Infância Urgente

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Manifesto da campanha nacional contra os despejos: minha casa, minha luta!

A Frente Nacional de Movimentos lançou, em agosto, um manifesto contra os processos de despejos e desrespeito aos moradores de favelas, comunidades periféricas e trabalhadores informais. Leia na íntegra:

A RESISTÊNCIA URBANA – Frente Nacional de Movimentos faz um alerta aos trabalhadores brasileiros sobre o avanço de uma política de despejos e de uma ofensiva do capital imobiliário nas metrópoles do país. O cenário que está sendo montado é de uma verdadeira operação de guerra contra os moradores de favelas, comunidades periféricas e os trabalhadores informais, em nome do “crescimento econômico” e da preparação do país para a Copa-2014 e Olimpíadas-2016. Os governos federal, estaduais e municipais prepararam seus planejamentos – em muitos casos, já em execução – para obras de grande impacto, que representam uma Contra-Reforma Urbana no Brasil, pela forma autoritária e excludente com que estes programas afetarão os trabalhadores urbanos (principalmente através de despejos e remoções em massa) e pela lógica de cidade que trazem consigo. Por isso, e contra isso, lançamos uma Campanha Nacional contra os Despejos.

A ofensiva do capital imobiliário
Há anos temos assistido a uma intensificação dos ataques aos moradores de favelas, periferias e subúrbios nas grandes cidades brasileiras. A forma desses ataques tem sido a realização de despejos e remoções de milhares de famílias, associada a novos empreendimentos imobiliários e a obras públicas. Os trabalhadores – especialmente os mais pobres – são expulsos para regiões cada vez mais distantes dos centros, para que as áreas urbanas com maior infra-estrutura e mais valorizadas possam abrigar novas obras e terem uma valorização ainda maior. Trata-se de uma política de “limpeza social”, onde as zonas urbanas de maior interesse econômico devem ficar livres dos pobres.

O que está por trás deste processo é o fortalecimento, como “nunca antes visto neste país”, do capital imobiliário: as grandes empresas de construção civil, as incorporadoras e os proprietários/especuladores de terra urbana estão em festa. Após a abertura de capital de grandes empreiteiras (a partir de 2006) e de sucessivos presentes do governo, o Programa Minha Casa, Minha Vida (anunciado no início de 2009) coroou a abertura de um período de vacas gordas para este setor do capital. Para que se tenha uma idéia da dimensão desses ganhos basta mencionar 3 fatos: O setor da construção foi quem puxou a alta da Bolsa de Valores de São Paulo no primeiro semestre de 2009, com uma valorização acionária de 87%; além disso, foi o setor que isoladamente mais recebeu do governo nas chamadas “medidas anti-crise”, com R$33 bilhões só através do Minha Casa,
Minha Vida, para não citar o PAC; por fim, como pagamento dos bondosos investimentos estatais, o capital imobiliário se destaca como o maior financiador de campanhas eleitorais do Brasil – tendo “bancadas” em todas as instancias parlamentares e inúmeros representantes nos governos. Essas são demonstrações da força deste setor no capitalismo brasileiro e de sua capacidade de determinar a política de desenvolvimento urbano, manejando os governos e desconsiderando os interesses populares.

A aliança perversa entre Estado e capital imobiliário reproduz uma lógica excludente e repressiva de desenvolvimento urbano. Sob a bandeira do “crescimento econômico” passam por cima do que estiver pela frente, em geral comunidades inteiras, historicamente estabelecidas. Naturalmente, as casas derrubadas não são as mansões dos empreiteiros; estas não atrapalham o progresso e as grandes obras. É a lógica do predomínio completo dos interesses privados, da necessidade de aumentar os lucros e de valorizar cada vez mais o solo urbano. O valor do metro quadrado nas metrópoles brasileiras tem crescido numa escala astronômica. Ganham os especuladores, ganham as construtoras, ganham os caixas de campanha. Perdem os trabalhadores. O preço deste “crescimento” são os despejos, o aumento do número de trabalhadores sem-teto e a piora das condições de moradia para os mais pobres.

PAC, Copa e Olimpíadas: a contra-reforma urbana
Como se isso não bastasse, a ampliação das obras do PAC (com o anúncio do PAC 2) e as intervenções urbanas planejadas para viabilizar a Copa 2014 e as Olimpíadas 2016 prometem agravar o problema a níveis catastróficos. Além da construção de estádios e centros esportivos nas cidades-sede, estão previstas uma série de ações nas grandes cidades do país: novas avenidas, ampliação de aeroportos, obras de embelezamento para o turismo, etc. O governo pretende mostrar a todos o Brasil como um país de “primeiro mundo”; e para isso terá que afastar os pobres dos holofotes da mídia internacional e dos turistas.

Não faltam exemplos do que tem ocorrido em situações como esta. Recentemente, na Copa da África, dezenas de milhares de famílias sofreram despejo e estão sobrevivendo em alojamentos precários; além disso, o governo sul-africano criou – por exigência da FIFA – tribunais especiais, para julgar e condenar sumariamente trabalhadores pobres e negros que ousaram atrapalhar a festa. Mesmo em países ricos, como a Espanha (nas Olimpíadas de 1992), os resultados foram negativos aos trabalhadores: os terrenos de Barcelona tiveram uma valorização de mais de 130%, por conta da especulação no período, expulsando os pobres das regiões centrais. Nem precisamos ir tão longe. O Pan-Americano 2007 no Rio de Janeiro foi um momento de terror nas favelas do Rio de Janeiro: vários despejos aconteceram, foram erguidos muros entorno das favelas e ocorreu o Massacre do Complexo do Alemão, com dezenas de pessoas – em geral, jovens e negros da favela – executados pela polícia.

Aí vem a Copa no Brasil! O sonho de muitos brasileiros promete tornar-se um terrível pesadelo. E, para que tudo esteja pronto, as obras começarão em breve, aliás, já estão atrasadas. O número de famílias despejadas no país – e não será só nas cidades-sede – deve chegar à casa das centenas de milhares. Em muitos casos, despejos sem indenização e sem alternativa de moradia. Ou com os ridículos “cheques-despejo”, com um valor que não permite sequer a compra de um barraco numa encosta de morro. Além disso, as medidas de repressão e criminalização da pobreza tendem a se tornar cada vez mais bárbaras nestes próximos anos, consolidando a política de “higienização social”. Várias situações já apontam para isso: as Unidades de Polícia Pacificadora, no Rio de Janeiro; o aumento da repressão a trabalhadores informais (especialmente camelôs) em várias cidades; o impedimento de mo moradores de periferia em freqüentar espaços públicos nos centros, como ocorreu num shopping Center de Curitiba (por ordem judicial!); etc. A ordem é: a cidade para os ricos e turistas, que os pobres fiquem nas periferias!

Quem está sorrindo com isso é o grande capital imobiliário, que deverá se empanturrar com obras faraônicas, financiadas com dinheiro público, e verá seus grandes terrenos valorizarem-se absurdamente. Só para construção de estádios, o BNDES já anunciou um crédito de R$ 5 bilhões à disposição dos interessados. E outros bilhões virão para os empreiteiros. Para os pobres, despejos e repressão.

Construir a resistência
Diante deste cenário, temos uma tarefa imensa pela frente: organizar e unificar uma resistência dos trabalhadores, em escala nacional. Para evitar um verdadeiro massacre, cada tentativa de despejo deve ter uma resposta à altura; cada ataque do capital deve ser seguido de um contra-ataque dos trabalhadores afetados por esta política. Daí, a necessidade urgente de construir e fortalecer a CAMPANHA NACIONAL CONTRA OS DESPEJOS – Minha Casa, Minha Luta.

Para isso, propomos a organização de Comitês em todas as regiões do país, com o objetivo de unificar a luta contra os despejos. Chamamos todos os movimentos populares, associações de moradores, referências comunitárias e setores da sociedade civil comprometidos com a luta contra este massacre para construir conosco esta resistência.

Esta Campanha Nacional deve se estruturar sobre uma Plataforma com os
seguintes eixos:

- contra a política de despejos e remoções. garantia de moradia digna para
todos.
- combate à repressão e criminalização da pobreza. pelo direito à vida e
ao trabalho.
- por uma política nacional de desapropriações de imóveis vazios e medidas
de combate à especulação imobiliária.
- por uma política de construção de moradias populares, baseada no
subsídio integral, na qualidade habitacional e na gestão direta dos
empreendimentos.
- em defesa de uma reforma urbana popular.

Resistência Urbana
Frente Nacional de Movimentos

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