Patrícia Benvenuti
da Redação da Brasil de Fato
A mudança de nome da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem) para Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação Casa), não alterou o tratamento dispensado aos adolescentes encarcerados em São Paulo. Pelo menos foi o que constatou um grupo de entidades de direitos humanos que, na última segunda-feira (08), visitou 20 unidades destinadas a adolescentes na capital paulista e no interior de São Paulo.
A integrante da organização Acat Brasil, Gorete Marques, relata que as equipes de fiscalização encontraram, na Fundação Casa, uma situação muito semelhante à registrada quando a instituição ainda se chamava Febem, antes de 2007. O histórico de violência, por exemplo, permanece o mesmo, com denúncias de maus-tratos, espancamentos, humilhações, violência psicológica e moral. "Alguns relatos foram confirmados pelos adolescentes. E eles estavam com medo de retaliação, pois nós iríamos embora e eles tinham medo de apanhar", conta.
Na unidade Japurá, no bairro do Brás, em São Paulo, dez jovens ficaram feridos no dia 2 de dezembro durante um suposto confronto com funcionários. Um deles, atingido por uma cadeira, levou oito pontos na cabeça.
Direitos básicos
As equipes também constataram o não cumprimento de direitos básicos, como acesso semanal ao banho de sol, informações acerca de seus processos e revistas íntimas constrangedoras para familiares. A falta de higiene também compromete a saúde dos jovens. Além de muitos internos não poderem utilizar o chuveiro por mais do que três minutos, alguns relataram sentir coceiras em função da má qualidade do sabão, chegando a apresentar ferimentos nas pernas, braços e axilas.
A questão da superlotação, segundo Gorete, melhorou, e atualmente, poucas unidades têm mais do que 40 detentos, limite recomendado pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. No entanto, esse número ainda impossibilita um trabalho intensivo de educação e socialização. "Nisso mudou muito pouco, as estruturas não são adequadas ao Sinase, não tem um plano pedagógico bem definido", explica.
As entidades também criticam a manutenção da prática de raspar os cabelos dos internos - em algumas unidades os jovens são obrigados a raspar a cabeça dos outros, o que se constitui em violação de direitos. Além disso, os jovens são obrigados a ficar, constantemente, com cabeça baixa, com as mãos para trás e pedindo "com licença" mesmo se passarem do lado dos funcionários. Se esquecerem de dizer "licença, Senhor", eles precisam refazer o percurso, sob pena de castigo - eles têm de ficar nus, em alguns lugares, e de pé, com o rosto virado para a parede, por até quatro horas.
Comportamento "robotizado"
Para o advogado Daniel Adolpho Daltin Assis, do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca) de Interlagos, esse tipo de tratamento produz um comportamento "robotizado", que não contribui para a recuperação dos adolescentes e ainda provoca um sentimento de indignação e revolta quando saem. "É um alinhamento de comportamento que quebra qualquer possibilidade de emancipação do jovem, o distancia de uma possibilidade emancipatória e educativa", avalia.
A integrante da organização Acat Brasil, Gorete Marques, explica que a visita foi realizada sem avisos, pois o objetivo era fiscalizar a rotina das unidades. "A idéia dessa visita era não apenas ter um panorama geral da situação dos menores em conflito com a lei, mas voltar a uma rotina de fiscalização dessas unidades. Além disso, queremos provocar que outros atores que tenham essa responsabilidade se envolvam", referindo-se aos parlamentares e conselheiros tutelares que acompanharam as ações.
As entidades de direitos humanos estavam, há três anos, impedidas de visitar unidades de internação de adolescentes, por conta de uma portaria editada pelo governo de São Paulo. A portaria, este ano, foi derrubada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
Em breve, as entidades enviarão petições para as Corregedorias e para a Promotoria da Infância, exigindo providências sobre as irregularidades, e as autoridades responsáveis receberão um relatório sobre a visita.
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