TRÊS WALLACES POR DIA
Há quase 11 anos atrás, em setembro de 1998, Wallace de Almeida – um jovem negro, morador de favela – foi morto pela polícia na porta da casa de sua mãe. Embora as provas apontassem para execução, o homicídio foi registrado como morte em “confronto” com policiais. Desde então, foram registrados no Rio de Janeiro quase 10 mil casos de auto de resistência, além de um altíssimo número de desaparecimentos, de encontro de cadáveres e de encontro de ossadas.
Nesta terça-feira, dia 25 de agosto, o governo do estado organizou uma cerimônia oficial de reparação simbólica a 30 ex-presos políticos e convidou as famílias de Wallace de Almeida e Jailton Neri – outro jovem morto por policiais, em 1992 – para um pedido formal de “desculpas”. Curiosamente o evento reuniu vítimas de violência policial na ditadura e no chamado período democrático. Continuamos, hoje, submetidos a uma polícia que tortura e mata com a conivência de um Estado que considera número de mortos como critério de eficiência.
O evento no Palácio Guanabara foi claramente transformado em um ato político eleitoreiro. Em uma postura nada democrática, a cerimônia não cedeu espaço para os familiares e nem para organizações da sociedade civil, se restringindo aos pronunciamentos das autoridades. As mortes de Wallace e Jailton foram tratadas como exemplos de crimes que já não acontecem, de casos que, assim como a ditadura militar, residem em um passado datado – a “década de 90”. O governo quis dar a entender que está reparando erros de administrações passadas. Em sua fala, o governador Sérgio Cabral Filho omitiu que os agentes do Estado envolvidos na morte de Wallace e Jailton não foram responsabilizados; que os assassinatos dos jovens tiveram que tramitar na Comissão de Direitos Humanos da OEA para que a reparação fosse feita; e que, a cada dia, em média três jovens são mortos pela polícia em favelas do Rio de Janeiro, em operações orientadas pela sua Secretaria de Segurança.
A política de segurança pública não pode menosprezar a vida dos moradores de comunidades pobres do Rio de Janeiro. A certeza de que hoje mesmo, ao fim do dia, teremos perdido mais três jovens negros – mais três wallaces ou jailtons – não pode ser considerada como um dado positivo de uma política de segurança pública eficiente, mas sim como um dado de uma política de extermínio.
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