi dormir aqui”, diz.
Ele está aflito. “Estou fora da comunidade, deixei amigos lá dentro e estou doido para que isso acabe logo e que amanhã a gente acorde mais sossegado e feliz.”
M.B. conta que o clima na comunidade é de nervosismo e apreensão. “As pessoas estão esperando o enfrentamento, o embate. A polícia não entrou, mas também não está fora. Ficam rodeando, às vezes tem um embate”.
“Essa situação de meio-termo é complicada demais para a comunidade, principalmente para as pessoas que trabalham e têm as suas famílias fora”, diz o estudante.
Permanência do Estado
M.B. diz que, se o Estado conseguir ocupar a comunidade, como fez na operação de quinta-feira na Vila Cruzeiro, é fundamental que ele realmente fique.
“Se for só para fazer uma mídia dessa guerra, fazer uma matança e depois ir embora, só quem vai perder é a comunidade”, diz ele, apontando que a ausência do Estado nos complexos da Penha e do Alemão é histórica.
“Quem criou esse problema foi o próprio Estado. Quando ele se ausenta, alguém tem que cumprir esse papel. Quem fez isso durante muito tempo foi o bandido, suprindo o que a população precisava”.
M.B. diz que muitos moradores não acreditam no argumento que era dado pelo Estado. “Para não entrar, eles dizem que o tráfico não deixa. Mas todo mundo sabe que isso é mentira. Assim o Estado pôde se isentar, durante décadas, de oferecer todos os serviços públicos de que a sociedade precisa”, critica.
O estudante torce para que a entrada do Estado não traga mais problemas para a população. Ele teme a entrada de milícias, grupos de policiais corruptos que dominam favelas para extrair lucro da população.
“Acho que uma UPP aqui correria um grande risco de virar uma milícia. Sabemos que milícias fazem coisas que os bandidos não fazem. A questão deles é só dinheiro, inventam taxas e querem cobrar sobre tudo. O Complexo do Alemão seria uma mina de ouro para eles, porque a população é gigante”, diz.

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