Infância Urgente

sábado, 14 de março de 2009

Ministério Público diz que sentença sobre pedofilia é aberração

TJ-RS reduz pena de acusados de atacar crianças; para desembargador, "alarde" dos pais é mais prejudicial que atos

Tribunal reduziu pena de acusado argumentando, entre outros pontos, que o "dano psicológico da vítima não foi tão intenso"

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em pelo menos três decisões judiciais, desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul usaram de argumentos à margem da lei, segundo o Ministério Público Federal, para reformar decisões de primeira instância e reduzir a pena a que foram condenados réus acusados de pedofilia.
Desde 2006, o Ministério Público recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e aguarda julgamento contra decisão na qual o TJ/RS classificou como corrupção de menores atos praticados pelo réu contra quatro menores -duas de 9, uma de 13 e outra de 10 anos de idade- e que haviam levado à sua condenação, em primeira instância, pelo crime de atentado violento ao pudor (qualquer ato libidinoso diverso da penetração vaginal).
A modificação produziu a redução da pena do acusado de 17 anos e seis meses para seis anos e três meses de prisão.
Isso porque, segundo o Código Penal, corromper menores é praticar ou induzir à prática de ato de libidinagem, de uma maneira geral, a pessoa maior de 14 anos e menor de 18. Já atentado violento ao pudor, com violência presumida, é praticar qualquer ato libidinagem, independentemente da vontade, com menor de 14.
Consta da sentença de primeira instância, ao descrever os abusos sofridos pela vítima de 10 anos, que, "nas quatro oportunidades, o acusado, aproveitando-se da ausência de pessoas adultas, imobilizou os braços da criança, passando a beijá-la lascivamente, inserindo a língua em sua boca. Ato contínuo, apalpou-lhe as nádegas, pressionando o corpo da menina contra a sua região peniana".
Ao pronunciar o seu voto, o desembargador Sylvio Baptista Neto afirmou que, muitas vezes, as penas mínimas previstas representavam "um excesso de rigor da lei" que não fazia justiça ao caso em concreto, por exemplo. Disse ainda ser papel do Judiciário aplicar "a melhor punição ao acusado (...) nem que, para tanto, tenhamos que encontrar, no sistema legal, uma situação que melhor se enquadre no caso ou deixar de aplicar a lei injusta".
Ao recorrer contra o teor do julgamento, o Ministério Público classificou a decisão como "aberração jurídica", principalmente porque, ao contrário do que propunha a acusação, os desembargadores entenderam não haver presunção de violência, como prevê a lei, com o consequente aumento da pena, quando as vítimas do atentado violento ao pudor são menores de 14 anos.
Em outra decisão, reformada pelo STJ em 2005 e segundo a qual a vítima foi uma menina de cinco anos, o TJ/RS reduziu a pena do acusado de nove para dois anos de prisão. Argumentou-se, entre outros pontos, que o "dano psicológico da vítima não foi tão intenso, tão marcante que determinasse, repito, uma reprimenda rigorosa".
Novamente o desembargador Sylvio Batista, desta vez relator do voto vencedor, fez um destaque inusitado. Disse que o "alarde" dos pais produziu mais danos à vítima do que os fatos. Mais uma vez o entendimento dos desembargadores foi o de que não se tratava de atentado violento ao pudor, mas sim corrupção de menores.
Em decisão também reformada pelo STJ em 2008, para condenar o acusado pelo crime de atentado violento ao pudor consumado, o TJ/RS decidiu considerar como atentado violento ao pudor "tentado", com a consequente redução de até dois terços da pena, o caso de uma menina violentada pelo pai. Segundo o Ministério Público: "o ora recorrido [...] logrou esfregar seu órgão genital nas nádegas e virilha da vítima, sua própria filha, na época com apenas oito anos de idade!".
Relator do processo, o desembargador Roque Miguel Fank, reconheceu, conforme o Ministério Público, a existência de "condutas efetivamente graves e reveladoras de abuso sexual completo". Mas a decisão do colegiado de desembargadores, foi pela decisão de que a ocorrência configura uma tentativa e não efetivamente a consumação de um crime.

Fonte:FSP

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