1.3. Das unidades de internação: violação de direitos permanente.
A ofensa aos direitos dos adolescentes extrapola todos os índices de aceitabilidade quando nos reportamos ao sistema que deveria ser sócio-educativo, mas que, ainda hoje, após o alcance da maioridade pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, testemunhamos as unidades de internação destinadas às pessoas menores de 18 anos sendo evidentes reprodutoras da violência institucional estatal e funcionando descaradamente como “presídios mirins”, dentro dos quais os adolescentes, que desafortunadamente são obrigados a estar, são submetidos às inúmeras e mais vis atrocidades que se pode ofertar a um ser humano, e nos quais lhes são retirados os direitos mais fundamentais que lhes estão constitucionalmente garantidos há mais de vinte anos.
Embora seja evidente tais condições, a constatação empírica de infamante realidade foi realizada pelo Conselho Federal de Psicologia em conjunto com o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, através de suas secções regionais, que fizeram inspeções, no dia 15 de março de 2006, em unidades de internamento em todo território nacional, simultaneamente visitando as unidades de 22 Estados da federação e do Distrito Federal.
A situação encontrada nas unidades de todas as regiões do Brasil, de norte a sul, foi de total desamparo, sujeira, falta de serviços essenciais, inadequação arquitetônica com prédios similares às prisões dos adultos, inexistência de refeitórios com comidas sendo servidas em quartos fétidos e lotados, denúncias de maus tratos e tortura, precariedade e negligência no atendimento a saúde, preponderância das medidas de segurança em detrimento da política pedagógica, e sanções disciplinares “pseudopedagógicas” para melhorar o comportamento dos adolescentes que vão desde proibição do banho de sol ao isolamento em celas. Ou seja, total inadequadação a uma pretensão sócio-educativa. As escolas encontradas nas unidades visitadas foram interpretadas como uma total dissonância com o direito à educação garantido aos adolescentes. Em relação à saúde, nada que diga o contrário ficou consignado, pois a precariedade e a falta de profissionais para o atendimento dos jovens é uma característica comum.
Outro grave e alarmente problema é imprescindível ressaltar, pois apesar de cediço neste país que um dos grandes engodos atinente à adolescência e que, muitas vezes, são responsáveis por inserir os meninos e meninas do Brasil na criminalidade, está relacionado à questão da drogadição, e mesmo assim, o tratamento para aqueles que necessitam e que desejam cuidar ou sair desta condição é simplesmente inexistente aos que chegam ao sistema de justiça e são compulsoriamente internados.
Apesar da criminologia contemporânea há muito tempo entender a questão da criminalidade por bases sociológicas, repelindo a ultrapassada teoria lombrosiana - segundo a qual o único e exclusivo responsável pela infração é o próprio ser que a pratica, sendo este portador de uma pré-destinação natural -, ainda pode-se verificar que os adolescentes não são vistos em sua inteireza e completude histórica, econômica, social e cultural, sendo ainda hoje tratados como seres genuinamente doentes, doenças certamente não físicas, mas de ordem mental. Portanto, é comum neste país “tratar” o adolescente que infracionou, e, portanto entender seu comportamento, através da tutela e, muitas vezes, da psiquiatrização. E mais, também não é algo incomum nas instituições “acalmar” os adolescentes através da ingestão sistemática de psicotrópicos.
Se não bastassem tais descalabros dirigidos aos adolescentes que, por seu malfadado destino, são obrigados a habitar os referidos cárceres, a humilhação não pára aí, pois atingem também seus familiares, que são obrigados a se desnudarem por completo quando da visitação dos jovens nas unidades, inclusive adolescentes, crianças e até bebês, que são obrigados a retirar suas fraldas, e colocar fralda fornecida pela unidade, constrangimento justificado por um único aspecto: questão de segurança. Não há como entender o sucesso de um Estado que não resolve uma “questão de segurança” de outra forma senão a de submeter os familiares de adolescentes internados ao desnudamento completo e ao posterior agachamento a fim de que sejam averiguados seus órgãos genitais.
Se nos reservarmos especialmente à São Paulo, nos deparamos com uma instituição que caminha a passos tímidos para a real implementação do ECA.
A instituição tão conhecida por suas arbitrariedades e atrocidades cometidas em desfavor dos adolescentes internados, que por longa data se tornou conhecida pela denominação de “FEBEM”, que ironicamente se traduz por “Fundação do Bem Estar do Menor”, recentemente, mais especificamente em 21 de dezembro de 2006, alterou de nome para “Fundação CASA – Fundação Centro de Atendimento Sócio Educativo ao Adolescente”, por conta do Projeto de Lei n° 694, de autoria do Sr. Governador, que, aprovado pela Assembléia Legislativa do Estado, apesar de tardiamente modificar o nome, restou mantido em todo o texto a denominação anterior.
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