A Sociedade Civil organizada, que atua na defesa dos direitos humanos da criança e do adolescente, através desse manifesto, vem saudar a instalação da "CPI da Pedofilia", destinada a "averiguar a existência de rede de pedófilos no Município de São Paulo, inclusive, quanto à utilização da Internet para a prática de tais crimes" [Requerimento para Instalação da CPI, na CMSP - 04.02.2009], com base em ocorrências jornalísticas, "notadamente matéria do jornal `Folha de São Paulo´ de 09 de outubro p.p."
De plano, fazemos algumas ponderações:
1 - No Requerimento anunciado, não há, em nenhum momento, menção a crime, e sim, a eventuais práticas abusivas de conotação sexual;
2 - No Requerimento, é fundamento de fato para sua instalação, a matéria veiculada no dia 09 de outubro no jornal supracitado. No entanto, em tal matéria, o foco é a pesquisa que retrata a exposição de crianças, como expectadoras, aos sítios eletrônicos de conteúdo "impróprio". Portanto, o único fato utilizado, em Requerimento, para a instalação da CPI não a justifica, uma vez que não traz em pauta exatamente a prática violenta que sustenta a pedofilia, mas sim a responsabilidade do mantenedor (provedor) desse instrumento comercial eletrônico. Em outro plano, sendo o único fato formalmente utilizado para instalação da CPI, eleva a rede eletrônica ao grau de máxima importância investigativa, deixando em segundo lugar (como justificativa fática) outros e reais modos de manifestação da exploração e abuso sexuais.
CONTEXTO POLÍTICO
Infelizmente assistimos que tão grave situação tem sido tratada de forma inadequada, principalmente pela mídia de grande audiência, que, mais preocupada com apelos públicos imediatistas e superficiais - que não se preocupam em tratar a situação com o cuidado, profundidade e o respeito devido, pautada pura e simplesmente em interesses comercias -, acaba re-vitimizando crianças e adolescentes, não dando conta de responder às situações de violações presentes em nosso cotidiano contra os meninos e meninas.
AMPLIAÇÃO DO FOCO INVESTIGATIVO.
Conceitual e institucionalmente, sabe-se que Pedofilia não é o crime em si, mas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), um estado psicológico de atração sexual por crianças, chegando a ser caracterizado como um "desvio sexual".
Uma vez que as políticas públicas devem ser direcionadas à garantia de direitos humanos de crianças e adolescentes, sugerimos que a Comissão Parlamentar de Inquérito tenha como foco as práticas de violência sexual contra esse público, dentro das quais estará, eventualmente, a prática derivada desse estado psicológico definido como Pedofilia.
Assim, diante dos fatos e construção dos diversos grupos, pautados por um processo de elaboração científico-conceitual, solicitamos, com o respeito devido a essa CPI, que o foco da sua ação seja ampliado, pois o recorte (Pedofilia) sugerido não dá conta da real problemática que visualizamos, por dois motivos:
a) Formal: a nomeação de Pedofilia, que a coloca como objeto de investigação, retira de foco a prática de violência, enfocando somente o estado psicológico;
b) Material: propriamente a prática de violência derivada do estado psicológico (Pedofilia) tira o foco da garantia dos direitos, reduz o âmbito investigativo tão-somente ao autor de eventual crime (lógica do dano), não se apurando o contexto de violência sexual contra as crianças e adolescentes (lógica do desafio).
A CPI, é inegável, trata de um aspecto que entendemos grave, que, porém, está dentro de uma problemática muito maior, que é a da exploração, abuso e violência sexual, já que essas são suas manifestações. Entendendo-se, a partir daí, a necessidade de fortalecermos o processo de mudança da cultura vitimizadora de crianças e adolescentes, a sociedade paulistana precisa, assim, investigar a violência e propor outros caminhos de resolutividade não reducionista.
Assim, é possível detectar outras possibilidades de apuração de fatos de violência sexual contra crianças e adolescentes, incluindo, eventualmente, os ligados à pedofilia. Com esta adequação conceitual, os procedimentos decorrentes também já poderão impulsionar a elaboração de políticas públicas voltadas ao pedófilo e a vítima, bem como contribuindo para a atuação da delegacia de crimes virtuais.
Frise-se que é da atribuição principal do Parlamento: a criação e adequação de normas e a fiscalização da correta execução das mesmas, por meio da implementação e efetivação das políticas públicas de garantia dos direitos da criança e do adolescente.
PEDIDO
Entendendo a sensibilidade dos Nobres Vereadores, que ora se empenham e se juntam a nossa histórica luta para superação de todo tipo de desrespeito a infanto-adolescência, pedimos que esta CPI tenha a sensibilidade necessária para compreender a dimensão e importância das nossas ponderações, entendendo-se, por fim, que o fenômeno que também se expressa na pedofilia, tem uma abrangência maior que é todo o processo de exploração e abuso sexual contra crianças e adolescentes, num nefasto circuito de vitimização e exploração comercial.
Por todo o exposto, e visando ter esta CPI maior condição de produzir os efeitos planejados, que esperamos não ser de mera punição, mas, principalmente de defesa e proteção das crianças e adolescentes, solicitamos a ampliação de seu foco investigativo, adequando-se a materialidade desta investigação (no seu teor e produção), e, consequentemente, conceituando adequadamente sua denominação, seguindo as nomenclaturas adotadas nos Planos Nacional, Estadual e Municipal de São Paulo – “Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-Juvenil”.
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