O problema do consumo de drogas em São Luís continua crescendo e o que é pior, está se diversificando. Novos usos de substâncias psicoativas são descobertos numa rapidez assustadora em detrimento do que já está criminalizado pela lei. Uma dos profissionais que atestam esse quadro é Selma Marques, mestre em Saúde Ambiente e doutoranda do Programa de Políticas Públicas da Ufma, vinculada a um grupo de pesquisa do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Maranhão, chamado G10, dedicado a analisar realidades de exclusão social.
Ela escolheu trabalhar a linha de pesquisa que enfoca a criança, adolescência e família, devido à sua aproximação longa com o tema. Profissional experiente, ela atuou diversos anos como assistente social na Vale com pesquisas sobre dependência química de adolescentes. "O que podemos observar é o aumento de substâncias psicoativas e que o grupo de consumidor de crianças e adolescentes cada vez mais tem diminuído a idade. Antes, eles iniciavam por volta dos 12, 13 e 14 anos. Hoje essa idade baixou para 7, 8, 9 anos. Isso é alarmante", disse a pesquisadora.
Ela informou que o consumo inclui desde as drogas lícitas - como álcool e cigarro - até as não-lícitas. "Na pesquisa que desenvolvo, eu me surpreendi com o uso de substâncias por parte de menores que até então eu desconhecia como o cheiro de gás de cozinha, cheiro de gasolina, chá de pilha alcalina, e até a trituração do material de radiografia que eles utilizam para fazer chá. Antes, era mais fácil a classificação. Quando comecei a pesquisa, procurei apenas as drogas já conhecidas. Aos poucos, fui descobrindo essa triste realidade", contou.
Atualmente, a pesquisadora Selma Marques trabalha com 156 meninos em atendimento sócio-educativo pela Funac, mas ela faz questão de dizer que estudos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) mostram que o consumo está em todas as classes. "É um fenômeno que infelizmente podemos rotular que tem forma democrática. No Brasil, comemoramos 19 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente e 20 anos da Constituição Federal, além de inúmeros tratados internacionais. Mas muito pouco se avançou nessa seara. No estado do Maranhão, por exemplo, não há política de atendimento para a recuperação da criança e do adolescente nessa situação. Hoje, só existem iniciativas particulares, como a Fazenda da Esperança, as Casas de Samuel, Neemias e um projeto em Imperatriz. Na área municipal, é diferente, vemos que há uma preocupação com o tema", esclareceu Selma Marques. O objetivo primordial da pesquisa que ela desenvolve em seu doutorado é justamente constatar se o estado está cumprindo seu papel estatutário. Em 2010, ela vai apresentar os resultados.
Na reta final de seu trabalho, ela adiantou que pôde perceber que o encontro desse menor (alvo da pesquisa) com a droga se dá pelo imediatismo. "A maioria dos adolescentes pesquisados informam que usam a droga para ter coragem e enfrentar a adversidade da vida, não é para ter alegria. Isso é a desvalorização da vida humana. A droga é usada como alívio. Depois, com a dependência, eles vão sentir a face amarga desse encontro. Ela é apenas um incentivo para cometer infrações e até alívio para outros sofrimentos", informou.
Outras realidades - O juiz Reinaldo Araújo, titular da 11ª Vara Criminal e atualmente respondendo pela 1ª Vara da Infância e Juventude, dedica seus dias a apreciar e julgar casos envolvendo menores. À reportagem do Jornal Pequeno, ele relatou que é bastante comum aparecer casos de adultos incentivando e explorando menores quanto ao consumo e venda de drogas, embora a realidade mais denunciada seja a da exploração sexual infantil.
O município, por sua vez, também colabora com sua parte. O Centro de Atenção Psicossocial Anti-drogas - Álcool e Drogas (Caps ad), inaugurado em abril deste ano, é exemplo dessa preocupação com esse grave quadro social. Depois de pouco mais de dois meses de funcionamento, o CAPS ad intensificou o atendimento a pacientes com o diagnóstico de múltiplas drogas como merla, maconha, cocaína, crack e álcool.
A prevenção também acontece através da educação, pois é feita por meio do Projeto de Educação em Saúde Mental (Proesam), em parceria com escolas da rede municipal. "Os usuários vão às escolas, acompanhados dos nossos técnicos, para falar de suas vidas no mundo das drogas e eles mesmos alertam os jovens para não usarem drogas, porque muitas vezes é na brincadeira que começa o vício", afirmou a coordenadora de Saúde Mental da Semus, Lisieux Campos.
O Caps, em parceria com o governo do Estado, atende também pacientes da Fundação da Criança e do Adolescente (Funac). São adolescentes em conflito com a lei e, até mesmo, de alta periculosidade, que são acompanhados dos monitores da instituição para receber os serviços prestados pelo órgão municipal. Com o crescente aumento da violência decorrente do uso e/ou da dependência de drogas em São Luís, o Caps ad tem o propósito de preencher a lacuna assistencial, atendendo gratuitamente pessoas com transtornos e dependência de substâncias psicoativas, com acompanhamento clínico, além de promover a inserção social
A assistência aos usuários de substâncias psicoativas e álcool é feita com tratamentos psicofarmacológico e psicoterápico com ênfase na Terapia Ocupacional. "Os pacientes tomam a medicação e fazem a terapia ocupacional para poder sair daqui. Nessa assistência psicoterapêutica, procuramos resgatar a auto-estima da pessoa e suas potencialidades, pensando na reinserção social", explicou Lisieux Campos. Para reintegrar os pacientes na vida social e familiar, a Prefeitura de São Luís utiliza o Programa de Volta pra Casa (PVC), do Ministério da Saúde (MS). Ele privilegia todo e qualquer paciente que já esteja internado no Caps ad por dois anos ou mais com o auxílio de reabilitação psicossocial no valor de R$ 330 por pessoa para garantir a autonomia do usuário.O gasto dessa quantia é monitorado pela família e até pelo próprio Centro.
No Centro de Atenção Psicossocial Anti-drogas, os pacientes são atendidos por uma equipe multiprofissional composta por médicos (clínicos e psiquiatras), psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, enfermeiros, farmacêuticos, técnicos de enfermagem, artesãos e profissionais de nível médio, como auxiliares operacionais em serviços diretos. Os pacientes recebem assistência em três tipos de regimes: intensivo, semi-intensivo e não intensivo. O tratamento consiste na prevenção, assistência e reinserção social do paciente, com uma articulação intersetorial integrada à educação, justiça, segurança e ação social.
Mercado de Trabalho - O Centro de Atenção Psicossocial Anti-drogas está se associando com instituições como o Serviço Social do Comércio (Sesc) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) para oferecer aos usuários cursos profissionalizantes e garantir oportunidades de trabalho no mercado de São Luís.
Outro serviço que a coordenadora de Saúde Mental do Município está operacionalizando é a disponibilização de leitos dos Socorrões I e II (hospitais de urgência e emergência de São Luís) específicos para pacientes usuários de drogas psicoativas pelo período de 24 a 72 horas para desintoxicação. "Serão leitos de referência para serem utilizados pelos pacientes intoxicados pelo uso do álcool e drogas psicoativas disponíveis nos dois hospitais de referência no município de São Luís", concluiu Lisieux Campos.
Fonte:Jornal Pequeno
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