Infância Urgente

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Redes de prostituição em MS aliciam meninas na porta de escolas

'Fantástico' investigou recrutamento de menores em Campo Grande (MS).
Garotas de menos de 15 anos são aliciadas também por anúncios.

O Fantástico investigou redes de prostituição no Mato Grosso do Sul durante três semanas e descobriu que o aliciamento de garotas menores de idade acontece por anúncio em jornais e até na porta de escolas.

Nesta semana, Mariana Brandão foi presa na capital Campo Grande, acusada de aliciar e comandar uma rede de prostituição de menores de idade.

Segundo a polícia, a mulher entrava em ação quando achava garotas alunas de escola pública, bonitas e com 15 anos, no máximo.

“Falava que era dinheiro fácil, que não precisava trabalhar muito”, revela uma jovem. A adolescente, de 14 anos, conta que foi abordada na porta da escola, na periferia de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. “Da primeira vez, eu não quis. Na quarta vez que ela foi atrás de mim, eu aceitei”, conta a adolescente.

A garota contou à reportagem que a aliciadora "vinha buscar perto da minha casa. Aí depois levava para a casa dela e os homens iam lá e escolhiam a menina". Segundo a jovem, ela chegou a ficar na casa com 15 meninas, todas menores de idade, a mais nova com 12 anos.


A adolescente diz que foi convencida pela aliciadora a vender a virgindade. "Era para ela separar as meninas que eram virgens. O homem foi e me escolheu", conta. Segundo a jovem, o cliente pagou R$ 150 por sua virgindade, sendo que R$ 50 foram para a aliciadora.


Mariana Brandão disse ao "Fantástico": “nem faço mais nada disso, depois que eu fiquei sabendo que essa guria era menor”.

O aliciamento de menores ocorre também por anúncios de jornal. Uma produtora ligou para os telefones que aparecem nos classificados, simulando interesse em ser garota de programa.

O aliciador disse que "primeiro eu tenho que ir até você, ver se você se encaixa naquilo que nós queremos". "Se você se encaixar, você está feita pelo resto da sua vida", disse o homem.



“Normalmente se criam situações na relação entre esse cafetão e essa menina que envolvem dívidas criadas por esse marginal de modo que ela, sempre devendo dinheiro a ele, não consegue sair dessa vida”, explica o juiz da Infância e da Juventude Carlos Alberto Garcette de Almeida.

A Secretaria Especial dos Direitos Humanos fez um ranking das denúncias recebidas nos últimos seis anos pelo Disque 100, sobre abuso e exploração sexual de menores: Mato Grosso do Sul aparece em segundo lugar, atrás apenas do Distrito Federal.

As investigações mostram que em Campo Grande, os encontros sexuais com menores geralmente acontecem durante o dia, quando os pais estão trabalhando. Segundo a polícia, os programas costumam ser feitos em motéis. Os donos são suspeitos de participar do esquema de prostituição.



A Delegacia de Proteção à Criança de Campo Grande recebe em média 80 denúncias por mês de exploração sexual de menores.



“Normalmente homens mais velhos, de 40, 50, 60 anos. Um desses clientes tinha 79 anos de idade. São clientes de classe média, classe média alta”, diz a delegada do departamento de Proteção à Criança e ao adolescente, Regina Márcia Rodrigues da Mota.

Motel

Outra adolescente, de 14 anos, que também diz ter sido aliciada na porta da escola, conta que ninguém perguntou a idade dela quando entrou no motel com um cliente.

“Ele conhecia o dono do motel, que já sabia que ele saía com menores”, contou outra jovem. No motel, ninguém quis comentar a denúncia.

A mãe de uma menina aliciada diz que a filha seria levada para outro estado com documento falso. “Eu ia perder ela, porque eles estavam preparando documentação. Uma menina de 14 anos com RG de 18”, conta a mãe.

São Paulo e Paraná

Os aliciadores oferecem vaga para acompanhantes no interior de São Paulo e em Umuarama, no Paraná. No anúncio de Umuarama, o aviso: só para maiores de 18 anos, mas por telefone o dono da boate propõe uma alternativa para a produtora, que diz ter interesse em ser acompanhante e querer levar uma amiga.



"Se ela tivesse um RG falso, uma coisa assim. Eu não sou obrigado a saber se o documento é falso ou verdadeiro, compreendeste?", diz o dono da boate.

Com uma câmera escondida, uma produtora do "Fantástico" entrou na boate do Paraná, a 600 quilômetros de Campo Grande. Na semana passada, havia sete garotas de programa no local. O "Fantástico" conseguiu falar com uma delas. A jovem não revelou a idade, mas deixou escapar que é bem nova.

Na casa, há alojamentos para as mulheres e o "Fantástico" fez outra descoberta. A boate funciona como vitrine do sexo. Quem se interessa pelo programa é levado por um caminho interno, para dentro do motel. Basta andar um pouco, passar por um portão e já está no motel.

Sem apresentar nenhum documento, é possível ir para um dos quartos com a garota de programa.

Procurado pelo "Fantástico", o dono da boate preferiu não gravar entrevista. Ele se justificou por telefone: “Eu tenho uma casa registrada dentro dos parâmetros legais. Dentro da minha casa, não se pratica sexo. Se elas saem, se o cliente leva ela para o hotel, leva ela para um motel, ela vai porque ela quer, são maiores de idade”, afirma.

O crime de favorecimento à prostituição tem pena máxima de cinco anos de reclusão; o tráfico interno de pessoas, de oito anos; a exploração sexual de menores, dez anos. Aliciadores e donos de boates podem responder por esses crimes. As penas máximas somam 23 anos de cadeia.

Vítimas

“É um crime extremamente difícil de ser investigado, porque as adolescentes não se comportam como vitimas. Normalmente elas protegem a pessoa do aliciador e protegem também seus clientes”, conta a delegada do departamento de Proteção à Criança e ao adolescente, Regina Márcia Rodrigues da Mota.

“O que a gente precisa é que as famílias, os professores, comecem a perceber como que essas crianças estão circulando no seu território, com quem estão andando e qual o tipo de lazer que estão frequentando”, alerta Estela Márcia Scandola, do Instituto Brasileiro de Inovações Pró-Sociedade.

“Tirou a inocência da minha filha. É uma criança”, fala uma mãe. Uma adolescente diz: "aquilo não era vida pra uma pessoa".

Fonte: G1

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