Infância Urgente

quarta-feira, 25 de março de 2009

Governo federal compra arma não letal para policiais; ONG liga equipamento a mortes

ITALO NOGUEIRA
da Folha de S.Paulo, no Rio

A Secretaria Nacional de Segurança Pública comprou no final do ano passado 4.000 unidades de uma polêmica arma não letal, usada em mais de 70 países e vinculada a mais de 300 mortes pela Anistia Internacional. O governo pretende distribuir exemplares para as PMs de todo o país --mil serão usadas pela Força Nacional de Segurança e 400 estão reservadas para São Paulo.

A pistola, chamada Taser, dispara dardos que transmitem ondas elétricas que enrijecem os músculos do oponente, que fica paralisado. O fabricante afirma que a arma não provoca alterações cardíacas, nem mesmo naqueles que já sofrem de problemas no coração.

A Anistia Internacional, no entanto, afirma que 334 pessoas morreram nos EUA após serem atingidas pelos dardos da pistola, entre junho de 2001 a agosto de 2008. Segundo a ONG, de 98 autópsias analisadas, 50 dizem que a pistola causou ou contribuiu para a morte.

Uma pesquisa do Incor feita com 579 voluntários mostrou que a Taser não provoca arritmia ou isquemia cardíaca em pessoas saudáveis. Para Sérgio Timerman, coordenador do estudo, o resultado indica que pessoas com problemas cardíacos também não seriam afetadas. Mas admite um "viés muito grande na pesquisa".

"[Os voluntários] São pessoas que não são violentas, não estão usando drogas, e não têm uma série de outros fatores [ambientais]. Não se pode fechar os olhos para isso". Uma das principais críticas da Anistia Internacional é justamente a falta de pesquisas sobre o uso da arma em pessoas drogadas ou com doenças físicas ou mentais em situação de estresse.

Para o diretor da Senasp, Ricardo Balestreri, o caso de mortes de pessoas sob efeito de droga "cai no campo da subjetividade". "Se uma pessoa altamente drogada morre após o tiro de uma Taser foi do tiro, foi a droga ou overdose retardada?"

Quase 2.000 exemplares da arma já são usados em pequena escala no Brasil por guardas municipais, duas PMs (Mato Grosso e Goiás) e as polícias do Senado e da Câmara. A compra da Senasp foi a primeira em grande quantidade no país.

Balestreri afirma que o relatório é "frágil do ponto de vista científico". A ONG disse que não fez um trabalho científico, mas que "enfatiza a preocupação exposta por médicos".

Para o secretário, a principal vantagem do equipamento é dar opção ao policial que não a arma de fogo. "Se na pior das hipóteses a Anistia tivesse razão, e 50 pessoas morreram por causa da Taser... Mais de 1 milhão de tiros de Taser foram dados. Se todos esses policiais tivessem usado armas de fogo, quantos morto teríamos? 50? Possivelmente meio milhão".

"Menos letal"

O relatório da ONG afirma que o equipamento tem sido disparado "desnecessária e desproporcionalmente", "ao menor sinal de resistência. "Elas são frequentemente usadas em situações em que armas de fogo ou outras armas não seriam uma opção".

O relatório narra o caso de um médico que bateu o carro ao ter um ataque epiléptico e recebeu várias descargas elétricas por não obedecer as ordens policiais antes de morrer. Balestreri diz que a pistola não é "não letal" mas "menos letal". "Um policial mal preparado pode matar com um cacetete".

De acordo com a entidade, há também relatos em que a arma foi usada em torturas, sendo disparados diversos choques seguidos ou prolongados em pessoas desarmadas que não apresentavam risco.

Para Balestreri, "um policial psicopata, que queira torturar pessoas, a Taser não é a arma indicada". "Seria um tipo de tortura um pouco ridícula".

Em Mato Grosso, no entanto, o Ministério Público investiga o uso da pistola como um dos instrumentos de tortura usados por PMs presos esta semana. "As vítimas relatam que os policiais estavam sem a Taser e uma viatura a entregou aos policiais", disse a promotora Elisamara Vodonós.


http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u539721.shtml

24/03/2009 - 15h38
Descarga elétrica provocada por arma não letal "engana" músculos e cérebro

da Folha de S.Paulo, no Rio

A pistola comprada pelo governo e que deve ser distribuída à Polícia Militar de todo o país como arma não letal emite impulsos elétricos na forma de ondas T, iguais aos sinais do sistema nervoso, que "enganam" o cérebro e os músculos, paralisando o alvo.

A pistola é "carregada" com cartuchos que contêm dardos que atingem até 10,6 metros de distância. Conectados ao corpo, eles transmitem a descarga elétrica. Ao receberem as ondas, os músculos passam a confundi-las com sinais cerebrais e ignoraram o sistema nervoso central, ficando enrijecidos na hora. A emissão elétrica pode ser por tempo indeterminado, mas o padrão é cinco segundos.

A diferença de potencial elétrico ("voltagem") chega a 10 mil volts, segundo o fabricante. A corrente, no entanto, é baixa: 0,004 Ampère --menos do que de uma lâmpada de árvore de Natal. A corrente é o que afeta os batimentos cardíacos. A baixa "amperagem" é, para o governo, a garantia da segurança da pistola como não letal.

Ela tem dois dispositivos de controle: 1) um microchip que registra a hora e a duração da emissão elétrica, que permite a auditagem do uso da arma; 2) a cada disparo ela lança uma quantidade indeterminada de "confetes" com o número do equipamento, para identificação da pistola durante perícia.

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