Infância Urgente

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

20 estudantes são ameaçados de expulsão da USP por Decreto da Ditadura Militar

           
Vinte estudantes estão ameaçados de “eliminação” da Universidade de São Paulo (USP) por conta de seu ativismo político. Quatro deles, por conta da ocupação da própria Reitoria em 2007, e dezesseis, pela retomada de parte da moradia estudantil (CRUSP) durante este ano. Todos eles respondem a processo administrativo por praticar ato atentatório à moral ou aos bons costumes”, “perturbar os trabalhos escolares e a administração da universidade”, “atentar contra o nome e a imagem da universidade”. Eles devem depor nos dias 23 e 30 de novembro, na Reitoria da USP. Atos de apoio estão previstos para os dois dias de depoimento: às 9h da manhã do dia 23 e às 12h do dia 30.

A pena para as acusações contra os estudantes é a eliminação (que pode significar um afastamento permanente da instituição). As acusações estão baseadas em um decreto da Ditadura Militar de 1972, n° 52.906 do Regimento Geral da USP. Tal decreto foi instituído em 1972, sob a égide do AI-5. Tanto o decreto da USP quanto o Ato Institucional número 5 que lhe dava sustentação jurídica, foram redigidos pelo ex-reitor da USP e ex-ministro da Justiça da ditadura militar, Luis Antonio Gama e Silva.   Mas se o AI-5 foi revogado em 1978, o decreto da USP ainda vigora de forma “transitória” há algumas décadas e, inconstitucionalmente, ainda proíbe greves e manifestações políticas, prevendo sanções para quem “promover manifestação ou propaganda de caráter político-partidário, racial ou religioso, bem como incitar, promover ou apoiar ausências coletivas aos trabalhos escolares; afixar cartazes fora dos locais”.

O Regimento da USP foi parcialmente reformado em 1988. Entretanto, mais de 25 anos após o fim da ditadura no Brasil, seus fundamentos arbitrários ainda são mantidos. Atualmente, ele se soma a outros movimentos que remetem à Ditadura Militar, como a intervenção da Polícia Militar em greves e manifestações no interior do campus universitário, a indicação direta do reitor pelo governador do Estado e a aprovação de decretos e dispositivos que ferem a autonomia universitária definida no próprio estatuto da USP.

No caso dos quatro estudantes associados à ocupação da Reitoria da Universidade em 2007, o processo, depois de arquivado – o que foi parte do acordo entre administração e estudantes para colocar fim ao movimento –, foi recentemente reaberto com base no depoimento de um único estudante, que não participou do movimento.

O mesmo decreto 5.906 do Regimento Geral da Universidade foi utilizado na justificativa da punição ao professor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB), que denunciou à imprensa irregularidades nos laboratórios de sua unidade. Regidos por um decreto de disciplina similar, funcionários da USP e seu sindicato, o Sintusp, respondem a mais de 20 processos por participação em greves e manifestações, que são direitos constitucionais, na luta pela isonomia salarial. Um caso particular, ocorrido em 2007, é o do funcionário e dirigente sindical demitido por clara motivação política, abrindo um precedente punitivo na categoria que não existia desde o fim da Ditadura.

A USP é a maior e mais importante universidade brasileira, pelo seu papel na vida científica, cultural e política do país. O exercício da democracia e do direito de livre expressão tem sido negado de forma autoritária a sua comunidade, sob o argumento de que é uma atitude incompatível com a  necessidade de um funcionamento mais “eficiente”da universidade, exigido tanto pelo maior controle do Estado, quanto pelo crescimento das parcerias da universidade com o mercado.  . O projeto de “modernização acadêmica” do reitor Grandino Rodas é abertamente avesso ao ativismo sindical e estudantil, já que calcado em premiações para as faculdades e institutos “mais eficazes”, incentivando “a competição entre os diferentes núcleos da USP”, como descreve o próprio reitor em recente artigo à Revista Veja em 27 de outubro. No entanto, para realizar tal objetivo, parece estar mobilizando dispositivos jurídicos e institucionais extemporâneos e incompatíveis com o regime democrático formalmente instituído no país.

Mais informações com o advogado Gustavo Seferian Scheffer Machado: (11) 9108-3143 ou seferianadv@gmail.com.

Links:
· Decreto 52.906 de 1972: www.usp.br/leginf/rg/d52906.htm
Artigo revista Veja 27 de outubro: www.usp.br/imprensa/wp-content/uploads/revista-veja.pdf

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