Há 100 anos, em 1910, a socialista alemã Clara Zetkin propôs, na 2ª Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, a criação do Dia Internacional da Mulher, que seguiu sendo celebrado em datas diferentes, de acordo com o calendário de lutas de cada país. A ação das operárias russas no dia 8 de março de 1917, precipitando o início das ações da Revolução Russa, é a razão mais provável para a fixação desta data como o Dia Internacional da Mulher.
Com a revolução, muitos direitos reivindicados pelas mulheres foram pioneiramente conquistados, como o voto e elegibilidade feminina e o direito ao aborto. A partir de 1922, a celebração internacional foi oficializada neste dia.
Essa história se perdeu nos grandes registros históricos, mas faz parte do passado político das mulheres e do movimento feminista de origem socialista no começo do século passado. De lá pra cá, o Dia Internacional da Mulher transformou-se no símbolo da participação ativa das mulheres para transformar sua condição e a sociedade como um todo.
Dentro deste espírito, milhares de mulheres sairão às ruas na próxima segunda-feira, dia 8, para mais uma jornada de lutas. Em 2010, será o momento de comemorar o que já foi conquistado nesses 100 anos, mas também de mostrar que a desigualdade entre homens e mulheres persiste no Brasil, seja na divisão do trabalho doméstico, na garantia de direitos, na participação na vida política do país ou na permanência da violência contra a mulher.
A promulgação da Lei Maria da Penha sem dúvida representou um avanço no combate a essa prática, mas ainda hoje sofre inúmeros obstáculos para ser de fato implementada e legitimada. Desde o início do ano, pelo menos 9 mulheres foram assassinadas após registrarem denúncia de agressões cometidas por seus companheiros. Fatos como esses evidenciam que ainda vigora a idéia de que as mulheres são propriedade dos homens.
No mundo do trabalho, o trabalho doméstico ainda é desconsiderado economicamente. Mesmo tendo maior escolaridade que os homens, as mulheres recebem em média 71% do salário masculino. A dimensão racial também aprofunda a desigualdade. Segundo pesquisa do IBGE de 2003, as negras e pardas recebiam salários 51% menores do que o rendimento médio das mulheres brancas. No contexto da crise econômica, as mulheres foram as mais atingidas, pois ocupam a posição mais precária no mercado de trabalho.
No ranking das Nações Unidas em relação aos espaços de poder ocupados por mulheres, o Brasil ocupa hoje a 162ª posição, estando à frente apenas do Haiti, Colômbia e Belize. Enquanto na Argentina, por exemplo, 45% do Parlamento é composto por mulheres, no Brasil elas representam menos de 10%. Basta lembrar, Sr. Presidente, que desde a proclamação da República, nenhuma mulher ocupou sequer um cargo na mesa diretora desta Casa.
Outra bandeira histórica das mulheres que marcará mais um 8 de março é a luta pela legalização do aborto, quarta causa de mortalidade materna no Brasil. Mesmo assim, nos últimos anos houve um avanço brutal do conservadorismo em relação à essa reivindicação, com ações fundamentalistas colocadas em prática aqui na Câmara dos Deputados, onde tem falado mais alto o lobby das igrejas e da bancada religiosa. Basta lembrar da CPI do Aborto, que quase foi implementada. Também passou por esta Casa o Acordo Brasil-Vaticano, que ameaça ao caráter laico do Estado brasileiro. Mais recentemente, acompanhamos o recuo do governo Lula acerca da diretriz que afirma a autonomia das mulheres em decidir sobre seu próprio corpo no Programa Nacional de Direitos Humanos 3.
Senhoras e Senhores Deputados, a legalização do aborto é uma questão de saúde pública e não uma prática pra ser tratada criminalmente. Ouvi certa vez de uma feminista uma frase reveladora: “o aborto no Brasil não é proibido; é proibitivo”. Ou seja, quem pode pagar por ele, interrompe uma gravidez indesejada com toda segurança em clínicas particulares. Já as mulheres pobres, muitas vezes, sequer são socorridas em hospitais públicos após sofrerem consequências de um aborto realizado em más condições. É hora de acabar com esta hipocrisia!
Por fim, prestamos nossa solidariedade às mulheres do Haiti, que após séculos de colonização e exploração e de uma catástrofe natural que assolou o país no início do ano, seguem sendo as maiores vítimas da ocupação de seu território pelas tropas brasileiras.
Que as comemorações dos 100 anos do 8 de março fortaleçam as bandeiras das mulheres e possibilitem o resgate histórico do nascimento socialista deste Dia Internacional de Lutas, inspirando o movimento feminista e todos aqueles que participam e apoiam suas reivindicações a seguir sempre em frente na luta por uma sociedade verdadeiramente igualitária e sem opressões.
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