Brasília - Após o término do recesso do Poder Judiciário (3 de agosto), o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) deve analisar o recurso extraordinário do Ministério Público Federal (MPF) para que sejam condenados José Luiz Barbosa, o Zequinha Barbosa (campeão mundial em 1987 na corrida de 800 metros rasos) e o seu ex-assessor Luiz Otávio Flores da Anunciação.
Os dois pagaram para fazer sexo com adolescentes em junho de 2003. A ação tenta recuperar a decisão da Justiça em primeira instância no Mato Grosso do Sul (2004).
O recurso, com base no Artigo 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que faz 19 anos hoje (13), foi feito porque a Quinta Turma do STJ entendeu que a submissão de adolescentes à prostituição e à exploração sexual não abrangem a figura do cliente ocasional, mas apenas a do aliciador que se beneficie do pagamento do programa.
Se acolhido o recurso, o processo irá para o Supremo Tribunal Federal (STF). É grande a expectativa de setores envolvidos com a questão da infância e adolescência que o recurso seja acolhido e a decisão revertida.
Leila Paiva, coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), lamenta a decisão da Quinta Turma do STJ de não reconhecer a prática de delito. “É um desrespeito muito grande”.
A mesma opinião tem o coordenador do Programa de Cidadania dos Adolescentes do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Infância (Unicef), Mário Volpi, que classificou de “ridícula”a interpretação do STJ.
Para o subprocurador-geral da República, Alcides Martins, que enviou o recurso ao STJ, a aplicação da lei exige “interpretação não literal, baseada em elementos históricos e finalísticos”. Ele lembrou que o Artigo 244-A do ECA cita “os que aliciam, que pagam e utilizam [relação de poder sexualizada e mercantilizada, que causa danos psicossociais]”.
Segundo Martins, o recurso ao STF procede porque a interpretação do STJ fere o parágrafo 4º do Artigo 227 da Constituição Federal, que prevê que “a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”.
Além de casos como esse de má interpretação da lei, os operadores de direito e especialistas nas questões da infância e adolescência apontam a redução da maioridade penal como outro risco na passagem dos 19 anos do ECA.
Para o deputado federal Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE), da Frente Parlamentar da Juventude, setores da sociedade olham de forma equivocada para o estatuto e não percebem que o estatuto protege todas as crianças e adolescentes não apenas que possa estar em contradição com a lei.
“Em 50 milhões de crianças e adolescentes brasileiros há, no máximo, 50 mil cumprindo medida socioeducativa. Para cada jovem em conflito com a lei, há mais de 999 que estão protegidos”, diz o parlamentar. Para ele, as medidas socioeducativas são punitivas e adequadas. “Quem entrou em contradição com a lei tem que ser punido, mas tem direito ao futuro”.
Essa também é a opinião de Leila Paiva, da SEDH. “Não há impunidade. Os resultados das medidas socioeducativas são melhores do que as do sistema penal”. Para a coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, ao defender a redução da maioridade “a sociedade brasileira busca soluções fácies. Nosso papel é dizer que não resolve, tanto que o encarceramento não resolveu a criminalidade adulta”, aponta.
Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil
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