Infância Urgente

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Brasil se explica à Corte da OEA por caos em presídio de Rondônia

Daniella Fernandes, do Opera Mundi - 01/10/2009 - 12h03

Ministério Público de Rondônia

Presos ficaram nus durante 12 horas após rebelião no presídio Urso Branco

A situação de caos em uma das maiores penitenciárias da região Norte do país levou o Brasil a ter de se explicar à Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Tribunal da OEA (Organização dos Estados Americanos) realizou audiência nesta quarta-feira (30/9) com representantes do Governo Federal e do Estado de Rondônia sobre as denúncias de violação aos direitos humanos no presídio José Mário Alves, conhecido como Urso Branco, onde foram registrados mais de 100 homicídios em oito anos.

Leia Mais:
OAB quer processar Estado por manter presos em contêiner no ES
Santa Catarina e Pará também mantém presos em contêineres
Responsáveis por precariedade do sistema carcerário podem ser multados
Cela onde cabem 36 presos abriga 281 no Espírito Santo

Além dos assassinatos, existem relatos de violência sistemática, insalubridade e falta de assistência médica e jurídica na penitenciária, que fica em Porto Velho. Segundo Tâmara Melo, advogada da ONG Justiça Global, que acompanhou a audiência, os presos reclamam de maus tratos por parte dos agentes penitenciários, que vão de “socos, pontapés e coronhadas” até serem obrigados a “ficar nus na quadra, debaixo de sol, e caminhar de joelhos por horas”.

“No mês passado, houve uma tentativa de homicídio com arma de fogo praticada por um agente penitenciário contra quatro presos do Urso Branco, sendo que uma das vítimas permanece à espera de atendimento médico adequado até hoje’, contou Tamara Melo, que visitou o presídio há dez dias

De acordo com o promotor Marcos Valério Tessila de Melo, que representou no Ministério Público de Rondônia, as condições carcerárias da unidade prisional Urso Branco estão melhorando, porém, não na proporção que se espera.

Além do MP e da Justiça Global, também estiveram em San José, na Costa Rica —onde fica a sede da Corte de Direitos Humanos—, representantes do Ministério das Relações Exteriores, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, do Departamento Penitenciário Nacional, do TJ-RO (Tribunal de Justiça de Rondônia), do governo do Estado.

A audiência serviu para tratar do cumprimento das medidas provisórias expedidas pelo Tribunal contra o Brasil. Ou seja, a audiência pode transformar as resoluções, medidas provisórias, em um processo, e daí poderiam surgir condenações, como ocorreu com o caso dos grampos telefônicos ilegais contra líderes do MST e com o caso Damião Ximenes. A Corte é responsável por aplicar e interpretar a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário.

Histórico

Não é a primeira vez que o Brasil enfrenta a OEA por conta das denúncias em relação ao presídio Urso Branco. Em 2002, o Estado brasileiro foi condenado a cumprir medidas provisórias, resoluções, para garantir a vida e a integridade dos detentos, investigar os acontecimentos e adequar o presídio às normas internacionais de proteção dos direitos humanos.

Desde então, o descumprimento das determinações motivaram cinco novas resoluções da Corte que reafirmam a sistemática violação dos direitos humanos e a incapacidade do Estado brasileiro em implementar tais medidas. Apesar do cenário negativo, a diretora executiva da Justiça Global, Sandra Carvalho, afirma que a situação estaria pior se as resoluções não tivessem sido emitidas.

“É esperado que o Brasil supere as dificuldades do presídio. O Brasil conseguiu superar o quadro”, disse Sandra. O ideal, segundo ela, é que sejam criadas novas vagas e seja feita uma investigação rigorosa sobre os homicídios e torturas.

Em oito anos, foram mais de 100 mortes violentas contabilizadas dentro do presídio. Em outubro de 2008, a PGR (Procuradoria Geral da República) solicitou a intervenção federal em Rondônia baseada no relatório “Urso Branco: A Institucionalização da Barbárie”, elaborado pela Comissão Justiça e Paz de Porto Velho e pela Justiça Global. Foi a primeira vez que violações sistemáticas de direitos humanos resultaram em um pedido deste tipo. O caso ainda aguarda decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

Condições

Entre 2002 e meados de 2006, os presos não eram vigiados e “grupos rivais digladiavam-se pelo poder dentro dos pavilhões da unidade”, segundo este relatório. Outro ponto diz que, além das celas serem interligadas para permitir a livre circulação dos presos pelas alas do presídio, “agentes penitenciários permaneciam fora da carceragem alegando falta de segurança para trabalhar” e que o “resultado foram as chacinas em 2002 e 2004, com presos degolando e mutilando outros internos perante familiares, agentes públicos e imprensa.”

A situação do maior presídio de Rondônia, uma das maiores unidades prisionais da região norte do país, foi o primeiro processo movido contra o Estado brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Uma medição técnica feita nas celas desocupadas constatou que a temperatura interna no ambiente é de 39 graus. Os presos relataram que o calor é ainda pior com o número elevado de detentos e a falta de funcionamento dos exaustores. A entrada de drogas é de difícil controle e agentes penitenciários estimam que entrem em média 1,5 quilo de drogas por fim de semana no presídio. O acesso à água é permitido cinco vezes por dia.

O Urso Branco foi, construído no final da década de 1990 para abrigar somente presos provisórios, aqueles não condenados em definitivo, mas atualmente, abriga em sua maioria presos condenados, em grande parte jovens de 18 a 30 anos, com baixo nível de escolaridade e condenados principalmente por crimes relacionados ao tráfico de drogas.

Fonte:Última Instância

Nenhum comentário: